Em um país cuja fonte energética apresenta dependência das hidrelétricas, e com os níveis baixos dos reservatórios e seca em pelo menos cinco estados da federação, não parece haver alternativa além da produção de energia elétrica mais cara. Esse cenário vai sobrar para as famílias, que terão que apertar o orçamento para incluir um gasto maior com a conta de luz.
De acordo com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), poderá haver reajuste de mais de 20% na bandeira tarifária vermelha, que já representa o patamar mais alto da conta de luz.
A previsão é de que por volta do mês de novembro o Brasil chegue ao quadro mais crítico de abastecimento energético dos últimos anos e que possa enfrentar racionamento de energia semelhante ao ocorrido durante o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. No caso da matriz elétrica principal no país se tornar insuficiente, deve-se recorrer às termelétricas, que são muito caras.
De acordo com o engenheiro eletricista Fernando Augusto Adnet, o reajuste nas bandeiras tarifárias se deve justamente ao uso de energia mais cara, proveniente de térmicas. "Os ajustes serão feitos em função da falta de chuva, que diminui a água dos reservatórios. Então são usadas termelétricas, que operam à base de petróleo, consequentemente o impacto financeiro é maior", explicou.
No mesmo sentido, Adriano Nardoto, professor de Engenharia Elétrica do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes) e doutorando na área, explicou que as bandeiras tarifárias surgem nas contas de energia elétrica quando os reservatórios de água das usinas hidrelétricas estão baixos.
O especialista explicou que as bandeiras tarifárias estão presentes em todos os momentos nas contas de energia e que elas indicam como o custo da geração de energia elétrica varia ao longo do tempo.
"Quando a geração de energia está favorável, com reservatórios cheios, a bandeira tarifária é a verde, ou seja, é quando não há reajustes na tarifa de energia. A medida que os reservatórios das hidrelétricas vão diminuindo a bandeiras tarifárias vão evoluindo para a bandeira amarela, depois vermelha, no patamar 1, e vermelha no patamar 2, sendo a última a situação menos favorável de geração de energia, ou seja, a de maior custo", ressaltou Nardoto.
O Espírito Santo, de acordo com dados prévios da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), ficou em segundo entre os Estados brasileiros que encerraram maio com consumo de energia elétrica em alta, com crescimento de 20%. Em análise, a CCEE destacou também o Amazonas (21%), Rio de Janeiro (16%), São Paulo (15%), Ceará (15%), Minas Gerais (14%), Bahia (14%) e Santa Catarina (14%). Apenas o Maranhão registrou queda, de 1%.
Para o consumidor poupar, Adnet recomenda usar com cautela todos os equipamentos que funcionem com resistência. "É o caso dos principais vilões, que são o chuveiro e o ar-condicionado. O recomendável é focar em um banho mais rápido e usar o ar-condicionado o mínimo possível, ainda mais agora que já esfriou. Nessa época as pessoas costumam aumentar o uso do chuveiro quente e diminuir o ar-condicionado. Apesar disso, o chuveiro consome mais que o ar", afirmou.
Já o doutorando em Engenharia Elétrica, Adriano Nardoto, acrescentou que os utensílios que mais consomem energia elétrica são: chuveiro, ar condicionado, geladeira, forno elétrico, micro-ondas e ferro de passar roupa. "Normalmente equipamentos para 'gerar aquecimento'. Uma saída para fugir das contas altas de energia, e que é tendência, é a utilização da geração distribuída, ou seja, energia solar. Ela traz efeitos positivos para o consumidor do ponto de vista financeiro", acrescentou.
"O chuveiro mais econômico é o chuveiro comum, das duchas branquinhas, com potências menores. Os mais sofisticados consomem mais", disse Adnet. Além disso, o engenheiro recomenda: o máximo de duração no banho deveria ser 5 minutos. No verão, deve-se selecionar a temperatura morna em vez da mais quente.
