O Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) decidiu, na tarde desta quinta-feira (27), suspender a lei promulgada pela Câmara da Capital que liberava a abertura do comércio de segunda a sexta, das 10h às 22 horas, e também autorizava o funcionamento de bares. De acordo com a Justiça estadual, ao elaborar a lei, os vereadores de Vitória extrapolaram a competência que possuem para legislar no município, pois contrariam normas do governo estadual, que é a autoridade sanitária, e por se tratar de tema administrativo, o projeto deveria ter sido de autoria do Poder Executivo Municipal.
A decisão do TJES foi em ação movida pelo governo do Estado e o Ministério Público Estadual (MPES) com pedido de liminar ou seja, de urgência para suspender a lei, alegando que ela é inconstitucional. O relator do processo, o desembargador Carlos Simões, votou para conceder a liminar e foi acompanhado por todos os demais desembargadores presentes na sessão on-line.
Ele argumentou que, embora tanto o Estado quanto os municípios possam legislar sobre as medidas de restrição à liberdade adotadas no enfrentamento da pandemia coronavírus, ou seja, tenham competência concorrente, a Câmara extrapolou deste direito.
"A competência estabelecida pela legislação federal para a competência de medidas de combate à Covid-19 é concorrente, mas a regulamentação do interesse local deve respeitar as normas gerais editadas pelo ente estadual", declarou Carlos Simões em seu voto.
Segundo Simões, o município não agiu corretamente ao confrontar as normas estabelecidas pelo Estado.
"No caso, resta claro que a lei abarca interesse regional, de âmbito estadual, já que a autorização de funcionamento de estabelecimentos comerciais fora das hipóteses previstas na legislação estadual, considerando o contexto atual da pandemia do coronavírus, pode frustrar todo o plano estadual de contenção de vírus, além de afetar a administração de leitos de UTI do Estado, especialmente se tratando de município que é a Capital do Estado, onde estão localizados muitos dos estabelecimentos mais procurados pela população do Estado", declarou, no voto.
A Lei Nº 9670/2020 liberava o funcionamento de serviços considerados não essenciais. Segundo a legislação, esses estabelecimentos, como lojas de rua, bares e restaurantes, poderiam atender das 10h às 22 horas, de segunda a sexta, e nos finais de semana, das 10h às 23 horas. A lei contrariou as normas da Matriz de Risco, que define o funcionamento das lojas das 10h às 16h, regra que volta a valer, com a suspensão da lei municipal.
Segundo a última Matriz de Risco do Estado, o município de Vitória tem risco moderado de contágio pela Covid-19, e deve seguir regras específicas para esta situação. Os bares, por exemplo, têm funcionamento proibido, a não ser aqueles que têm registro de bar e restaurante e consigam cumprir, entre outras orientações, distanciamento mínimo de dois metros entre as mesas para receber a clientela.
Em sua fala inicial no julgamento da ação, o procurador-geral do Estado, Rodrigo de Paula, apontou como tese para a suspensão da lei, a competência suplementar dos municípios em matéria de saúde pública, ou seja, o município pode ampliar a legislação estadual, mas não pode a contrariar, como o fez, segundo ele.
"A própria lei que organiza o SUS também faz essa divisão de papéis, na vigilância sanitária e epidemiológica. O município se subordina à coordenação exercida pelo Estado. Não se trata de relação de hierarquia nas relações políticas, mas de repartição de competências", afirmou.
De acordo com o procurador-geral, a lei aprovada também tratou de matéria tipicamente administrativa, cuja edição só pode ser feita por autoridades sanitárias, com base na lei, ou seja, pelo Poder Executivo. Além disso, que houve a violação à separação de Poderes.
A procuradora-geral de Justiça do Ministério Público do Espírito Santo (MPES), Luciana Andrade, afirmou que já há uma percepção clara, nas redes sociais, da intenção da população para encher as ruas, demonstrando que é preciso exigir do Estado do Espírito Santo alguns mecanismos de controle.
