O Serenata de Amor é daquelas paixões que nasceram aqui no Espírito Santo, mas ganharam o Brasil. Para muitos, é a primeira imagem que vem à mente quando se fala em bombom. Ele e seu principal concorrente, o Sonho de Valsa, contudo, passaram por transformações que vão além do que se imagina.
Ao longo do tempo, foram muitas mudanças, algumas envolvendo a troca de embalagem. Mas a alteração que mais causa estranheza tem a ver com o tipo de produto: deixaram de ser bombons.
A reportagem de A Gazeta analisou uma imagem da embalagem antiga do Serenata, onde é possível ver escrito “bombom” na descrição. Já a versão mais atual vem com a informação de que a guloseima se trata de um "wafer", que é um tipo de biscoito com massa fina.
O que levou as empresas a mudarem a descrição dos produtos? As empresas não esclarecem o que motivou as alterações, mas a resposta pode não ter nada a ver com os bombons (ou wafers), e sim com os impostos sobre eles.
Enquanto chocolates e produtos fabricados com ele estão sujeitos à alíquota de 5% do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), o wafer paga 0% dessa tributação. Essa simples mudança na classificação do produto tem um potencial enorme de gerar economia para os cofres das indústrias.
Segundo a advogada tributarista Sâmara Gomes, temos um dos sistemas tributários mais complexos do mundo. Por um lado, isso é um entrave para o desenvolvimento dos negócios. Por outro, é possível se aproveitar dessa complexidade para reduzir a carga tributária.
Ela explica que, provavelmente, essas transformações feitas tanto pela Garoto quanto pela Lacta são frutos de um trabalho chamado planejamento tributário. “Muitas vezes, uma empresa paga um valor maior de imposto por não conhecer a composição do produto”, disse. “O imposto está nos detalhes. Mudando poucas coisas em um produto, é possível gerar economia para as empresas”.
A advogada explica que esse processo está dentro da lei. Contudo essas mudanças são fiscalizadas pela Receita Federal e a empresa deve explicá-las e, se necessário, apresentar uma defesa.
Sâmara lembrou que esse trabalho ajuda as companhias a potencializarem os lucros. “Uma despesa menor com tributos representa maior margem de lucro e maior competitividade”.
De acordo com a especialista, é necessário uma série de procedimentos sobre as operações ou produtos para mudar o impacto tributário sem infringir a legislação. "Não é um processo simples. Demanda um estudo mais aprofundado já que, em algumas alterações, existe uma linha tênue entre planejamento e uma sonegação fiscal”, frisou.
A Gazeta entrou em contato com a assessoria de imprensa da Nestlé, responsável pela Garoto, que se manifestou por meio de uma nota. A reportagem fez uma série de questionamentos, entre esses estão quando ocorreu a mudança de bombom para wafer e a inclusão da informação "cobertura sabor chocolate" na embalagem. A empresa informou, no entanto, que cumpre as normas.
"A Chocolates Garoto esclarece que as alterações nas receitas de seu portfólio cumprem com todas as normas estabelecidas pela legislação para a indústria alimentícia. Além disso, reforça que preza pela utilização de ingredientes e insumos de alto nível para entregar produtos de qualidade para o consumidor".
No site da empresa, a imagem do Serenata estampa a categoria “Wafer” de produtos. Contudo, na descrição do produto no site a alcunha usada é de bombom. Não está claro, no entanto, quando ocorreu a transição.
Onde constam as informações do produto na embalagem, como o Serenata é chamado também mudou. Na versão mais antiga, ainda com as pontas torcidas, ficava claro que se tratava de um “bombom recheado com creme castanha de caju”. Já na versão repaginada, o produto é descrito como “wafer recheado com creme de castanha de caju, sabor chocolate.”
O Sonho de Valsa também passou por essas alterações: mudança de embalagem, a troca de “bombom” para “wafer” e a cobertura “sabor chocolate”. A Mondelēz, dona de várias marcas de doces e chocolates, incluindo a Lacta, disse o seguinte em nota:
“A Mondelez International esclarece o enquadramento do produto foi feito com base em parâmetros técnicos devidamente embasados na RDC N° 263, de 22 de setembro de 2005.”
Para um produto ser considerado chocolate, precisa ter uma porcentagem mínima de cacau na composição. Atualmente, essa porcentagem é de 25%, como descrito na Resolução de Diretoria Colegiada (RDC) N° 264, de setembro de 2005, da Anvisa. Na nova embalagem do Serenata é descrito que o produto tem uma cobertura “sabor chocolate” e que contém cacau na fórmula. Questionada, a Garoto informou que o produto está dentro das normas técnicas.
Com a colaboração da repórter Natália Bourguignon.
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