Jogadores do Palmeiras foram vítimas de um golpe envolvendo criptomoedas. O caso foi revelado pelo Fantástico, da TV Globo, neste domingo (13) e ganhou repercussão nas redes sociais. O esquema revelado previa rendimento de até 5% ao mês com investimento em criptoativos, algo impossível no mercado financeiro tradicional.
Foi com essa promessa e sob indicação do então companheiro de clube, Willian Bigode, atualmente no Fluminense, que Gustavo Scarpa, o craque do Brasileirão 2022, hoje no futebol inglês, aplicou R$ 6 milhões em criptomoedas. Dinheiro esse que ele não faz ideia de onde foi parar.
A empresa contratada para a operação foi a WLJC Consultoria e Gestão Empresarial, que tem o atacante Willian Bigode entre os sócios. Segundo apuração do G1, a empresa não está registrada em nenhum órgão regulatório do mercado financeiro, não tendo autorização para operar com criptomoedas.
Ainda segundo o G1, a Xland, empresa do Acre e parceira responsável pelos investimentos da WJLC, também não tinha a autorização de nenhuma instituição para o funcionamento. A companhia, porém, afirma que está autorizada, juridicamente, a realizar operações de compra, venda, troca e recebimento no mercado digital de criptoativos.
Scarpa hoje tem a compreensão de que sofreu um golpe. Porém, esse tipo de golpe não é novo e vem sendo usado e adaptado constantemente por pirâmides financeiras para fazer novas vítimas. Para onde se olhe, há anúncios com promessas milagrosas de rendimentos que nada mais são do que esquemas para se aproveitar de quem está desesperado por dinheiro.
Atualmente, muitas dessas promessas envolvem criptoativos, como Bitcoin. Em 2022, por exemplo, dois brasileiros foram indiciados por um júri do Tribunal Federal do Distrito Sul da Flórida por participação em um esquema de fraude global baseado em criptomoedas, que teria movimentado cerca de US$ 100 milhões. As promessas eram de lucros diários de 1% a quem realizasse aplicações em criptomoedas por meio da empresa que fundaram.
Sasha Meneghel e seu marido, o cantor gospel João Figueiredo, foram vítimas recentes de um golpe similar. O casal investiu mais de R$ 1,2 milhão no esquema de Francisley Valdevino da Silva, conhecido como "sheik das criptomoedas”, que está na mira da Polícia Federal por ser suspeito de crime contra o sistema financeiro nacional.
A Rental Coins prometia rendimentos de até 8,5% do valor investido com um esquema de "locação de criptomoedas". Sem receber o retorno esperado, o casal entrou com um processo de dano moral e material na Justiça de Curitiba (PR), alegando suposta fraude, segundo informações do jornal O Globo.
Em agosto de 2021, o dono da GAS Consultoria Bitcoin, Glaidson Acácio dos Santos, foi preso em meio às investigações de um golpe de pirâmide financeira em que a empresa prometia lucros de 10% ao mês nos investimentos em bitcoins.
Segundo a força-tarefa, que era composta por agentes do Ministério Público, da Polícia Federal, entre outros órgãos, a companhia nem sequer reaplicava os aportes em criptomoedas, enganando duplamente os clientes, que estavam, principalmente, em Cabo Frio, no Rio de Janeiro.
O Espírito Santo também já foi alvo de golpistas. No final de 2019, a Justiça Federal autorizou a Polícia Federal a vender cerca de 30 bitcoins apreendidos, naquele ano, durante a Operação Madoff, que fechou uma empresa do Estado que atuava ilegalmente como gestora de investimentos em moedas digitais. A decisão é inédita no país.
A empresa, com sede em Laranjeiras, na Serra, foi acusada de ser uma pirâmide financeira no estilo ponzi. De acordo com a polícia, a companhia agia desde 2017 como uma corretora de valores, vendendo investimentos vinculados a bitcoins, semelhantes aos famosos fundos de ações. O esquema de fraude com bitcoin prometia lucro de 20% ao mês e movimentava milhões no Estado.
O professor da Fucape, Talles Vianna Brugni, pós-doutor em Finanças e doutor em Controladoria e Contabilidade, observa que o esquema de pirâmide não é algo novo, os golpistas apenas alteram a roupagem dos golpes.
“Todo esquema de pirâmide tem duas características que não faltam nunca: a primeira delas é a promessa de altos ganhos, relativamente fáceis. E, geralmente, uma pessoa paga para entrar, ou faz um aporte, que vai servir para fazer frente ao pagamento de outros investidores, que entraram antes.”
Outra característica comum, ele explica, é a promessa de remuneração por indicação ou convite de outras pessoas. “Os esquemas de pirâmides são algo secular, agora os estelionatários só estão melhorando tecnologicamente as formas de transacionar o dinheiro. Mas temos golpes envolvendo qualquer ativo financeiro, não é exclusivo das criptomoedas, a questão é que, por serem relativamente novas, causaram um furor e isso abriu uma oportunidade para os golpistas se aproveitarem.”
Brugni reforça que “não existe dinheiro fácil”, nem existe rentabilidade muito acima da taxa Selic sem que haja um grau de risco elevado. E não existe rentabilidade superior aos títulos do Tesouro Nacional sem que haja um risco elevado. “O maior investidor do mundo pode conseguir ter uma média anual de rendimento de 20%, a pirâmide às vezes promete isso por mês. Geralmente as pessoas que caem nesses golpes não tem conhecimento sobre como funciona o mercado.”
O especialista em Investimentos da Valor Investimentos, Virgilio Lage, pontua que as criptomoeda são hoje o ativo com maior risco do mercado financeiro e que a rentabilidade garantida, principalmente em renda variável, é um dos principais indícios de que se trata de um golpe de pirâmide.
Mas ele reforça que além das promessas de lucros elevados, o investidor precisa ficar atento a outros indícios de esquema fraudulento. A falta de transparência da empresa sobre as estratégias adotadas é uma delas.
“A criptomoeda em si é um ativo como qualquer outro, só que não é regulada, ou é pouco regulada, e a forma como funciona às vezes fica um pouco obscura para as pessoas. Porém, há questões que podem e devem ser verificadas, como, por exemplo, se a empresa está cadastrada junto à CVM (Comissão de Valores Mobiliários), ou se está cadastrada junto ao Banco Central. Os meios mais tradicionais utilizados para realizar esse tipo de investimento são bancos tradicionais, corretoras e bancos digitais. Nunca deposite dinheiro em conta de terceiros, por exemplo.”
O delegado Brenno Andrade, titular da Delegacia Especializada de Repressão aos Crimes Cibernéticos (DRCC), explica que, em geral, é fácil identificar os sinais de golpe, se houver atenção. “A criptomoeda é só mais um produto que usam para chamar atenção. O golpe tem aquelas características clássicas: sempre prometendo ganhos altos, com pouco ou nenhum risco. Geralmente são empresas sem registro, a estratégia de investimento não é clara.”
O delegado reforça que o ganho das criptomoedas de fato pode ser alto, mas as perdas também. Não há garantia de lucro. “Sempre desconfie de promessas de investimentos com retorno garantido, de fórmulas milagrosas que vão entregar esses ganhos elevados. Busque também informações sobre a empresa em que pretende investir, busque na internet, verifique na Receita Federal se a empresa tem CNPJ, se está no país.”
Andrade também frisa que é importante não fornecer dados pessoais às empresas que não conhece, especialmente sem fazer essas verificações, pois isso abre margem para aplicação de outros golpes. “E por mais simples que possa parecer, utilize um antivírus no computador ou celular.”
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