Uma nova ação civil pública foi ajuizada a respeito do caso do rompimento da barragem da Samarco, em Mariana (MG), ocorrido há oito anos e que provocou mortes e danos em toda a bacia do Rio Doce, incluindo o Espírito Santo.
Na ação movida pelas instituições de Justiça que atuam no caso — Ministério Público Federal (MPF), Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Ministério Público do Espírito Santo (MPES), Defensoria Pública da União (DPU), Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais (DPMG) e Defensoria Pública do Estado do Espírito Santo (DPES) —, foi feito um pedido de pagamento de R$ 3,6 bilhões de indenização por danos morais coletivos contra as empresas Samarco, BHP Billiton e Vale, além da Fundação Renova.
As entidades reuniram na ação relatórios e documentos apresentados à Justiça que comprovariam que o processo de reparação invisibilizou mulheres atingidas e violou direitos.
Além da indenização, outro pedido apresentado à Justiça é para o pagamento de uma indenização mínima de R$ 135.552 para cada mulher atingida, pelos danos materiais causados pela violação sistemática aos direitos humanos, e de, pelo menos, R$ 36 mil pelos danos morais sofridos.
Ainda há um pedido liminar de que as empresas e a Renova promovam, emergencialmente, a atualização, revisão e correção do registro de todas as mulheres cadastradas ou com solicitações de cadastro pendentes, a partir de requerimentos individualizados já apresentados e a serem apresentados pelas vítimas atingidas. O objetivo é conseguir incluir mais mulheres, permitindo acesso aos programas de auxílio financeiro e indenização mediada.
Um relatório sobre a situação das mulheres atingidas pelo desastre do Rio Doce no Espírito Santo, elaborado pela Defensoria Pública e juntado à ação, aponta falta de integração entre as iniciativas de reparação e a rede de políticas públicas de atendimento à mulher, a inexistência de mesas de diálogo composta integralmente por mulheres e a exclusão da matriz de danos de atividades laborativas típicas de mulheres.
Além disso, dados fornecidos pela Fundação Renova demonstram que, mesmo tendo um cadastro integrado, realizado por ela mesma, com quantitativo semelhante entre homens e mulheres, há reduzida participação da mulher já na oitiva para levantamento de dados primários.
“Apenas 39% das pessoas entrevistadas eram do gênero feminino e apenas 34% de mulheres foram elencadas como responsáveis economicamente pela casa”, cita a ação.
As instituições que assinam a ação destacam a importância do cadastro, lembrando que representa a porta de entrada da Fundação Renova para os 41 programas de reparação ambiental e socioeconômica.
“Assim, a ausência de participação das mulheres na coleta de dados na base da reparação trouxe efeitos danosos de caráter excludente e invisibilizador da realidade das mulheres antes e depois do desastre”, observam.
O relatório aponta ainda que a utilização, pela Fundação Renova, de um modelo de família patriarcal como único tipo possível foi apontada como base para violações de direitos. Conforme a ação, isso gerou para as mulheres inúmeros problemas, como dificuldade de acesso aos seus dados pessoais inseridos na plataforma gerida pela fundação e também obstáculos para requerer a correção de dados incorretos, condicionando o ato à autorização de seus maridos.
“Ao assim proceder, a Fundação Renova e as mantenedoras revisitam o arcaico Código Civil de 1916, considerando, na prática, as mulheres incapazes de exercerem os atos da vida civil sem a supervisão do homem”, assinala a ação.
A ação afirma que o processo de reparação do desastre do Rio Doce vem, até agora, não apenas reproduzindo violências de gênero, mas também reforçando-as e aprofundando-as no território. Reivindica, em razão disso, que o Poder Judiciário corrija o caminho tomado até o momento.
“Os erros cometidos durante o processo de compensação e reparação ao longo desses quase 9 anos, dentre os quais se destaca a carência de ações afirmativas com recortes de gênero, devem ser reconhecidos, revertidos e combatidos, para que o curso mude de rumo e haja redução efetiva dos danos coletivos e sociais, que são ainda maiores dentro de grupos já vulnerabilizados por questões históricas e culturais", aponta a ação.
A Fundação Renova informa que não possui conhecimento da referida ação judicial e reforça seu compromisso com a reparação e compensação dos danos causados pelo rompimento da barragem de Fundão.
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