A novela da recuperação judicial da Viação Itapemirim ganhou um novo capítulo. O desembargador Azuma Nishi do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) concedeu liminar nesta quinta-feira (19) afastando Camila de Souza Valdívia do comando do grupo. Desde a manhã desta sexta (20), a empresa voltou a ter como diretor executivo Sidnei Piva de Jesus.
Sidnei e Camila são empresários de São Paulo e sócios da Itapemirim, que chegou a ser uma das maiores empresas de transporte rodoviário do país. Em outubro de 2016, eles compraram a viação e mais seis empresas em recuperação judicial da família do empresário capixaba Camilo Cola.
Essas empresas estão em recuperação judicial desde março de 2016, quando o grupo alegou ter R$ 336,49 milhões em dívidas trabalhistas e com fornecedores, além de um passivo tributário de cerca de R$ 1 bilhão. O plano de recuperação judicial foi aprovado pelos credores em abril deste ano e, desde então, a companhia tem realizado leilões para pagar as dívidas.
O desembargador acatou o pedido de Sidnei, que alegava que Camila promovia desvios de recursos na empresa e questiona a competência administrativa da empresária. Anteriormente, Sidnei ocupava o comando do grupo, mas ele havia sido afastado por decisão judicial da primeira instância da Justiça paulista há cerca de quatro meses por descumprimento do plano de recuperação judicial. Nishi chegou a citar na decisão que há uma grave animosidade entre os sócios e que isso pode prejudicar as empresas.
Desde então, Camila ocupava a função de diretora executiva. Ele recorreu no segundo grau e obteve a liminar que determina seu retorno às funções. Com isso, ambos seguem sendo sócios das empresas do Grupo Itapemirim, porém, Camila perde o poder de decisão sobre as empresas.
Em uma segunda decisão datada desta quinta (19), o juiz João de Oliveira Rodrigues Filho da 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais de São Paulo ressalta que o retorno de Sidnei às funções não lhe permite descumprimento do plano de recuperação judicial de qualquer forma.
"Desse modo, deverá prestar contas de todos os atos de gestão que praticar a partir desta data, a fim de que os credores e o Juízo possam ter ciência plena acerca da continuidade da empresa e do cumprimento do PRJ (plano de recuperação judicial)", decidiu.
Um funcionário da empresa, que preferiu não se identificar, relatou para A Gazeta que, diante da decisão, a reação de funcionários atuais e antigos que são credores foi de perplexidade e temor. Segundo ele, Camila comunicou a determinação judicial "aos prantos" a alguns funcionários nesta sexta durante almoço em São Paulo na sede da empresa, no bairro de Vila Guilherme.
"Ficou um clima de apreensão muito grande porque o que estávamos vendo era que o plano de recuperação judicial estava sendo cumprido. Os salários estão em dia, estão cumprindo com os acordos e fazendo investimentos. Então, fica uma incerteza, causando medo nos funcionários", disse.
Procurada pela reportagem, Camila de Souza Valdívia disse não estar desacreditando no que está acontecendo e que está "extremamente chateada". A sócia destituída do comando negou que tenha praticado desvios e afirmou que fazia uma gestão profissional no grupo, como determinava o plano de recuperação judicial.
"Não tinha como haver (desvios) porque a viação tem um administrador judicial sentado no caixa da empresa que é uma pessoa diretamente ligada ao juiz. Isso não existe, não pode ser provado", afirmou Camila, que continuou:
"Fizemos o ano de 2019 ser o melhor dos últimos 10 anos do grupo, com crescimento de 23% por causa da gestão profissional que é exigida no plano de recuperação judicial. Foi respeitando o plano que a empresa regularizou o pagamento de todos os salários e benefícios, pagou antecipadamente o 13º e voltou a pagar o Fundo de Garantia que não se pagava há 10 anos."
Camila disse que está entrando com recursos contra a decisão e uma cautelar na Justiça para que o plano de recuperação seja cumprido. Ela também afirmou que, nesta sexta, após Sidnei reassumir a empresa, 20 profissionais das áreas de gestão e operacional foram demitidos e não foi pago o adiantamento salarial dos funcionários da Itapemirim que deveria ser depositado neste dia 20.
Já Sidnei Piva de Jesus se mostrou feliz com a decisão e confirmou que promoveu uma "renovação de toda a diretoria" que segundo ele era "fraca, cara e ineficaz". Para A Gazeta, ele prometeu cumprir o plano de recuperação judicial e disse que a gestão da Itapemirim sob seu comando será mais profissional.
"Não vamos deixar de cumprir o plano e de ter um CEO com experiência de mercado. Já coloquei auditoria em todos os setores da empresa para dar transparência com o apoio do Eduardo Scaperllini (responsável pela EXM Partners, administradora judicial do grupo)", disse o empresário, que continuou:
"A ideia de ter uma gestão profissional era ter uma gestão séria, mas várias coisas apontavam que isso não estava acontecendo. Como sócio preocupado com a empresa, pleiteei na Justiça e eles entenderam a importância de ter um gestor com experiência e capacidade como eu tenho. Agora terei liberdade para tomar as decisões para dar os rumos corretos para a empresa e fazer tudo sem dilapidação de patrimônio. Com certeza isso vai acalmar o mercado e tranquilizar trabalhadores e credores".
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Uma das maiores empresas de transporte rodoviário do país, a Viação Itapemirim entrou em recuperação judicial em março de 2016, junto com outras empresas que pertenciam à família de Camilo Cola.
A empresa alegou ter R$ 336,49 milhões em dívidas trabalhistas e com fornecedores, além de um passivo tributário de cerca de R$ 1 bilhão.
Cerca de sete meses depois de ter a recuperação deferida, a família Cola vendeu as empresas recuperandas para Camila Valdívia e Sidnei Piva de Jesus, empresários de São Paulo.
Cerca de nove meses após o negócio, Camilo Cola e Camilo Cola Filho afirmaram ter sofrido um golpe, alegando que os empresários que compraram a empresa não honraram com o acordo. A família tenta, desde então, anular o negócio.
Os sócios da Itapemirim, Camila e Sidnei, sempre refutaram as acusações e afirmaram que tudo foi feito dentro da lei.
Mais de três anos após o início da reorganização, o plano de recuperação judicial foi aprovado pelos credores do grupo em abril de 2019 e homologado pela Justiça.
Os credores aprovaram que a empresa seja dividida em cinco Unidades Produtivas Isoladas (UPIs), que vão absorver os principais ativos da companhia, como imóveis e linhas de ônibus. Essas 'mini-Itapemirins' serão leiloadas em até um ano. Quatro delas são de linhas de ônibus e uma de imóveis.
Após esse ano, a empresa iniciará o pagamento das dívidas. Se os leilões não tiverem sucesso, haverá o parcelamento em 80 vezes.
Sidnei e Camila iniciaram na segunda metade de 2019 uma briga na Justiça pelo comando do grupo. Ele chegou a ser destituído da presidência após decisão da primeira instância da Justiça paulista, mas voltou ao cargo após liminar de segundo grau concedido em dezembro.
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