O Tribunal de Contas da União (TCU) marcou para a próxima quarta-feira (29) o julgamento do processo de renovação antecipada da concessão da Estrada de Ferro Vitória a Minas (EFVM) à Vale. O governo federal propõe que o contrato com a mineradora para exploração da ferrovia, que só vence em 2027, seja prorrogado antecipadamente por mais 30 anos, ou seja, até 2057.
A proposta do Ministério da Infraestrutura é que, para garantir a gestão tanto da EFVM quanto da Estrada de Ferro Carajás (EFC), que liga o Pará ao Maranhão, a Vale faça três grandes investimentos. Primeiro, na melhoria das malhas atuais. Só a Vitória a Minas, construída em 1904, deve receber R$ 1 bilhão em recursos da empresa para obras e ampliação do transporte de passageiros. O segundo, na construção de uma nova ferrovia entre Mato Grosso e Goiás, a Ferrovia de Integração Centro-Oeste (Fico).
O terceiro é o que mais interessa ao Espírito Santo: a construção do primeiro trecho da Ferrovia Vitória-Rio (EF 118), ligando Cariacica até Ubu, em Anchieta. Trata-se de um projeto aguardado há anos pelo setor produtivo capixaba para conectar portos como o de Ubu (da Samarco), o Central (que será instalado em Presidente Kennedy) e o do Açu (no Norte do Estado do Rio de Janeiro).
Além da construção desse primeiro trecho, o Ministério da Infraestrutura propôs que a Vale faça o projeto executivo de toda a obra, até o Rio. A ideia é que quando o esta primeira etapa ficar pronta, o governo faça um leilão de concessão dele. Assim, a empresa que ganhar vai operar a linha existente e terminar a obra até o Rio.
Em live realizada em junho, o ministro Tarcísio de Freitas disse acreditar que as obras da nova ferrovia no Estado comecem entre o final de 2021 e início de 2022. A construção deve demandar investimentos da ordem de R$ 2,5 bilhões.
O ministro Bruno Dantas, que é o relator do processo no TCU, explicou em uma live no último sábado (25) que o Tribunal não vai avaliar se o modelo de investimento cruzado (em outras regiões) é válido, uma vez que isso já foi autorizado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), e sim ver se há vantagem para a União neste projeto.
"Vamos analisar não a legalidade, a constitucionalidade, porque o Supremo já disse que é constitucional. Vamos analisar a vantajosidade do modelo proposto para a prorrogação dessas ferrovias", afirmou o ministro, que mostrou ver vantagens no modelo: "A Vale vai fazer uma obra privada e entregar a ferrovia já feita para a União. O risco é privado. Após a conclusão, aí sim vai para a União, que vai licitar isso".
Conforme mostrou A Gazeta, técnicos da Secretaria de Fiscalização de Infraestrutura Portuária e Ferroviária do TCU emitiram parecer em que afirmam não ter encontrado vantajosidade para o governo federal do modo que o projeto foi proposto. O relator e os ministros podem acatar o parecer ou não.
No relatório, um dos principais pontos de questionamento da área técnica da Corte de Contas diz respeito à metodologia para definição da tarifa de transportes de cargas usada nos estudos para a prorrogação. Esse dado é importante, pois como a Vale carrega produto próprio (minério de ferro) para portos também próprios, é difícil isolar o preço do transporte.
Para os analistas do TCU, foi usado um método de cálculo diferente daquele já avaliado pelo Conselho Administrativo de Defesa da Concorrência (Cade). O Ministério da Infraestrutura e a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) deverão prestar esclarecimentos sobre esse e outros pontos levantados no relatório, antes que este possa avançar.
Em 2016, a Vale propôs ao Ministério da Infraestrutura e à ANTT a construção do trecho da EF 118 entre Cariacica e Presidente Kennedy, de 160 km, como contrapartida pela renovação antecipada por mais 30 anos do contrato de concessão da ferrovia Vitória a Minas.
Em meados de 2018, o governo federal tira o Espírito Santo do acordo e decide que os investimentos compensatórios da Vale sejam destinados para a construção da Ferrovia de Integração Centro-Oeste (Fico), entre Água Boa, no Mato Grosso, e Campinorte, Goiás. A mudança, que na época pegou políticos e empresários de surpresa, foi justificada pelo governo federal como uma priorização no escoamento de grãos.
No mesmo ano, para garantir os investimentos no Estado, o governo do Espírito Santo ajuizou uma Ação Civil Pública (ACP) contra a União requerendo a suspensão do processo de renovação antecipada da concessão da EFVM.
Após negociações, o governo federal concordou, em agosto de 2018, autorizar que a Vale amplie a Estrada de Ferro Vitória-Minas (EFVM) até Ubu, Anchieta. Na ocasião, ficou acordado com o então governador Paulo Hartung que os recursos viriam dos créditos de ICMS que a Vale tem com o Estado, no valor de aproximadamente R$ 1,8 bilhão.
Porém, após as eleições, em outubro em 2018, o governador Renato Casagrande disse que era contra a utilização dos créditos de ICMS para esse fim e que só liberaria os recursos se houvesse garantia de uma compensação da União.
Quase um ano depois, em junho de 2019, a ANTT conseguiu aprovar o processo de antecipação da concessão da EFVM. No documento, estava descrito que o trecho entre Cariacica e Anchieta seria construído pela Vale como uma das contrapartidas à manutenção do contrato de concessão por mais 30 anos.
Desde março, a proposta formada entre a Vale, o Ministério da Infraestrutura e a ANTT está em análise no TCU. É preciso que a Corte de contas aprove o documento, para que seja firmado um novo contrato. O parecer da área técnica em maio deste ano, contudo, foi pela não aprovação do acordo.
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