Deve chegar ao Congresso ainda nessta segunda-feira (28) a proposta da segunda fase da reforma tributária que prevê a criação do imposto sobre transações digitais, apelidado de nova CPMF. A incidência apenas nas transações feitas pela internet tinha sido substituída para a cobrança de todas as movimentações financeiras.
Mas a ideia de manter a cobrança apenas para essa esfera ganhou força novamente. E dando essa nova cara ao projeto, o governo pretende ganhar aliados para aprovar a medida. No entanto, especialistas acreditam que o impacto dessa tributação vai ir além das operações feitas na web e de forma eletrônica.
Sabendo que a ideia não tem a simpatia ou o apoio dos parlamentares, o governo pretende apresentá-la como forma de financiar a desoneração da folha de pagamento de todos os setores. Isso significa reduzir os encargos que as empresas pagam sobre os salários dos trabalhadores chegando a zerá-los para quem recebe um salário mínimo.
A proposta de reforma incluirá ainda a criação de um novo programa social que substituirá o Bolsa Família, o Renda Cidadã.
Segundo informações do Valor, a alíquota do novo imposto será de 0,2% em débitos e créditos. Ou seja, tanto quem paga quanto quem recebe o dinheiro paga o tributo.
Ele será aplicado sobre as transações financeiras digitais, de acordo com as negociações do governo. Porém, o especialista em carga tributária e professor da Fucape, Valcemiro Nossa, lembra que, nos dias atuais, praticamente toda transação financeira é feita de forma digital.
Foram disseminadas várias formas de pagamento fácil como cartão, carteiras digitais e até o PIX, que está chegando aí. Comparado à época da CPMF, não há mais tanto dinheiro vivo. Por isso, naquela época, as pessoas conseguiam sair do imposto, que incidia sobre os cheques. Agora, dificilmente alguém conseguirá escapulir. Toda vez que pagar por esses meios eletrônicos ficará registrado e será cobrado, disse.
Outra mudança que o governo fez para deixar o tributo mais palatável foi apresentá-lo como temporário.
Na segunda-feira (21), o líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), afirmou que estava negociando com o presidente da Casa, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), para aprovar o imposto digital (conhecido como nova CMPF). Maia é um dos principais críticos à criação do novo imposto sobre o consumo.
Segundo Barros, uma das possibilidades é criar o imposto por um período de transição de seis anos. Durante esse tempo, a alíquota iria progredir até chegar aos 0,2%.
Contudo, até nisso o novo imposto sobre transações digitais se assemelha à CPMF. Esse último, quando foi criado em 1996 também deveria ter acabado após um prazo determinado, mas foi sendo prorrogado sucessivamente e só acabou de fato em 2007.
O debate sobre a desoneração da folha começou em junho deste ano. Na ocasião, o Congresso aprovou a prorrogação até o fim de 2020 da regra que permite que 17 setores que mais contratam no país substituam a contribuição previdenciária de 20% sobre os salários dos trabalhadores por uma alíquota bem menor, entre 1,5% a 4,5%, sobre a receita bruta.
Contudo, orientado pela equipe econômica, o presidente Jair Bolsonaro vetou essa prorrogação. Na próxima semana, está marcada a sessão que vai analisar a questão. Nesta quarta-feira (23), o presidente do Senado, Davi Alcolumbre disse ao Globo que o sentimento do Senado que eu escuto de todos os senadores é de derrubar o veto.
Se o veto for derrubado, os setores continuarão com a desoneração, o que representa queda de arrecadação para o governo. Por isso, a proposta é trocar a desoneração pelo novo imposto digital, que cobriria o desconto dado às empresas.
Segundo apurou o Valor, a desoneração proposta pelo governo será integral até um salário mínimo e, acima desse valor, haverá um corte de 15% na alíquota da contribuição previdenciária.
Nossa pontua que, para que seja criado um tributo, é preciso que haja uma contrapartida para que não ocorra simplesmente mais um incremento na carga tributária brasileira.
Contudo, ele avalia que é possível que a nova CPMF pese mais no bolso dos mais pobres. O lado ruim é que atinge pessoas com renda muito baixa que terão que sacrificar parte dela com imposto. Se a gente tivesse o imposto mais voltado para renda seria mais justo em relação ao resultado final que isso poderia gerar, afirma Valcemiro Nossa, professor da Fucape.
Essa também é a opinião do advogado especialista em direito tributário Henrique Fraga. Ele explica que, como o imposto será cobrado sobre toda a cadeia produtiva, ele acabará se acumulando e sendo transferido para o cidadão na ponta final.
Por exemplo, uma padaria será tributada em 0,2% sobre toda compra que fizer, seja pagando as contas de luz e de água do estabelecimento, comprando a farinha de trigo, pagando o gás para assar os pães, etc. O valor do tributo se acumula nessa cadeia e acaba sendo repassado, mesmo que parcialmente, para o pão que é vendido ao consumidor final, ainda que ele opte por pagar em dinheiro.
Ele acaba onerando toda a cadeia produtiva a pretexto de gerar igualdade, de ser de baixo valor. Mas o que acaba acontecendo de forma indireta é que ele vira um fator de peso no giro econômico. Ele acaba sendo um entrave para o desenvolvimento da economia, avalia Fraga.
Ele critica ainda o fato de o imposto acabar atingindo ricos e pobres por igual e com isso, prejudica os mais vulneráveis, que têm menos recursos.
Ele é injusto e gera sempre um descompasso com a realidade. Tem que tributar de acordo com a geração de riqueza e não onerar a atividade produtiva, aponta.
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