Em meio a discussões e embates sobre o preço da gasolina no Brasil, o governo federal prepara um Projeto de Lei Complementar para mudar o cálculo do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre combustíveis. A ideia é de que o imposto estadual deixe de ser cobrado por meio de uma alíquota (porcentagem) sobre o preço do litro e passe a ser um valor fixo em real. Segundo reportagem do jornal Valor Econômico, a proposta, que ainda está em discussão, deve prever que cada Estado fixe seu valor, para que consiga preservar a arrecadação.
O problema é que a proposta, segundo especialistas em Direito Tributário, pode conter armadilhas, como elevar o preço dos combustíveis e mesmo pressionar a inflação. Nesta segunda-feira (10), o Ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, disse que a medida será discutida no âmbito da reforma tributária, que deve ser enviada ainda em fevereiro ao Congresso.
Desde o início do ano, o presidente Jair Bolsonaro vem tentando convencer os governadores a baixarem as alíquotas de ICMS para forçar uma queda no preço da gasolina. Atualmente, cada Estado cobra uma porcentagem diferente que varia entre 25% e 30%.
Bolsonaro chegou a desafiar os chefes dos executivos estaduais e disse que iria zerar os tributos federais sobre o combustível (Cide e PIS/Cofins) caso eles também eliminem a cobrança de ICMS. A sugestão não fez sucesso: diversos governadores do país que argumentaram que o imposto é parte imprescindível da arrecadação estadual. O governador do Espírito Santo, Renato Casagrande, inclusive, disse que a "União, se quiser, pode reduzir tributos". O secretária da Fazendo do Estado, Rogelio Pegoretti, disse que a medida proposta era "populista".
No Espírito Santo, 27% do preço da gasolina é ICMS. O recurso obtido dessa fonte representa 14% de toda a arrecadação do Estado.
O advogado tributarista Alexandre Fiorot afirma que, embora polêmica, a proposta de Bolsonaro de aplicar um imposto com valor fixo não é inédita. Já tivemos a experiência de calcular tributos dessa forma em outros produtos. O IPI sobre refrigerantes, por exemplo. Não é inovador, mas precisamo ver os detalhes do projeto para ver como isso deve se desenrolar, diz.
Para ele, a mudança seria "faca de dois gumes", já que pode fazer o preço do combustível ficar menor em momentos de alta, mas pode também impedir quedas de preço. "Se o preço aumento, ótimo, ganha o consumidor. Mas se você tenta reduzir o valor do produto, atinge um teto, porque o valor do imposto é fixo", explica.
O economista e advogado tributarista Bruno Gavioli afirma que um imposto que tem valor fixo pode levar a um outro risco: a indexação. "Eventualmente, com o tempo, esse valor teria que ser atualizado. E, para isso, teria que indexá-lo a algo, seja à inflação, ao preço do barril, ao salário mínimo, etc. Isso gera mais inflação. É uma armadilha", esclarece.
Gavioli lembra que a proposta, mesmo que tenha potencial de funcionar no curto prazo para baixar o preço da gasolina nos postos, não deve passar pelas casas legislativas por conta do grande peso que o ICMS tem para as contas estaduais. "O governo federal não tem hoje capital político para uma mudança como essa", afirma.
A gasolina é um dos produtos atualmente sob regime de substituição tributária. Isso significa que o ICMS é cobrado sobre o produto que sai da refinaria a partir de um valor estimado pelo governo, que é atualizado a cada 15 dias. O imposto é cobrado antecipadamente sobre toda a cadeia. Isso significa que os donos de postos, por exemplo, compram o combustível dos distribuidores por um valor sobre o qual o ICMS já foi aplicado.
Para Fiorot, será necessário ver o projeto do governo federal na íntegra para esclarecer se a mudança para um valor fixo alteraria o regime de substituição tributária. Já para Gavioli, provavelmente não haveria alterações na cobrança.
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