O aumento no preço de itens básicos da alimentação, como o óleo de soja e o arroz, é apenas um pequeno reflexo de como a economia mundial e nacional estão impactando o bolso do consumidor aqui no Espírito Santo e no resto do país.
O risco fiscal brasileiro e a segunda onda do coronavírus na Europa - movimento que ainda não começou, oficialmente no Brasil, mas começa a trazer preocupação com aumentos inesperados de casos da doença - devem pesar ainda mais na inflação, no dólar, nos juros futuros e em diversos setores da economia.
Esse conjunto de indicadores macroeconômicos afetam em cheio o orçamento das famílias e mudam as perspectivas de futuro do país. São os mais pobres os mais prejudicados com isso tudo. Muitos tiveram o seu poder de compra reduzido por causa da queda na renda, outros por causa do desemprego durante esta crise.
O diretor de integração e de projetos especiais do Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN), Pablo Lira, lembra que a pandemia está acirrando a desigualdade social e econômica, principalmente em países como o Brasil que já tem um histórico de desigualdade forte.
"A Covid-19 evidencia essa desigualdade e os impactos são mais elevados na população que é menos privilegiada, no prisma social e econômico. A população que sofre mais com o fechamento de vagas é aquela que tem menor nível de formação. A população menos privilegiada acaba não tendo uma poupança ou uma reserva para passar esse momento crítico, o que faz com que a situação dela fique ainda mais complexa", explica.
Mas não é apenas a falta de emprego e a inflação que afetam o dia a dia da população. Existem outros pontos-chaves da economia que influenciam desde o preço do quilo do arroz até a roupa que é comprada. Entenda como eles estão fazendo os preços dos produtos aumentarem no Espírito Santo.
O Brasil vive um momento em que está com a menor taxa básica de juros da história. O Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) manteve pela segunda vez consecutiva a taxa básica de juros da economia nacional, a Selic, em 2%. A decisão foi tomada de maneira unânime, em 28 de outubro.
O economista e comentarista da CBN Vitória José Márcio de Barros explica que os juros baixos ajudam na tomada de crédito e no financiamento imobiliário e veicular, por exemplo. Porém, ele também reduz as taxas de retorno dos investimentos conservadores, aqueles que têm pouco risco, como é o caso do Tesouro Nacional.
Com isso, para ganhar um pouco mais, é preciso migrar para investimentos com maior risco, como a Bolsa de Valores, contratos futuros e fundos de investimento. "Quem tem dinheiro na poupança, por exemplo, perde ainda mais. Hoje, a poupança rende 70% da Selic, o que equivale a 1,4% ao ano. Com a inflação fechando o ano de 2020 na casa dos 3%, há uma perca de 1,6 pontos percentuais. Ou seja, quem aplicar na poupança vai estar perdendo para a inflação", explica.
A economia brasileira está se recuperando de forma mais rápida do que o mercado projetava. Especialistas apontam para uma retomada em V, quando a recuperação é quase tão veloz quanto a queda. Porém, essa reviravolta impulsionou a inflação como apontam os dados do relatório Focus do Banco Central.
No início da epidemia, quando o mercado projetava uma retomada mais lenta, a inflação projetada não passava dos 2%, no acumulado de 2020. Há quatro semanas ela passou para 2,05%. Agora, o mercado mudou essa expectativa e os indicadores do Banco Central já mostram uma inflação de 2,99% para este ano e superior a 3% para 2021.
A inflação medida pelo IPCA na Grande Vitória, por exemplo, aponta que o custo com alimentação acumula alta de 10,35% no ano, até setembro, em comparação com o mesmo período do ano passado, enquanto a média nacional ficou em 7,30%.
Não é apenas a alimentação que ficou mais cara. A recuperação econômica mais forte também vem encarecendo vários outros produtos, como aço, plástico e PVC. A inflação geral acumulada de janeiro a setembro deste ano, em comparação com o mesmo período do ano passado, foi de 1,7%, enquanto a do país, no mesmo período, equivale a 1,34%.
O economista e assessor de investimentos do Valor Investimento, Pedro Lang, explica que esse aumento acontece devido ao baixo estoque desses itens no mercado nacional e também devido à volta do consumo, puxada pelo auxílio emergencial, benefício que, aliás, teve papel importante para causar a alta dos alimentos, como arroz e óleo, que também encareceram impulsionados pelo mercado externo.
