Apontado como uma das principais "cabeças" por trás das paralisações de caminhoneiros realizadas desde o dia 7 em 14 Estados do país, inclusive no Espírito Santo, o caminhoneiro bolsonarista Marcos Antônio Pereira Gomes, conhecido como Zé Trovão, foi localizado pela Polícia Federal escondido em um hotel no México e deve ser preso ainda nesta quinta-feira (9) para então ser transportado de volta ao Brasil.
Ele está foragido há seis dias. A informação foi confirmada por ele mesmo, em um vídeo postado no TikTok no início da tarde desta quinta em que Zé Trovão promete se entregar.
“Em alguns momentos eu devo ser preso. Eu não vou mais fugir, chega, eu estou cansado disso. Para quem não sabe, eu estou no México e a embaixada brasileira acaba de entrar em contato com o hotel que eu estou. Então, em alguns momentos, provavelmente a polícia vem aqui me recolher e vai me levar preso. Eu não cometi nenhum crime, eu estou indo para o Brasil, provavelmente preso, preso politicamente, por crime de opinião”, disse.
Minutos depois, o caminhoneiro postou uma segunda gravação, convocando os caminhoneiros a manterem as paralisações nas estradas e dizendo que os atos não são motivados pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), e sim em defesa da liberdade. Ainda assim, disse que a categoria não cumprirá ordem que não tenham vindo do chefe do Planalto.
“Nós não vamos cumprir ordem que não venha do presidente da República. Não vamos. Nós estamos aqui para lutar por uma bandeira que é verde, amarela, azul e branca. A nossa pauta é o impeachment dos ministros (do Supremo Tribunal Federal). Se vira. Eu não sei o que vai ter que acontecer aí não, mas o pau vai continuar torando (sic) porque nós estamos fazendo tudo democraticamente, dentro da ordem, dentro da justiça. Vamos para cima, gente, não desistam. Povo brasileiro, vamos pra cima das pistas.”
O caminhoneiro Zé Trovão é dono do canal no Youtube "Zé Trovão a voz das estradas", que tem mais de 40 mil inscritos. Em seus vídeos e postagens nas redes sociais, chamava a população para ir a Brasília e exigia a "exoneração dos 11 ministros do STF".
Em outros vídeos, fez ataques à CPI da Covid, no Senado, além de ter participado de "motociatas" em favor de Bolsonaro. No último dia 29, o caminhoneiro se tornou um dos alvos da investigação da Procuradoria-Geral da República (PGR).
Os investigadores da Polícia Federal vinham rastreando o paradeiro de Zé Trovão desde a semana passada, quando a PGR solicitou e o ministro do STF Alexandre de Moraes determinou sua prisão após incitar atos antidemocráticos em 7 de setembro.
Mesmo sendo procurado, o caminhoneiro continuou gravando vídeos e incentivando as manifestações, além de ter ido às redes sociais incitar outros caminhoneiros a bloquearem rodovias e a "fecharem tudo".
Os protestos, que se espalham pelo país há dois dias, chegaram a tomar 14 Estados brasileiros, inclusive o Espírito Santo, onde somente na manhã desta quinta (9) foram contidos.
Embora o fluxo nas rodovias federais estivesse liberado para carros, ônibus e outros veículos, os caminhões que chegavam nesses pontos ficavam impedidos de seguir viagem, o que ocasionou, entre outros transtornos, escassez de combustível em municípios do interior do Estado.
Diferente do que ocorreu em 2018, desta vez, as manifestações não foram comandadas por tradicionais entidades e lideranças de caminhoneiros, que repudiaram o movimento. A paralisação vinha sendo organizada, sobretudo, em grupos de WhatsApp, por autônomos que são membros da ala radical do bolsonarismo.
Em vídeos divulgados nas redes sociais, caminhoneiros autônomos disseram apoiar pautas de Bolsonaro e atribuíram o aumento dos combustíveis aos governadores, além de fazerem ataques ao STF.
Na visão do economista Felipe Storch Damasceno, um dos motivos para que a paralisação não tenha se agravado, chegando a níveis semelhantes à greve observada há três anos, é justamente a ausência de uma demanda que una toda a categoria.
“Uma paralisação mais duradoura arrasaria tudo novamente. O movimento dos caminhoneiros é descentralizado, não tem uma liderança única. Agora, não houve uma adesão tão grande por conta disso, dessas demandas divergentes. Mas é uma categoria muito forte, tem um peso grande.”
Ele pondera que o governo demonstrou não querer bater de frente com o movimento, mas, à sua maneira, interviu para tentar não gerar um transtorno pior mais à frente, principalmente em um momento em que a economia já está amplamente fragilizada, com alta da inflação e das taxas de juros.
Na noite desta quarta (8), o presidente Bolsonaro chegou a divulgar um áudio dizendo que bloqueios atrapalham economia e pedindo para que os caminhoneiros liberassem vias. A veracidade do áudio foi confirmada por dois ministros do governo, conforme apurou a Folha de S. Paulo. A ação desagradou aos caminhoneiros, que disseram querer respostas do presidente.
“Isso foi feito, de algum jeito, e está acabando. Mas, houve ameaças de greves anteriores e se demorou a tentar conter (essa) porque era uma manifestação de apoio a Bolsonaro, não posso afirmar", refletiu Damasceno.
Em boletim divulgado às 14h30 horas desta quinta (9), o Ministério da Infraestrutura, com base em informações da Polícia Rodoviária Federal (PRF), informou que são registrados pontos de concentração em rodovias federais de 13 estados, mas sem registros de interdições.
Segundo apuração do Estadão, entidades que tradicionalmente representam esses trabalhadores como a Associação Brasileira dos Condutores de Veículos Automotores (Abrava), a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes e Logística (CNTTL), a Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA) e a Associação Nacional de Transporte do Brasil (ANTB) informaram que não apoiaram o movimento e que não participaram dos atos.
A Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística (NTC&Logística) repudiou os atos, e declarou, por meio de nota, que “trata-se de movimento de natureza política e dissociado até mesmo das bandeiras e reivindicações da própria categoria, tanto que não tem o apoio da Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos.”
A entidade reforçou que a ação poderia causar sérios transtornos à atividade de transporte realizada pelas empresas, com graves consequências para o abastecimento de estabelecimentos de produção e comércio, atingindo diretamente o consumidor final, de produtos de todas as naturezas inclusive os de primeira necessidade da população como alimentos, medicamentos, combustíveis, entre outros.
A preocupação, afinal, é fundamentada. Em maio de 2018, caminhoneiros de todo o país paralisaram as atividades por vários dias, trazendo um prejuízo incalculável, com morte de animais por falta de comida, impedimento à chegada de insumos, que deixou diversos produtos em falta, inclusive no Estado. Viagens foram canceladas por falta de combustível e até as atividades de alguns portos foram paralisadas após caminhoneiros bloquearem as estradas de acesso.
Na ocasião, os caminhoneiros fizeram manifestações em 22 estados e no Distrito Federal, em protesto contra a disparada do preço do diesel, que faz parte da política de preços da Petrobras, em vigor desde julho de 2017.
Desde então, o preço do combustível segue aumentando, e chegou a ser motivo de atrito entre o governo e os caminhoneiros em alguns momentos, havendo novas ameaças de greve. No início deste ano, Bolsonaro chegou a zerar, por dois meses, os impostos federais sobre o diesel e atribuiu a alta de preços à incidência de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), cobrado pelos Estados.
À Folha de S. Paulo, Raul Jungmann, ministro da Segurança Pública do governo de Michel Temer (MDB), que lidou de perto com a greve de 2018, afirmou que, agora, "o líder é o presidente da República", apontando para o fato de que foi Jair Bolsonaro quem convocou a categoria a integrar os atos golpistas em favor de seu governo no feriado do 7 de Setembro.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta