Mais de 400 mortes na China e 20 mil casos confirmados pelo planeta. Não é à toa que o surto do novo coronavírus tem assustado pessoas do mundo inteiro pelo risco de contágio. Esse temor de que o vírus se alastre e demore a ser contido também já domina os mercados e empresas, que veem na doença uma ameaça global para a saúde econômica.
No momento, o temor do mercado ainda não é nem que o vírus ganhe escala global, mas que ele continue tendo efeitos duros sobre a China, um dos maiores mercados consumidores do planeta. No caso do Brasil, o país asiático é o seu maior parceiro comercial e consome as principais commodities produzidas aqui, como soja e petróleo. Para o Espírito Santo, os chineses são apenas o terceiro maior mercado externo, porém eles compram produtos que são a base da economia capixaba: minério de ferro, petróleo e celulose.
O tamanho dos impactos do surto na pequena economia aberta do Espírito Santo ou mesmo na brasileira ainda são imensuráveis, mas que eles existirão é quase que uma unanimidade. A ver pela reação dos mercados. Nos últimos dias, ações de empresas como Vale, Petrobras e Suzano vêm sofrendo fortes quedas nas Bolsas de Valores. Nesta terça-feira (4), houve até um ensaio de recuperação, mas o acumulado ainda é de perda em valor de mercado. O preço das commodities também segue em queda.
Há setores em que o efeito é mais claro. A China já reduziu em 20% seu consumo diário de petróleo, deixando de consumir pelo menos 3 milhões de barris de petróleo por dia, volume igual ao da produção diária de petróleo em todo país em dezembro, segundo a Agência Nacional do Petróleo (ANP). E a situação afeta diretamente a Petrobras: mais de 70% das exportações de petróleo da estatal em 2019 foram para a China.
Nos últimos 13 dias, a Petrobras já perdeu cerca de R$ 17 bilhões em valor de mercado por causa do coronavírus. Viagens de navios com petróleo para a China foram suspensas. Com a commodity sobrando no mercado nacional, as refinarias estão estocando derivados de petróleo não comercializados e logo podem chegar ao limite dos seus estoques. Se a situação persistir, a empresa pode optar por reduzir a produção.
"Se a China com seu mercado consumidor gigante tiver o consumo prejudicado por mais tempo por conta do vírus, ela vai importar menos e com isso vai sobrar petróleo no mercado global", explica a economista e professora da Fucape Arilda Teixeira. E aí é a lei do mercado: oferta em alta + procura em baixa = queda nos preços.
Seria uma espécie de "choque do petróleo" às avessas: nos chamados "choques", o produto faltou e o preço disparou, nesse caso o risco é de uma queda brutal nos preços, derrubando o valor de petroleiras e de arrecadação de royalties de governos.
No caso do Espírito Santo, foram exportados US$ 505,7 milhões em produtos para a China em 2019. Por mais que isso corresponda a apenas 5,63% das exportações capixabas, o presidente do Sindicato do Comércio de Exportação e Importação do Estado (Sindiex-ES), Marcílio Machado, chama a atenção para o top 3 dos produtos mais vendidos para o país.
Mais de 80% das exportações capixabas para a China são de minério de ferro (US$ 220,3 milhões), papel e celulose (US$ 102,3 milhões) e petróleo bruto (US$ 91,8 milhões): três setores que - por mais que estejam sofrendo crises pontuais cada um, levando a quedas na produção local - são considerados os principais da economia capixaba, com plantas industriais que geram milhares de empregos no Estado.
"O preço dessas commodities já está caindo no mercado internacional por causa da insegurança da China, que vinha crescendo dois dígitos, fechou ano passado crescendo 6%, e com o vírus já se teme que cresça menos que 4%. Então a gente começou o ano otimista por causa do acordo de Estados Unidos e China e esperando uma retomada da economia brasileira, e agora já temos muitas incertezas", comenta Machado.
Ele comparou as potenciais perdas para a economia global teria com o coronavírus com os que teve na época do vírus letal da Sars, há 18 anos, também nascido na China. Enquanto naquele período o país produzia basicamente produtos de baixo custo, como camisetas e tênis, hoje ele se tornou um elemento essencial para a economia global.
Nesta terça (4), ações de Vale e Petrobras tiveram uma pequena recuperação, assim como o Ibovespa e outras bolsas pelo mundo. Para Arilda Teixeira, trata-se de uma sinalização do mercado visualizando uma reação forte de combate ao vírus que possa contê-lo.
"A China não é boba. Eles não vão deixar uma situação dessas chegar ao ponto de paralisar a economia global e mexer com o status quo dos chineses na geopolítica global. O governo chinês está andando quase na velocidade da luz para controlar o vídeos, construindo hospitais imensos em dias para confinamento das pessoas. Eles não podem ser negligentes", analisa a economista.
O problema é o tempo que levará para esse controle, ou mesmo se ele virá. "Aí a gente pode ver impactos negativos na economia sim. As commodities vão ter o preço alterado e, havendo queda de preço, todos que produzem esses insumos perdem. E como somos basicamente produtores de commotidies, o risco é grande", pontua Arilda.
Na contramão das produtoras de commodities, empresas de proteína animal tendem a ser beneficiadas e ver um aumento nas exportações para a China. O país já vinha consumindo mais carne bovina brasileira nos últimos meses em razão da peste suína africana que levou a uma liquidação de rebanhos.
Agora, há a Influenza Aviária, que deve fazer a demanda subir ainda mais. Ou seja, mesmo se sofrerem um pouco com a desaceleração econômica por conta do coronavírus, a tendência é que o mercado de carnes siga em um ano bom por causa de outras doenças que afetam animais por lá.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta