Laudo emitido pelo Instituto de Pesos e Medidas do Espírito Santo (Ipem), apontou que fios elétricos da marca Luzzano, produzidos na fábrica da Serra que foi interditada na terça-feira (11), estão fora dos padrões técnicos exigidos, sendo capazes de causar o superaquecimento da rede de energia, curto circuitos e até mesmo incêndios, além de deixarem a conta de energia mais cara.
Análises preliminares realizadas pela Delegacia Especializada de Defesa do Consumidor, em conjunto com a Comissão de Defesa do Consumidor da Assembleia Legislativa, mostram que a empresa teria vendido o produto fora das normas de segurança para diversos estabelecimentos, inclusive construtoras. Ainda não se sabe onde o material foi utilizado, entretanto, o consumidor consegue identificar, nas documentações do imóvel, se consta esse tipo de fiação.
O presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Espírito Santo (Sinduscon-ES), Paulo Baraona, explicou que as informações constam em um memorial descritivo, que geralmente é entregue ao comprador ao final da obra. Esse mesmo material deve ser passado de um dono para outro quando ocorre a venda do imóvel.
Baraona explica que se eventualmente for identificado que o material é defeituoso, o consumidor tem o direito de ligar para a construtora para que tome as medidas cabíveis. E caberá à empresa o ônus de reparação, como, por exemplo, a troca da fiação.
“Se for preciso trocar, não é necessário quebrar parede, nem nada do tipo. A fiação corre por dentro de uma tubulação na parede. Isto quando é bem feito. Mas, quando é construído assim, o procedimento padrão é esse. E o ônus é dividido com a fábrica também, que é quem forneceu o produto.”
- Onde encontro as informações?
Os dados constam em um memorial descritivo, que é uma documentação que tem como finalidade descrever o imóvel construído. Nele estão reunidos informações diversas, inclusive sobre os materiais utilizados na obra. Esse material geralmente é entregue ao comprador na entrega do imóvel.
- Vi que foram usados materiais fora das normas, o que devo fazer?
As amostras analisadas pelas autoridades técnicas apresentaram irregularidades. A empresa também já foi multada anteriormente pelo mesmo motivo. Não é possível afirmar, porém, que todos os fios já produzidos apresentam problemas. Ainda assim, diante dos indícios, se o consumidor identificou, no memorial descritivo, que os fios dessa marca foram utilizados, deve procurar a construtora e notificar a empresa para que possam comprovar a segurança do material.
- É preciso trocar o fio?
Se identificado um problema, o comprador pode pleitear, junto à construtora, a troca da fiação. Neste caso, todo o ônus recai sobre a construtora e a fábrica que forneceu o produto. A princípio, o requerimento deve ser feito administrativamente, mas, se houver dificuldade de solução, um advogado pode ser acionado.
Segundo relatório do Ipem, as amostras que foram recolhidas pela Polícia Civil e apresentadas para análise não estão de acordo com os requisitos da avaliação de conformidade aprovados pela Portaria Inmetro nº 640, de 2012. A legislação estabelece, entre outros pontos, normas sobre a tensão de cada tipo de fio. Os valores das resistências encontrados são superiores aos máximos permitidos.
“Vale salientar que essas irregularidades também conferem ao fabricante significativa vantagem econômica, visto que a matéria-prima é o produto mais caro do processo de produção de cabos flexíveis, e a resistência superior garante que temos menos matéria-prima nos cabos”, diz o laudo.
O diretor-geral do Ipem, Rogério Pinheiro, explicou que a empresa estava regular, isto é, não era uma fábrica clandestina. O problema era que, simplesmente, os fios não apresentavam as espessuras exigidas para cada tipo de instalação.
“Eram fios para instalações variadas. Para uma instalação de ar-condicionado, por exemplo, precisa-se de um fio de 10 mm, mas as especificações apresentadas eram outras. E quando não atende a essas espessuras exigidas, pode superaquecer, soltar fumaça, levar à queima de aparelhos, aumentar o consumo de energia. Pode até pegar fogo, dependendo da situação, mas isso depende muito das circunstâncias, se há madeira por perto, algum material inflamável.”
Ele explicou que, na prática, a reprovação dos fios se deve à não utilização da quantidade exigida de cobre, que faz com que a fiação não suporte a carga de energia que recebe.
Os materiais foram recolhidos pela polícia, após interdição da fábrica, e levados para análise técnica. Pinheiro ressaltou, entretanto, que o órgão faz vistorias periódicas, e apontou que a fábrica já havia sido multada anteriormente por conta de problemas semelhantes.
“É um trabalho feito em conjunto com o Inmetro, que nos orienta sobre como proceder em certas situações. Nós temos um laboratório para análise e emitimos um parecer técnico. Essa loja já havia sido fiscalizada antes, identificamos falha no material, apreendemos e aplicamos a multa para que a empresa corrigisse. Mas quem indica se é uma falha humana ou se houve má-fé, é a polícia. O Ipem apenas faz a verificação técnica.”
Conforme explicou o advogado João Eugênio Modenesi Filho, trata-se de um vício oculto, cujo prazo prescricional só começa a correr uma vez que o consumidor toma ciência de que se trata de um defeito de fabricação.
Ele observa que, uma vez constatado o vício, deve ser pleiteado, a princípio, administrativamente, a substituição do material. Ele pontua ainda que tanto a fábrica quanto a construtora dividem a responsabilidade do ônus.
O ponto é reforçado, também, pela especialista em Direito do Consumidor, Luiza Simões, segundo a qual é dever das empresas garantir a segurança do consumidor, e reparar eventuais prejuízos.
“Se verificou que o imóvel tem materiais que podem causar danos, sem contar os gastos financeiros, pode sim buscar a construtora, a fábrica. A construtora tem que ser informada, notificada extrajudicialmente, para verificar se os fios eram irregulares, e a empresa tem o dever de ajustar isso em nome da segurança dos moradores.”
Documentos obtidos pelas autoridades durante a operação que levou à interdição da fábrica de fios elétricos irregulares na Serra, na terça-feira (10), mostram que, além das construtoras, a empresa vendeu o produto fora das normas de segurança para locais como hospitais, igrejas, escolas, e diversas lojas de material de construção, que revenderam a mercadoria para um grande número de consumidores finais.
Ainda não se tem dimensão do número de pessoas cuja vida pode ter sido colocada em risco, uma vez que o material foi comercializado em diversos Estados, inclusive no Espírito Santo. Nesta quarta-feira (11), entretanto, o delegado Eduardo Passamani, titular da Delegacia Especializada de Defesa do Consumidor, esclareceu que as lojas estão notificadas para que interrompam a comercialização do produto.
"Já identificamos algumas lojas de materiais de construção vendendo. Elas estão sendo notificadas para que interrompam a comercialização até que seja feita nova análise pelo Ipem. Posteriormente, entretanto, deve ser realizada uma vistoria geral, nas lojas como um todo."
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