Na última quarta-feira (28), as Bolsas de Valores no mundo inteiro oscilaram diante da segunda onda do coronavírus na Europa, com lockdown em alguns países, como a França. O crescimento do número de casos nos Estados Unidos também contribuiu para a queda generalizada. No Brasil, ainda vivemos a primeira onda do coronavírus, mas o números de casos está voltando a subir.
Nesta semana, a notícia de que a Pfizer conseguiu uma vacina que dá até 90% de imunidade contra o coronavírus deu ânimos aos mercados e fez a B3 (Bolsa de Valores de São Paulo) superar os 105 mil pontos.
Mas, nesta quinta-feira, os mercados fecharam em baixa, com a queda de 2,2% do Ibovespa, que ficou em 102,5 mil pontos, por causa dos recordes de casos de coronavírus nos Estados Unidos. Além disso, as Bolsas da Ásia e do Pacífico fecharam em queda com a preocupação da segunda onda.
"Os lockdowns na Europa são delicados e ruins para a economia. Eles acontecem em um momento em que esses países estavam começando a se recuperar e as bolsas europeia, americana e brasileira se assustaram com a notícia", diz Pedro Lang.
Um ponto que tem preocupado os investidores é a questão fiscal brasileira. Segundo os especialistas, juntam-se a ela ainda as dificuldade dos representantes de conversarem sobre o orçamento de 2021 e a tensão política local para montar um quadro, situação que vem atrapalhando a estabilidade do país.
O planejador financeiro da Alphamar investimentos, Renan Lima, aponta que é favorável que os países tenham uma taxa baixa de juros porque eles atraem investimentos estrangeiros, além de incentivar a economia, o empreendedorismo e o consumo interno. Porém, para manter dessa forma é preciso mais do que a vontade do Banco Central.
Quando o governo gasta mais do que ganha, as taxas de juros vão começar a aumentar porque o mercado não vai mais aceitar emprestar com taxas menores. "Se você tem a taxa do governo aumentando, vai aumentar para todos e isso desincentiva o investimento. Além disso, quando o risco de crédito do país piora, isso reflete nos Estados e municípios, que também vão tomar empréstimos a taxas mais elevadas", comenta Lima.
O risco fiscal também pode levar a fuga de capitais, a retração nos investimentos, ao aumento dos juros, alta do dólar e consequentemente da inflação. O economista José Márcio de Barros lembra que, a B3 perdeu mais de R$ 87 bilhões em investimento estrangeiro neste ano.
"É uma fuga de capitais estrangeiros. Ainda temos esse risco de incerteza de como vamos financiar os benefícios que estamos pagando. Aliado a isso ainda há o problema de visão ambiental sobre o Brasil quem vem se agravando com a postura do governo federal", afirma.
Para o economista-chefe da Findes e Diretor Executivo do Ideies, Marcelo Saintive, é importante lembrar que, "uma hora o risco fiscal aparece em algum ligar, ou no juros e na inflação, ou em alguma outra variável econômica como é o caso do câmbio".
Outro fator é que se a segunda onda se concretizar no país, o governo admite estender o auxílio emergencial para socorrer aqueles que ficam sem recursos para enfrentar a crise sanitária. Como a dívida pública no país pode ultrapassar 100% do PIB neste ano, existe a preocupação de que a situação se deteriore e leve o Brasil a demorar ainda mais tempo para reduzir seu endividamento. O benefício pago aos mais pobres tem contribuído para ampliar o problema fiscal brasileiro.
Nos últimos dias, com o resultado das eleições americanas e com a notícia sobre a vacina, o dólar caiu, mas voltou a subir nesta quinta por causa do aumento de casos de coronavírus nos Estados Unidos.
A moeda americana ainda está em um patamar alto desde o início do ano e isso ataca diretamente o orçamento das famílias, por encarecer os alimentos, que são commodities e têm seus preços cotados no mercado internacional.
A valorização do dólar em relação ao real acaba favorecendo ainda a exportação, consequentemente, reflete novamente no preço dos alimentos. Além disso, ela ainda faz com que a importação de itens como componentes eletrônicos e matérias-primas para o setor farmacêutico encareça.
"Os agentes de mercado enxergam uma tendência de queda do dólar, mas tudo depende do país fazer o dever de casa. O Brasil depende muito mais dele mesmo do que de fatores externos para melhor a sua situação "econômica", aponta o planejador financeira da Alphamar investimentos, Renan Lima.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta