O novo coronavírus impôs uma série de desafios para a sociedade que não se limitam apenas à saúde. Manter-se firme no mercado econômico é uma das tarefas complexas que a Covid-19 tornou ainda mais difícil no mundo dos negócios. Pesquisa realizada com 12 mil pessoas, de 12 países diferentes, incluindo o Brasil, apontou que 71% dos entrevistados concordam que, se perceberem que uma empresa está colocando o lucro acima das pessoas durante a pandemia, perderão a confiança nessa marca para sempre.
Publicado no começo de abril, o levantamento foi feito pela Edelman Trust Barometer 2020, uma instituição que é referência mundial em consultoria nas áreas de relações públicas e marketing. Diante desse cenário, especialistas apontam que, para enfrentar esta crise, será preciso ter propósito forte e humanização da marca.
Segundo Carine Cardoso, consultora de Branding e Marketing e professora do curso de Publicidade da Faesa, a forma que uma marca lida com a humanidade é o que vai fazer a diferença.
Ainda de acordo com a especialista, a partir da hora em que uma empresa se instala em um lugar, contrata funcionários, seleciona os fornecedores para fazer seus produtos e serviços, se relaciona com a comunidade local e ocupa um lugar, de forma física ou virtual, é preciso assumir a sua responsabilidade com as pessoas.
"A primeira pergunta que os empresários precisam fazer é: qual é o meu lugar neste mundo para além dos meus produtos? Os produtos podem ficar obsoletos por qualquer novo entrante mais tecnológico, e que seja mais sedutor em um determinado momento. Mas o que move uma empresa é a sua razão de existir, é o lugar dela no mundo. São os valores da marca", ressalta Carine.
Para o CEO da holding de comunicação Beta Rede, Rimaldo de Sá, a empresa não está desconectada da sociedade. "Faço parte de uma geração que entendeu que pensar no social nada mais é do que saber que não estamos sozinhos e fazemos parte de um ecossistema em que todos se conectam. Essa geração trouxe a ideia de criar valor não só para si, mas para todos em seu entorno, em um processo de ganhos para todos", explica.
Neste contexto, para o professor do curso de Publicidade e Propaganda da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Cláudio Rabelo, é necessário ter uma preocupação não só com os clientes, mas também com os colaboradores.
"As empresas que negligenciarem a saúde física e mental de seus públicos, interno e externo, agem como pessoas que não fazem exercícios físicos, bebem álcool exageradamente, consomem drogas e alimentam mal o corpo e a mente. Ou seja, perdem a confiança de seus públicos e se matam a cada dia, mesmo sem perceber", salienta.
Rimaldo de Sá acrescenta que a crise decorrente da pandemia é complexa e envolve toda a sociedade. Quando o público percebe que um empresário não está preocupado com os impactos na vida das pessoas, avalia o especialista, a reputação desta marca estará comprometida. Para ele, só será possível sair desta situação com cooperação.
Cláudio Rabelo reforça que, infelizmente, vão ter marcas que se alimentarão da crise e da dor, enquanto outras irão esgotar os próprios recursos, incluindo os humanos. No entanto, o especialista prefere acreditar numa postura mais otimista mesmo na crise. "Prefiro apostar naquelas que vão se unir para repensar suas práticas, proteger suas equipes, seus públicos e o planeta como um todo, redirecionar seus negócios, implantar novas tecnologias e adotar modelos de comunicação mais ágeis, transparentes e plurais", pontua.
De acordo com Carine Cardoso, a responsabilidade social de uma empresa não se resume a bancar um projeto. "Tem que fazer parte dele. A empresa precisa compreender o viés do projeto e vestir essa camisa. É preciso entrar nessa pele. Não é só uma bandeira, é viver isso. Aí sim teremos uma marca forte", salienta.
Nessa mesma linha de raciocínio, Rimaldo de Sá defende que não existe outra forma de uma empresa demonstrar a noção de responsabilidade social a não ser com práticas, posicionamento e ações claras em seu dia a dia. "Mais importante do que pensar em como comunicar, devemos trabalhar para implementar ações e princípios de responsabilidade social em todos os níveis das organizações. Os grandes valores certamente são mais que percebidos, são admirados", sustenta.
Portanto, para Carine, mesmo diante de toda a complexidade do momento atual, as empresas não podem sair de cena. Na avaliação da especialista, primeiro, as marcas devem reunir forças internas e ouvir o que os colaboradores têm a dizer. "Junte os diferentes times para criar um plano de retomada. As pessoas têm muita coisa legal para compartilhar. Nessas conversas podem surgir novas ideias ou colocar em ação algumas que estavam paradas. Depois, reveja a presença digital da marca", frisa.
Carine aponta que é preciso estar na internet e fazer, pelo menos, o que a concorrência faz. "Você tem que estar onde seu cliente está. Ele está nas redes sociais? Está procurando no Google? Invista em conteúdo de marketing digital na medida do seu bolso. É preciso fazer o básico bem feito."
Desse modo, para Carine, é fundamental desenvolver ações que tenham a ver com o propósito do negócio, mesclando conteúdos e produtos. "É muito oportunismo ficar com discurso de venda o tempo inteiro neste momento. Mas também não pode ficar em um discurso apenas reflexivo porque uma empresa precisa alcançar resultados. Encontre o tom da conversa que consiga mesclar o produto com conteúdo bacana, respeitando o cenário. É o momento de humanizar a marca. A conversa tem que ter consistência. E onde está essa consistência? Em um propósito verdadeiro", finaliza a especialista.
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