Os efeitos negativos da crise do novo coronavírus no emprego já ultrapassam aqueles vivenciados durante o auge da crise fiscal brasileira, em 2015. Segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), só nos três primeiros meses de pandemia, o Espírito Santo perdeu 28,5 mil postos de trabalho. Em todo o ano de 2015, pior ano da crise, a perda foi de 46,9 mil vagas.
Comparando períodos iguais, os cinco primeiros meses da crise fiscal (janeiro a maio de 2015) terminaram com um saldo negativo de emprego de 9 mil. Isso significa que houve 9 mil demissões a mais do que admissões. Nos cinco primeiro meses de 2020, esse saldo já está próximo de 25 mil.
Os dados do Caged mostram ainda que abril deste ano foi o mês com o pior saldo de empregos no Estado desde 1996, quando começa a série histórica. Só o setor do comércio fechou mais de 5 mil postos de trabalho.
Para a economista Arilda Teixeira, a Covid-19 nos colocou diante da pior recessão desde a Segunda Guerra Mundial. Ela aponta, contudo, que, diferentemente das anteriores, essa é a primeira vez que a crise não tem raízes econômicas.
"Essa recessão está sendo provocada por uma questão de saúde pública. Ela é, antes de tudo, uma crise sanitária. A economia sofre os efeitos da pandemia, mas não tem instrumentos para anular esses efeitos, como houve em outras ocasiões", avalia.
As medidas de contenção da pandemia provocaram uma espiral negativa em toda a economia. Com a população em casa, o comércio não vende. Sem vender, não há demanda para os setores produtivos. Sem produção, muitas empresas fecham ou demitem seus funcionários. Sem emprego e sem renda, o trabalhador não compra e prejudica o comércio.
"É uma grade sinuca de bico. O ruim dessa história é que ela representa perda de qualidade de vida, desgaste emocional, além das mortes, naturalmente. É um custo humanitário incalculável", afirma a economista.
Outra característica da crise do coronavírus apontada por especialistas é a velocidade. Como em muitos locais as atividades econômicas foram praticamente paralisadas por meses, as consequências chegaram de forma concentrada.
"As crises de 2015 e de 2008 (da bolha do mercado imobiliário americano) chegaram ao mercado de trabalho de forma mais suave. Essa foi abrupta", aponta o economista Eduardo Araújo.
Araújo lembra ainda que a chegada do coronavírus ocorreu em um momento em que o país e o Estado ainda estavam, lentamente e com muito esforço, recuperando as vagas de emprego perdidas na crise anterior. Isso potencializou os efeitos negativos no mercado de trabalho.
"Os economistas sempre falaram da década de 1980 como sendo a 'década perdida' de crescimento econômico. Mas, hoje, já há um consenso de que a verdadeira década perdida é a de 2010 a 2020", afirma.
Mesmo que a pandemia tenha afetado toda a população, ela atingiu de forma mais dura as pessoas que já são vulneráveis, acentuando ainda mais desigualdades de gênero, de raça e de renda no mercado de trabalho.
"Essa crise teve um impacto maior no setor de serviços, comércio, hotelaria, negócios relacionados ao entretenimento e ao turismo. São aqueles onde tradicionalmente há mais mulheres e jovens", afirma Araújo.
Há ainda uma grande parcela da população que nem sequer entra das estatísticas do Caged. Os trabalhadores informais, sem carteira assinada, representam quase 60% da força e trabalho e também foram gravemente impactados.
"Como o rio corre para o mar, naturalmente os mais prejudicados nesse desarranjo são os menos favorecidos. Os trabalhadores informais são os mais precários e os que mais sofrem. Há uma sobreposição de situações muito graves do ponto de vista humano", avalia Arilda Teixeira.
Ambos especialistas concordam que qualquer perspectiva de recuperação econômica depende da distribuição de uma vacina contra o novo coronavírus. Só a partir daí, será possível calcular o estrago feito pela pandemia e começar a traçar um plano de retomada mais concreto.
"Até que haja solução sanitária, não haverá solução econômica", opina Arilda.
Até que seja encontrada uma saída na forma de vacina ou de cura para a doença, os efeitos da crise ainda podem se acentuar. Com o fim da vigência de algumas medidas paliativas do governo federal, como o auxílio emergencial e a redução de jornada e salários, é possível que haja uma nova onda de demissões.
"Há um risco muito grande de a gente ter o fim da validade dessas medidas antes da volta efetiva da economia. Há esforços para a produção de uma vacina, mas ainda não há clareza de como e quando essa distribuição deve acontecer. Toda essa incerteza gera medo nos empresários e na população. E, do ponto de vista econômico, esse medo implica em perdas maiores ainda de negócios e de faturamento", explica Araújo.
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