O uso de um idoso morto para tentar contratar um empréstimo em um agência bancária de Bangu, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, nesta semana, acendeu um alerta sobre a vulnerabilidade de grupo etário a golpes financeiros.
O aposentado José Rodrigues, de 73 anos, por exemplo, luta na Justiça para recuperar o dinheiro descontado indevidamente do benefício após um cartão de crédito não solicitado passar a ser descontado na folha de aposentadoria.
“Fiz um empréstimo consignado e, no meio dos pagamentos, colocaram também a folha de um cartão que eu não solicitei. Foram bancos diferentes. Mas, ao contrário do empréstimo, que tem um tempo, o desconto do cartão é vitalício. Então, vai descontando mesmo que eu não use. Já pedi cancelamento e agora estou tentando ressarcimento pelo prejuízo que tive. Foi coisa de R$ 3 mil a R$ 4 mil. E isso é alguma coisa, né (sic)?”, reclama o aposentado.
A causa por trás do problema já foi identificada, segundo José. Mas, por conta do processo que move na Justiça, ele prefere não comentar.
O advogado previdenciarista Rafael Vasconcelos aponta que os casos de golpes são frequentes. Um dos mais comuns é praticado por meio de chamadas telefônicas, por parte de empresas de telemarketing de instituições financeiras.
“Ligam dizendo um valor que a pessoa tem a receber, mas não mencionam que é empréstimo, que é a margem de consignado. Só falam que tem um valor a ser recebido e a pessoa concorda. Mas, só no mês seguinte, quando cai a renda com o desconto, a pessoa descobre que é um empréstimo”, relata o advogado.
Vasconcelos lembra outra situação recorrente, em que empresas ligam oferecendo a repactuação do empréstimo. Mesmo que a pessoa negue, a "negociação" segue em frente, usando a assinatura da pessoa colhida no momento da primeira contratação. Assim, a vítima acaba sendo fraudada posteriormente.
Além disso, há casos de pessoas homônimas – com o mesmo nome de outros beneficiários de aposentadoria, por exemplo – que sofrem esse desconto indevidamente.
“Geralmente, pessoas de nome comum estão mais propensas a fraudes. As recomendações que faço são o bloqueio para empréstimo consignado no site do INSS e dessas associações. E é importante ficar acompanhando o extrato do benefício. Se identificar que tem um empréstimo não confirmado por ela, faça um boletim de ocorrência e ajuíze a ação, pois tudo que é cobrado indevidamente pode ser devolvido em dobro, além de danos morais pela falta de diligência das instituições financeiras ou associações”, orienta o advogado.
Os casos de golpe são diversos e rotineiros. Alguns ocorrem em bancos ou por ligação telefônica. Em outras situações, são praticados por pessoas conhecidas, inclusive familiares, conforme explica a delegada Milena Gireli, da Delegacia Especializada de Proteção à Pessoa Idosa (DEPPI).
“Infelizmente, a maioria dos nossos crimes contra as pessoas idosas é de abuso financeiro. Há muitos casos de utilização indevida do cartão, do uso do nome da pessoa idosa para outros fins, como fazer empréstimo ou seguro. Pegam toda a documentação, entram em sites, aplicativos e fazem a contratação, e as parcelas vão sendo descontadas mês a mês”, conta Milena.
A delegada explica que as denúncias são frequentes e, em muitos casos, os crimes são praticados por pessoas próximas, como filhos, netos ou cuidadores. Por conta das particularidades existentes, muitas vezes há resistência em relatar o ocorrido. Nesse sentido, ela reforça que a existência de testemunhas pode ajudar a facilitar o processo contra os fraudadores.
“Dificilmente um pai ou uma mãe vai chegar na delegacia e contar toda a verdade. Por isso, é importante ter testemunhas, pessoas que ajudem a contar a verdade. É um grupo mais vulnerável. E são pessoas que às vezes se sentem um fardo, que não têm a informação adequada sobre o destino do benefício… Por isso, é importante a gente falar, divulgar que o benefício é próprio e não deve ser utilizado para outros fins”, explica a delegada.
Milena Gireli destaca ainda outros casos de golpes, como a abordagem em saídas de bancos e a oferta de ajuda para acessar a conta, ocasião em que as senhas acabam sendo divulgadas a estranhos. Além disso, há situações de estelionato sentimental, em que alguém se aproxima, cria um vínculo com a pessoa idosa e começa a pedir dinheiro. As principais vítimas, nesta e em outras ocorrências, segundo a delegada, são as mulheres.
“Se for vítima, denuncie. Qualquer delegacia é obrigada a registrar qualquer crime. Não precisa ser especializada. Vá à delegacia mais próxima, ou qualquer instituição, como os CRAS (Centro de Referência de Assistência Social) ou PAs (Pronto-Atendimentos). Recebemos muitas denúncias que a assistência social repassa para a gente. Outros grandes meios de denúncia são o Disque 100 e o 181, que são anônimos. Isso tudo é para facilitar que o idoso vá onde se sentir mais confortável. Sei da dificuldade de vir em uma delegacia. As pessoas buscam em seu pior momento. Ficam constrangidas, têm medo. E hoje temos, nas delegacias especializadas, psicólogos e assistente social, que vão conversar com essas pessoas, até mesmo para a gente tentar respaldar de outras formas”, detalha a delegada.
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