Quanto menor a temperatura selecionada para o ar-condicionado, maior o gasto. "Os estudos apontam que o equipamento deveria ficar nos 24 graus, mas é inviável para o nosso caso aqui no Estado, acaba não refrigerando. Mas entre 22 e 23 graus é ideal. Em lugares ainda mais quentes, deve haver cortina para tapar o sol e evitar usar o ar com temperaturas ainda menores", ressaltou Adnet. De acordo com informações da Aneel, não se deve deixar portas e janelas abertas em ambientes com ar condicionado, além de que deve-se diminuir ao máximo o tempo de utilização do aparelho, além de manter os filtros limpos.
Para diminuir o consumo com a geladeira, deve-se evitar ficar abrindo e fechando. "É bom planejar o uso de uma só vez. Inclusive é recomendável usar o aparelho com dispenser do lado de fora, para evitar de ter que abrir. para pegar água. Toda vez que abre, a temperatura aumenta e leva um tempo até resfriar de novo, consumindo mais", explicou Adnet. Outras recomendações, que partem da Aneel, são de regular a temperatura interna de acordo com o manual de instruções; nunca colocar alimentos quentes dentro da geladeira; deixar espaço para ventilação na parte de trás da geladeira e não utilizá-la para secar panos; não forrar as prateleiras e descongelar a geladeira e verificar as borrachas de vedação regularmente.
Utilizar iluminação natural ou lâmpadas econômicas e apagar a luz ao sair de um cômodo; pintar o ambiente com cores claras.
Juntar roupas para passar de uma só vez; separar as roupas por tipo e começar por aquelas que exigem menor temperatura; nunca deixar o ferro ligado enquanto faz outra coisa.
Retirar os aparelhos da tomada quando possível ou durante longas ausências.
Para evitar o racionamento, como aconteceu entre 1º de julho de 2001 e 19 de fevereiro de 2002 no Brasil, em que quem não cumpria a meta de economia pagava um adicional na conta de luz, o governo brasileiro estuda um programa de deslocamento do consumo de energia nos horários de pico, o qual pode ter início já em julho deste ano.
De acordo com informação divulgada nesta segunda-feira (14) pela Folha de São Paulo, o Ministério de Minas e Energia esteve reunido com grandes consumidores para discutir as bases do plano, sendo que a ideia será de oferecer incentivo na conta de luz, como descontos na tarifa ou créditos futuros.
Com os níveis dos reservatórios de água do Centro-Oeste e do Sul do país bastante baixos, com cerca de 33% da capacidade, de acordo com dados do Instituto Acende Brasil, a situação hídrica traz alerta de crise, o que afeta, em especial, a geração de energia e o setor agropecuário. De modo a coincidir com o momento de retomada econômica, após fechamento de indústrias e comércio em decorrência da pandemia, o cenário pode ser ainda mais sombrio.
Para especialistas, a crise que se antevê para o segundo semestre é comparável com a enfrentada no final do governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em que houve racionamento de energia entre 1º de julho de 2001 e 19 de fevereiro de 2002 para evitar um apagão. À época, quem não cumpria a meta de economia pagava um adicional na conta de luz que variava de 50% a 200% e podia até ter a energia cortada como forma de punição.
Ainda que não se concretize como uma das piores crises da história neste ano, o fato é que a energia deve, em breve, encarecer ainda mais. Atualmente está vigente a bandeira tarifária vermelha no patamar 2, índice que representa o nível mais caro possível nas contas de energia.
Para o doutor em Ciência Florestal, Luiz Fernando Schettino, ex-presidente da antiga Agência de Serviços Públicos de Energia do Estado do Espírito Santo (Aspe), os cenários atuais indicam um quadro grave. "Se for confirmada a gravidade, a depender de previsões meteorológicas, teremos uma das piores crises de energia da história. Os níveis dos reservatórios estão bastante baixos, com 20% de déficit em relação aos anos anteriores, em que já eram baixos. Do jeito que está, podemos ter um novembro de reservatórios vazios", iniciou.
Para o especialista, o Brasil tem um grande potencial de geração de energia, no entanto, tem utilizado de forma muito aquém do que poderia. "Devemos investir em energia renovável, que geraria empregos em várias regiões. Eu vejo a crise como possibilidade de avanço, de investimentos em energias eólica, solar, e em bioenergia", pontuou.
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