Após mais 17 anos, o processo de compra da empresa capixaba Chocolates Garoto pela multinacional Nestlé segue sem um desfecho. A aquisição, feita em 2002 e reprovada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) em 2004, tramita na Justiça Federal desde 2005, processo este que está parado há pelo menos um ano.
Mesmo com a demora, a Nestlé está confiante no fim do imbróglio e já dá como remota a possibilidade de ter que vender marcas como o Serenata de Amor. Isso porque a última decisão, em agosto do ano passado pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), acabou, na prática, determinando que o órgão antitruste julgue novamente a compra da Garoto pela multinacional.
A expectativa positiva da empresa se dá pelo fato de que, na avaliação da empresa, baseada em dados de mercado, as condições de concorrência modificaram-se de forma ainda mais significativa nos últimos 17 anos.
O dinamismo do mercado de chocolates no Brasil foi confirmado pela entrada de novos players, lançamentos contínuos agregando inovação e melhorias nutricionais, surgimento de novos canais de distribuição e de modelos de negócio, com destaque para as boutiques, e pelo próprio cenário econômico do país, ressaltou a Nestlé/Garoto.
Em entrevista para A Gazeta em setembro, o gerente-geral da Garoto e vice-presidente de Chocolates da Nestlé no Brasil, Liberato Milo, já havia afirmado que o clima era de otimismo. Nosso processo com o Cade está lá, com eles, e vai seguir o curso normal da Justiça brasileira. Estamos bem tranquilos e confiantes, declarou.
Essa última decisão se deu após julgamento de embargos infringentes interpostos pela Nestlé e pela Garoto há oito anos. Em 2010, a Quinta Turma do TRF-1 já havia determinado uma reapreciação do julgamento, mas, atendendo recurso do Cade, anulou decisão de primeiro grau que havia declarada aprovada a compra da Garoto. Foi por isso que as empresas haviam recorrido.
Mantida a reapreciação em 2018, Nestlé e Garoto apresentaram embargos de declaração para, segundo as empresas, elucidar a decisão, mas o recurso ainda aguarda análise pelo TRF-1.
Por mais que o mundo ideal para as empresas seria de fato uma decisão que já desse como aprovada a transação, como já ocorreu, a necessidade de um novo julgamento pelo Cade - se confirmada -, já deve ser benéfica para o grupo se forem levados em conta os novos padrões do mercado.
Em 2002, quando comprou a Garoto, a Nestlé aumentou sua participação no mercado de chocolates de 30,8% para 55,2%. Hoje, a Nestlé ainda lidera, mas com uma participação bem mais baixa, de 34,1%, de acordo com a Euromonitor International.
Prova da confiança na aprovação estaria nos robustos investimentos feitos pela Nestlé na Garoto, noticiados em primeira mão por A Gazeta. São cerca de R$ 100 milhões destinados à fábrica de Vila Velha para implantação de novas tecnologias e robôs que vão permitir o lançamento de 20 novos produtos até o fim de 2019.
A Nestlé reforçou que desde a aquisição, manteve investimentos consistentes na Garoto, ampliou e renovou o portfólio de produtos, modernizou as linhas de operação da fábrica, aumentou os pontos de distribuição, desenvolveu campanhas de marketing para destacar suas marcas e fomentar o desenvolvimento dos seus parceiros de negócios e, ainda, fortaleceu a exportação para vários países.
O Cade explicou que, quanto ao processo, ainda estão pendentes de julgamento os embargos de declaração interpostos pela Nestlé e que as demais informações sobre a operação são de caráter sigiloso, a fim de não prejudicar o cumprimento, pela Nestlé, das diretrizes estabelecidas com o Cade.
O encaminhamento positivo do processo judicial vai deixando cada vez mais de lado a possibilidade de venda de um pacote que marcas que inclui o Serenata de Amor.
Um acordo extrajudicial firmado entre as empresas e o Cade em 2016 para pôr fim ao litígio previa a venda de um pacote de dez marcas, como Chokito, Serenata, Lollo e Sensação.
O prazo chegou a ser prorrogado em 2017, para até meados de 2018, mas as marcas não foram vendidas. A Nestlé alegou que a crise econômica a impediu de fechar negócio.
Como a decisão final tende a ser favorável para a multinacional, pela redução da participação da Nestlé no mercado, a avaliação dentro da empresa é que a necessidade de vender marcas deixou de existir e, por isso, o grupo passou a trabalhar com a perspectiva de não ter que vender mais nenhuma marca.
Em 2002 a Chocolates Garoto, maior fábrica de chocolates da América Latina e empresa genuinamente capixaba, foi vendida para a marca suíça Nestlé. A venda foi motivada por problemas internos envolvendo a disputa do poder entre os acionistas da companhia, aliados à oferta feita pela multinacional, que tinha interesse na posição de liderança do mercado que a Garoto tinha na região Nordeste do país.
O Conselho do Cade reprovou a operação, no julgamento do Ato de Concentração. A operação foi vetada porque o Cade entendeu que o negócio tinha um alto potencial lesivo à concorrência, pois resultaria em uma concentração de mais de 58% do mercado de chocolates em poder da Nestlé. A Nestlé tentou reverter a posição no próprio conselho, mas não teve sucesso.
Diante da reprovação do negócio, Nestlé e Garoto foram à Justiça. O processo pedia a anulação do julgamento do ato de concentração feito pelo Cade. O processo, em primeira instância, tramitou na 4ª Vara Federal do Distrito Federal.
O juiz da primeira instância derrubou a decisão do Cade e aprovou o negócio. Ele atacou, entre outros argumentos das empresas, que órgão antitruste deveria ter julgado a aquisição no prazo de 60 dias, "sob pena de aprovação automática". No entanto, o julgamento ocorreu 411 dias após a chegada do processo ao órgão. O Cade recorreu à segunda instância.
A Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), por maioria, deu parcial provimento à apelação do Cade, mantendo anulada a decisão anterior mas determinando que fosse realizada um novo julgamento pela autarquia. Nestlé e Garoto apresentaram embargos infringentes.
Para tentar resolver o imbróglio, Cade e Nestlé/Garoto firmaram um acordo extrajudicial que previa, entre outros pontos, a venda de um pacote de 10 marcas, incluindo as famosas Chokito, Serenata de Amor, Lollo e Sensação. O prazo para venda era de um ano. Em 2017, a pedido da Nestlé, ele foi renovado por mais um ano. Em meados de 2018 o acordo expirou e a venda não foi efetivada. A Nestlé alegou dificuldades em função da crise financeira.
Em agosto do ano passado, o TRF-1 julgou os embargos opostos pelas empresas e manteve a decisão de segundo grau, que determina a reapreciação do julgamento pela autarquia. A Nestlé/Garoto apresentou embargos de declaração para elucidar a questão.
Os embargos finais ainda estão pendentes de análise pela Corte e o processo está há um ano sem qualquer movimentação, mas a expectativa das empresas é positiva visto que as condições de mercado mudaram de 2002 para cá, o que faria com que um novo julgamento pelo Cade tenha resultado positivo.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta