Sócios do Grupo João Santos, conglomerado dono da Cimentos Nassau que tem atuação em todo o país, sobretudo no Nordeste, foi alvo de uma operação conjunta da Polícia Federal (PF), da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional e da Receita Federal, realizada nesta quarta-feira (5), que investiga crimes tributários, trabalhistas e de lavagem de dinheiro, além de formação de organização criminosa. O grupo é suspeito de causar um prejuízo aos cofres públicos e aos trabalhadores apurado em mais de R$ 8,64 bilhões.
Ao G1 Pernambuco, o advogado Taney Farias, que representa o grupo, enviou uma nota afirmando que as empresas foram surpreendidas pela operação e que "cabe aos acusados se colocar à disposição para prestar todos os esclarecimentos". A reportagem de A Gazeta também tentou contato com o grupo, por meio de seu escritório central em Recife, mas não obteve retorno.
Por determinação da 4ª Vara da Justiça Federal em Pernambuco, foram cumpridos 53 mandados de busca e apreensão, além do sequestro e bloqueio de bens e valores de investigados nos Estados de Pernambuco, São Paulo, Amazonas, Pará e Distrito Federal. Não foram realizadas ações no Espírito Santo, onde o grupo mantém uma fábrica da Nassau em Cachoeiro de Itapemirim e negócios no ramo da comunicação. .
Além de R$ 8,6 bilhões em dívidas tributárias, as empresas do grupo acumulam cerca de R$ 55 milhões em débitos trabalhistas, segundo a Procuradoria da Fazenda. Elas são suspeitas de sonegar impostos e direitos trabalhistas de centenas de empregados. Além de verbas rescisórias e benefícios garantidos em planos de demissão voluntária, até mesmo pagamento de salários estava comprometido.
De acordo com informações divulgadas pela Polícia Federal, “os investigados se organizaram em um sofisticado esquema contábil-financeiro para desviar o patrimônio das empresas do grupo, transferindo-o para os seus sócios e interpostas pessoas (laranjas), com a finalidade de elidir tributos e direitos trabalhistas de centenas de empregados.”
Foram criadas empresas paralelas, com sócios aparentes, para receber o patrimônio do grupo empresarial, com a finalidade de impedir o pagamento dos créditos trabalhistas e tributários, garantindo que o patrimônio permanecesse com seus gestores.
Ainda segundo as investigações, empresas do grupo movimentaram mais de R$ 56 bilhões de forma irregular entre 2015 e 2019. Segundo o delegado regional de combate ao crime organizado da Polícia Federal, Alexandre Alves, até mesmo funcionários participaram das transações. “A secretária de um dos gestores movimentou milhões e milhões”, disse.
Ativos do grupo também foram distribuídos para integrantes da família, a fim de possibilitar o esvaziamento patrimonial das empresas. O esquema tinha como objetivo sonegar tributos e driblar as execuções trabalhistas. “Com o sucateamento das empresas, elas foram perdendo o capital para manter o giro, manter o andamento dos negócios, e, diante disso, algumas foram entrando em inatividade”, explicou.
Em função da forma de ocultação patrimonial empregada pela organização, a operação foi denominada Background, em referência a um conjunto de condições que omitem a realidade.
Diversas empresas do grupo eram utilizadas nesse esquema. Também foi verificada a ocorrência de subfaturamento em exportações, "com o claro objetivo de remeter, ilicitamente, recursos ao exterior".
Ainda segundo a PF, além da colheita de elementos de materialidade e indícios de autoria, a equipe de investigação busca, nessa fase do trabalho de apuração, recuperar o patrimônio desviado e ocultado pelos investigados, com o objetivo não só de reparar o dano patrimonial causado aos cofres públicos, através dos débitos tributários já constituídos, mas liquidar os créditos trabalhistas de centenas de empregados do grupo.
“Com grande parte de suas atividades paralisadas após o esvaziamento patrimonial criminoso, as empresas do grupo investigado deixaram centenas de trabalhadores sem receber salários e outros direitos trabalhistas, sendo um dos objetivos da investigação permitir que essas famílias de trabalhadores recuperem os seus direitos por meio da Justiça do Trabalho, que inclusive já os reconheceu formalmente”, informou a Polícia Federal.
Segundo a procuradora do Ministério Público do Trabalho em Pernambuco, Débora Tito, os bens apreendidos serão liquidados e utilizados para quitar as dívidas trabalhistas, entre outros débitos das empresas do Grupo João Santos.
"Vamos fazer isso na liquidação da sentença e vão ser pagos todos os trabalhadores, tanto os que têm ação individual, quanto os que estão com débitos do plano de demissão voluntária. Mas é importante dizer que não é automático. Vimos [na apreensão dos bens] essa luz no fim do túnel para pagar os trabalhadores, mas ainda vamos liquidar tudo isso que está sendo encontrado para depois fazer o pagamento através da Justiça do Trabalho."
Fundado pelo empresário João Santos, que morreu em 2009 aos 101 anos, o Grupo Industrial João Santos é composto por 47 empresas, estando algumas delas já inativas. Somente o Cimento Nassau, principal empreendimento do grupo, teve 11 fábricas, dentre elas, uma unidade em Cachoeiro de Itapemirim, na região Sul do Espírito Santo. A maioria delas está com as atividades paralisadas.
O patrimônio do conglomerado começou a se dilapidar devido a dívidas bancárias, que motivaram a venda de uma fábrica em São Paulo, na década de 1990. Após a morte do patriarca do grupo empresarial, disputas entre os filhos de João Santos intensificaram os problemas.
No Estado, imóveis da fábrica de cimento Nassau chegaram ser leiloados pela Justiça para pagar dívidas trabalhistas da empresa com mais de 800 funcionários, entre ativos e os que já foram desligados da companhia.
Em nota, o advogado Taney Farias, que representa o grupo, afirmou que as empresas foram surpreendidas pela operação e que "cabe aos acusados se colocar à disposição para prestar todos os esclarecimentos".
Veja o posicionamento na íntegra:
"Com relação aos fatos investigados na denominada “Operação Background”, as empresas que foram acusadas e seus diretores guardam absoluto respeito as decisões judiciais e aos órgãos envolvidos na apuração (Receita Federal, PGFN, Ministério Público e Polícia Federal).
As práticas que foram declaradas se assemelham a um “dossiê” que é do conhecimento público, porque objeto inclusive de matéria no jornal Valor, edição de 14/09/2018, onde ficaram refutadas as acusações. Em nenhum momento as empresas foram chamadas para prestar qualquer esclarecimento sobre o que a reportagem chama de “investigações em andamento”.
Surpreendidos pela “operação”, cabe aos acusados se colocar à disposição para prestar todos os esclarecimentos e, tomando ciência oficialmente das acusações, exercer sua defesa de forma ampla, irrestrita, como garante a Constituição Federal.
Finalmente, é de se lamentar que empresas tão importantes para o cenário econômico e social, já abaladas pela crise que afeta seus setores produtivos, sofram investida danosa pela divulgação na mídia de acusações sem ao menos ter sido oportunizado de forma prévia, o sagrado direito de defesa."
*Com informações do G1 Pernambuco, da Polícia Federal e da Receita Federal
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