"O município extrapolou a competência legislativa, pois em matéria de saúde cabe ao município somente suplementar as normas. Os nossos municípios não têm muros, como na Grande Vitória, e quem conduz essa coordenação é o Estado. O distanciamento de qualquer município dessas diretrizes estabelecidas pelo Estado é extremamente nocivo, pois traz vulnerabilidade não só ao cidadão da Capital, e sim de todo o Estado, pois todos nós concorremos para um mesmo sistema de saúde, e os mesmos leitos. O Poder Estadual é o genuíno para gerir", apontou.
Em defesa da legislação municipal, o procurador da Câmara Municipal de Vitória, Tarcísio Correa, afirmou que a Casa não entendeu que exista vício formal ou material na lei, pelo fato de que o próprio decreto estadual já permitiu a abertura do comércio, e que a lei dispõe sobre a flexibilização, amparada pela súmula do Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo ele, ela estabelece que é, sim, competência do município fixar horários do comércio, enquanto a decisão sobre a abertura ou não, é estabelecida pelo governador.
"Passados cinco meses, é hora de retomar as atividades, com ampla cautela. Nesse momento, precisa ficar claro que a lei fixou horários atendendo ao interesse e especificidade local, respeitando o decreto estadual. O projeto de lei foi no sentido de flexibilização de horários, e não de liberação o comércio. Fixação de horários não é liberar ou fechar o comércio", afirmou.
Ele também frisou que o Executivo municipal, ou seja, o prefeito de Vitória, Luciano Rezende (Cidadania), que poderia vetar o projeto de lei, não o fez, concordando, portanto, com a legislação. O prefeito não sancionou expressamente, e nem vetou o texto. Com o fim do prazo para sua manifestação, houve então a sanção tácita, ficando a cargo da Câmara apenas promulgar a lei.
O autor da proposta de flexibilização do funcionamento do comércio, vereador Mazinho dos Anjos (PSD), disse que vai recorrer da decisão do TJES. "Sou advogado, além de empreendedor e vereador, e entendo que decisão judicial deve ser sempre respeitada e cumprida. Entretanto, na Câmara, entendemos que é uma decisão equivocada e vamos recorrer em prol da flexibilização do trabalho aos empreendedores de Vitória", afirmou, em nota.
O presidente do Sindicato de Bares e Restaurantes do Espirito Santo (Sindbares), Rodrigo Vervloet, por nota, afirmou que os comerciantes da capital vão cumprir o que foi definido pela Justiça estadual. "Nosso posicionamento é pela obediência à decisão judicial. Continuaremos as tratativas com o governo no intuito de demonstrar que estamos preparados para voltar com segurança", disse.
As lojas de rua e de centros comerciais podem ser abertas aos sábados, das 9h às 15h e, durante a semana, das 10h às 16h. O distanciamento social em fila e o limite do número de clientes conforme o espaço físico seguem as mesmas regras do risco baixo.
Os estabelecimentos também estão liberados para funcionar aos sábados, mantendo o horário que é adotado durante a semana, do meio-dia às 20h. Os restaurantes da praça de alimentação têm funcionamento autorizado até as 18h durante todos os dias, incluindo o domingo. O acesso de crianças até 12 anos continua proibido.
Os restaurantes estão liberados para funcionar todos os dias da semana, até as 18 horas. Já os bares continuam proibidos, a não ser aqueles que têm registro de bar e restaurante e consigam cumprir, entre outras orientações, distanciamento mínimo de dois metros entre as mesas para receber a clientela.
Atividades aeróbicas individuais são liberadas, mas deve ser respeitado o distanciamento de quatro metros entre os usuários.
Independentemente da classificação de risco do município, algumas orientações valem para todos os segmentos, tais como a obrigatoriedade do uso de máscaras e a disponibilização de álcool em gel para os funcionários e os clientes, bem como respeito a todas as medidas sanitárias estabelecidas pela Secretaria de Estado da Saúde (Sesa).
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta