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O truque que tem reduzido o tamanho das barras de chocolate a cada ano

O truque que tem reduzido o tamanho das barras de chocolate a cada ano

Nas principais fabricantes, a evidência da redução dos produtos pode ser encontrada nas próprias embalagens, por exigência do Código de Defesa do Consumidor

Publicado em 27 de maio de 2023 às 16:17

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Julia Paranhos
Estagiária / [email protected]
Felipe Sena
Estagiário / [email protected]

Há quem lembre de comprar uma barra de chocolate e ainda ver o produto sobrar para mais tarde. E há também quem recorde desses produtos com tamanhos que chegavam a até 200 gramas. Não, isso não é um Efeito Mandela — ou seja, uma memória falsa e coletiva. A diminuição acontece anualmente com os chocolates e é chamada de reduflação.

chocolate
Barras de chocolate. (Freepik)

Para saber o que é a reduflação, basta separar a palavra em duas partes: “redu” vem de reduzido e “flação”, de inflação. Assim, fica mais claro para entender que se trata do fenômeno de reduzir a quantidade do produto ou utilizar ingredientes mais baratos para manter ou aumentar o preço.

De acordo com a coordenadora do programa de serviços financeiros do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Ione Amorim, a prática é mais frequente nos momentos em que a inflação está em alta.

“A indústria, para não criar uma relação direta com o aumento do preço, o que faz? Recorre à reduflação. É como se estivesse dizendo que não está tendo aumento de preço. Mas, se está tendo redução de quantidade, então existe um aumento. É uma forma de mascarar a realidade sobre essa questão”, explica Ione.

Nas principais fabricantes de chocolates, como a Nestlé, Garoto e Lacta, a evidência da redução dos produtos pode ser encontrada nas embalagens, devido às exigências do Código de Defesa do Consumidor.

No código, consta que a redução de tamanho dos produtos por parte das empresas precisa estar em destaque na embalagem. O artigo 6º estabelece que a informação ainda deve estar clara e objetiva para que o consumidor tenha o direito de escolha.

Nas embalagens da Nestlé, por exemplo, é possível ver o encolhimento em alguns tabletes regulares de 90g para 80g, como Nestlé Classic Ao Leite, Prestígio, Classic Duo e Meio Amargo. 

Em relação à Chocolates Garoto, A Gazeta realizou pesquisas no acervo para uma maior comparação desse fenômeno nos tabletes durante os anos.

Em 2014, a barra de chocolate Garoto Ao Leite tinha 150g. Atualmente, o mesmo produto tem 90g. Ou seja, reduziu 60g em oito anos. Arraste o cursor na imagem abaixo para ver a variação no tamanho do tablete.

Contudo, não foi só este produto que encolheu. O peso do Alô Doçura, Crocante, Caju e Passas também ficou menor ao longo dos anos.

Segundo Nestlé e Garoto, a adoção de novos formatos e tamanhos dos produtos tem como objetivo acompanhar as tendências de mercado e garantir a adequação a inovações tecnológicas, a fim de manter a competitividade entre as marcas.

“As alterações estão em conformidade com a legislação vigente, respeitando os princípios do Código de Defesa do Consumidor, e seguem comunicadas de forma clara no painel frontal da embalagem, com o alerta de novo peso e a especificação da quantidade reduzida, para que o consumidor possa identificar facilmente a mudança”, afirma.

Outras fabricantes

Na marca Lacta, a prática pode ser observada nos produtos Diamante Negro, Shot e Chocolate Branco, entre outros que nos últimos meses passaram de 90g para 80g. 

Essa fabricante também explicou o motivo da diminuição de seus produtos, reforçando que “é parte da estratégia focar em inovações com o objetivo de construir um portfólio de qualidade em diferentes formatos, tamanhos e preços, para atender às necessidades do consumidor em diversas ocasiões”.

E essa é só a mudança mais recente. Retornando aos anos 1990, é possível ver que já existiram barras com 200g. Como exemplo,  estão alguns dos clássicos da marca que são vendidos até hoje, como o Diamante Negro e Chocolate Branco. 

Barras de chocolate Lacta dos anos 90/ atualmente
Barras de chocolate da Lacta nos anos 1990 e atualmente. (Núcleo de Reportagem A Gazeta)

A Mondelez International, que detém várias marcas de chocolate além da Lacta, como 5 Star, Milka, Toblerone e Alpen, explica que o portfólio é diversificado para atender a diversos momentos. Afirma ainda que há uma opção maior, de 165g, disponível à venda. 

Posicionamento da Mondelez International na íntegra

A Mondelez International possui um portfólio diversificado, com foco em entregar o snack certo, para o momento. Dentro deste cenário, Lacta conta com um portfólio amplo para atender diversas ocasiões de consumo: para compartilhar com a família (165g), para degustar e presentear alguém especial (80g) e até versão unitária para alegrar o dia (34g). Em outubro de 2022, inclusive, a versão individual passou de 20g para 34g, com novo formato que traz mais chocolate por mordida, oferecendo uma experiência superior para o consumidor. A companhia reforça que é parte da estratégia focar em inovações com o objetivo de construir um portfólio de qualidade em diferentes formatos, tamanhos e preços, para atender os diversos momento de consumo.

Barras de chocolate da Lacta

Fundada no século 19, a Hershey's, já era consolidada no mercado internacional quando chegou ao Brasil em 1998, segundo informações disponíveis em seu site oficial. A fabricação de barras de chocolates da marca por aqui, contudo, começa apenas em 2001, com a aquisição da Io-iô Cream e sua fábrica em São Roque, São Paulo. 

A embalagem mais antiga encontrada é de 2013. Na época, a barra tinha 130g. Em 2021, o tablete de mesmo sabor aparecia em anúncios de supermercados já com um design diferente, informando uma redução do tamanho de 115g para 92g. Atualmente, a embalagem passou por nova repaginada no visual, mas segue disponível à venda com 92g.

Barra de chocolate Extra Cremoso da Hersheys's, entre 2013 e 2023. (Montagem Núcleo de Reportagem A Gazeta)

A Hersheys's atribuiu a diminuição do tamanho à oscilação econômica e ao aumento de custo das matérias-primas. A resposta enviada pela empresa pode ser lida, a seguir.

Posicionamento da Hershey's na íntegra

Essa estratégia é adotada devido à grande oscilação econômica. O custo das matérias-primas aumentou consideravelmente, impactando diretamente as indústrias. A Hershey's tomou a decisão de diminuir o peso para evitar o aumento do preço final ao consumidor, mantendo a mesma qualidade dos seus chocolates.

Barras de chocolate

Quem também diminuiu o tamanho de suas barras foi a marca gaúcha Neugebauer, fundada em Porto Alegre (RS) pelos imigrantes alemães Franz Neugebauer e Max Neugebauer. Os produtos, que já chegaram a ser vendidos com 180g, agora são encontrados com 90g. 

Chocolate Neugebauer vendido em 2009 com 160g e agora com 90g. (Montagem Núcleo de Reportagem A Gazeta)

A reportagem de A Gazeta tentou contato com a Neugebauer por diversos canais. Não houve retorno por e-mail, nem pelo Fale Conosco do site ou pelos perfis nas redes sociais. Por telefone, foi informado que a resposta seria enviada pelo setor de marketing da empresa. Contudo, em todas as tentativas, a ligação caiu durante a transferência para o setor. O espaço segue aberto para o pronunciamento da marca.

Saiba mais sobre a prática

Para tirar algumas dúvidas sobre o fenômeno da reduflação, a especialista Ione Amorim e o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) responderam alguma perguntas.

Quanto tempo a empresa precisa manter em destaque a mudança no tamanho do produto?

  • "As empresas precisam manter num período de até seis meses, em destaque, de que houve uma redução proporcional de quantidade naquela embalagem”, explica Ione Amorim.

O que devo fazer caso encontre uma embalagem sem o indicativo?

  • É possível fazer uma denúncia através de um Procon ou na própria plataforma da Secretaria Nacional do Consumidor, que é o consumidor.gov.br. Ou ainda pode procurar o SAC da empresa.

O supermercado pode ser responsabilizado, caso alguma embalagem não esteja com as informações?

  • “Não. Porque, na verdade, quando a gente fala da mudança no tamanho da embalagem, isso é uma responsabilidade da indústria", aponta Ione Amorim.

Quem não cumpre sofre alguma multa?

  • De acordo com o Idec, a empresa que descumprir essa regra tem que pagar. E a multa pode chegar a quase R$ 10 milhões.

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