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Não é só o coronavírus que tem adoecido as economias brasileira e do ES

Não é só o coronavírus que tem adoecido as economias brasileira e do ES

Ainda fragilizado desde a recessão, o Brasil tem sentido os fortes sintomas provocados pela epidemia. Mas a incerteza da retomada tem causado mais efeitos colaterais, como a alta do dólar

Publicado em 6 de março de 2020 às 14:26

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Coronavírus está afetando o cenário econômico mundial. (Shutterstock)

Muitas vezes costumamos minimizar os efeitos de uma gripe. Mas a doença pode se tornar bem grave quando atinge pessoas debilitadas. Podemos comparar essa situação com o atual cenário da economia brasileira: um paciente em recuperação, após um longo tempo em coma na UTI, que se deparou com uma epidemia global que tem infectado o mercado e o tornado vulnerável.

Claro que o coronavírus tem mexido com a economia de todo o planeta, a questão é que no Brasil alguns erros anteriores ao surto e outros que têm se manifestado neste período frágil têm contribuído para uma conjuntura desfavorável à recuperação.

Mesmo após intervenções do Banco Central, na última quinta-feira (6), o dólar fechou aos R$ 4,651 e a Bolsa de Valores de São Paulo caiu quase 5%.O temor do avanço do coronavírus no Brasil com a confirmação de novos casos provocou essa fuga de capitais. Investidores se preocupam com efeitos do vírus na produção, no consumo e no setor logístico. Na manhã desta sexta, a moeda americana já havia chegado próximo a R$ 4,66 e o Ibovespa tinha caído mais de 4%.

Essa disparada do câmbio já pressiona os preços de peças importantes para a indústria brasileira. O setor de eletrônicos, eletrodomésticos e informática já estão pagando mais caro pelos itens que precisam usar para a fabricação, o que pode provocar inflação.

Câmbio em crise: Brasil tem dificuldades de controlar a alta do dólar. (Pixabay)

Apesar de acender o alerta sobre uma retração no crescimento. a doença, no entanto, não explica sozinha essa turbulência no mercado brasileiro. Os resultados do PIB, divulgados na última quarta-feira, frustraram quem acreditava que o país estava deixando a letargia.

A situação piorou com o sinal dado pelo Banco Central, após a queda dos juros americanos. O Comitê de Política Monetária (Copom) pode no próximo encontro do colegiado, marcado para os dias 17 e 18 de março, reduzir novamente a Selic. A mensagem foi captada com pressa pelos investidores, que não veem mais atratividade em manter o dinheiro aqui.

4,25%
É a taxa Selic

Para muitos analistas do mercado financeiro, o órgão que controla a política monetária brasileira, tem cometido equívocos, não sabendo lidar com a situação coronavírus, câmbio e Selic, o que têm piorado a percepção sobre o Brasil.

A alta incerteza que nos ronda e o baixo crescimento global previsto para este ano se associa ainda a outras doenças crônicas brasileiras:

  • O país ainda tem graves problemas fiscais. A reforma da Previdência não é capaz sozinha de evitar o Brasil entrar na insolvência, sendo necessário outras medidas como a reforma administrativa para reduzir os gastos governamentais;
  • Na luta para reduzir o rombo fiscal, o país cortou gastos que afetou o investimento público e isso tem repercutido no desempenho da nossa economia. Os prometidos pacotes de concessões e privatizações não saíram do papel para compensar essa retração nos gastos do governo. É preciso acelerar essas medidas para dar dinamismo e reduzir o lento avanço da infraestrutura, outro problema que nos impede de crescer;
  • Faltam malhas viárias para atender ao sistema logístico e favorecer a exportação de produtos brasileiros, que deixam de ser competitivos no mercado internacional devido ao seu alto custo de transporte;
  • As famílias não se recuperaram ainda da grave crise econômica. Embora o mercado de trabalho tem começado a reagir, a renda do trabalhador se encontra em patamar semelhante ou até menor, algo que não favorece ao consumo nem a expansão dos negócios;
  • O atraso no envio da reforma tributária, assim como a da reforma administrativa, também são fatores de impedimento para a economia brasileira. Após a reforma da Previdência, o mercado acreditava numa possível discussão mais ágil de outras pautas.

Diante de todo esse quadro brasileiro, o Espírito Santo também continuará infectado pelo baixo dinamismo, segundo os especialistas. O coronavírus e esses outros problemas brasileiros também devem contribuir para manter o Estado numa “quarentena”.

A economia capixaba tem ainda seus próprios fantasmas para enfrentar. Tem sido impactada diretamente pela queda nas exportações e importações devido à epidemia, que começou na China. Como um grande produtor de commodities, o Estado tem visto a desvalorização do preço de produtos como minério de ferro e petróleo.

Somado ao problema do comércio internacional, o Espírito Santo corre sérios riscos de perder parte dos royalties e participações especiais do petróleo para os Estados e municípios não produtores.

Em um momento crítico para a economia, o Estado tem ainda aumentado seus gastos, o que eleva a preocupação com a questão fiscal. Um ponto de reflexão é o reajuste de 40% que será dado às forças de segurança, benefício que também pode ser reivindicado pelas outras categorias do serviço público. A despesa extra com os profissionais da segurança pública será de R$ 600 milhões anuais a partir de 2023,  quando todas as tabelas de aumento estiverem aplicadas.

R$ 600 milhões
Será o gasto anual do Estado a partir de 2023 com o reajuste dado às categorias da segurança pública

Embora tenha um baixo endividamento, os gastos do Estado com empréstimos cresceram 4% em 2019, segundo relatório da Secretaria do Tesouro Nacional. O governo local explica que essa alta tem relação com a desvalorização do real perante o dólar. Como o câmbio está em processo de alta, existe o risco de os empréstimos ficarem mais onerosos. Vale lembrar que o Estado batalha para destravar mais de R$ 1,5 bi em novos créditos.

O Espírito Santo e o Brasil não podem descuidar da saúde econômica. O primeiro precisa trabalhar para não perder o que alcançou. É hoje um dos poucos Estados com as finanças organizadas do país. O segundo deve agilizar os processos, redução da burocracia, aprovação das reformas, avanço na infraestrutura, para passar a mensagem de que tem trabalhado para se curar dos seus entraves.

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* Mikaella Campos é editora de Economia de A Gazeta

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