A pandemia do coronavírus impactou em cheio o mercado de trabalho. Enquanto muitos profissionais passaram a atuar em home office, outros se arriscaram e precisaram se expor mais para ajudar no enfrentamento da Covid-19 ou mesmo para manter a renda e o sustento da família. E são justamente esses os trabalhadores que mais são infectados pelo vírus no Espírito Santo.
Mais de 187 mil trabalhadores foram infectados pela Covid-19 no Estado, o que representa 44% dos casos confirmados. Desse total, oito a cada 100 profissionais infectados no Espírito Santo contraíram a doença em função ao trabalho, o que equivale a cerca de 15 mil pessoas.
Além dos profissionais da saúde, como enfermeiros, técnicos de enfermagem e médicos, que estão na linha de frente do combate ao coronavírus, as outras duas categorias com mais casos confirmados no Estado são os autônomos e os trabalhadores rurais. Os dados são do sistema estadual de notificação de agravos, da Secretaria da Saúde (Sesa).
Ao todo, 1.543 trabalhadores morreram em decorrência da doença no Estado, sendo 70 deles em função do trabalho. O Boletim Epidemiológico contabilizou os números desde o início da pandemia, em março do ano passado, até o dia 23 de abril de 2021.
O cálculo levou em consideração todos os casos positivos da doença com o campo "ocupação" preenchido na ficha de notificação. Foram excluídos da análise os casos em que as ocupações foram preenchidas como dona de casa, aposentado, estudante ou em branco.
O segmento que mais registrou infecções pelo novo coronavírus foi o da saúde. Ao todo, foram registrados 28.968 casos da doença na área, que engloba colaboradores que atuam na assistência direta aos pacientes além de ocupações como nutricionistas, farmacêuticos, recepcionistas, vigias, cozinheiros, auxiliares de limpeza e funcionários administrativos de unidades de saúde.
A chefe do Núcleo Especial de Saúde do Trabalhador da Sesa, Liliane Graça Santana, ressalta que os trabalhadores da saúde respondiam por cerca de 40% dos registros logo no início da pandemia. Hoje, eles totalizam cerca de 7%. Foram registrados 89 óbitos entre os profissionais da saúde, sendo 32 médicos. Em relação à letalidade, os funcionários do setor morrem cerca de oito vezes menos do que a população em geral.
“O alto índice de infecção nesta área é justificado por conta da exposição que todos são submetidos em um ambiente hospitalar, deste a recepação até o médico. No início, tudo era muito novo e os profissionais foram aprendendo a cada dia sobre a pandemia. Depois disso, fizemos diversas capacitações, inclusive com orientações sobre a maneira correta de colocar e tirar a máscara. Isso foi resultado de todo um amadurecimento em como tratar a doença. Agora com a vacina, a tendência é contribuir ainda mais na redução do número de trabalhadores infectados”, destaca Liliane.
A estimativa é de que 33% dos enfermeiros, 24% dos agentes comunitários e 22% dos técnicos e auxiliares de enfermagem tenham contraído a Covid-19 no Estado. Segundo dados da Sesa, quatro em cada dez trabalhadores do setor foram infectados no ambiente de trabalho.
Outras categorias também chamam a atenção no número de casos. Quando se considera cada uma das ocupações declaradas, sem agrupar em grupos como a área da saúde, a classe dos autônomos lidera os diagnósticos de Covid-19 no Estado, com mais de 21,1 mil casos. Isso significa que 11 em cada 100 trabalhadores infectados são autônomos.
Tratam-se de profissionais que podem estar inseridos em ambientes de trabalho diversos, como motoristas de aplicativo, vendedores ambulantes ou pedreiros, por exemplo, que na maioria dos casos precisaram seguir trabalhando para manter a renda da família mesmo diante do risco do coronavírus.
Em seguida, aparecem os trabalhadores da agricultura, que respondem por quase 6% do total de registros. A maior parte desses profissionais são do sexo masculino (60%), identificados com a raça/cor branca (52%) e estão distribuídos principalmente na faixa etária dos 40 a 49 anos.
“Muitos trabalhadores da agricultura não usam máscara, alguns deles até dizem que o equipamento atrapalha no desempenho da atividade. Além disso, eles têm contato com outras pessoas em feiras e na Ceasa. Estes podem ser fatores que contribuem pelo grande volume de casos. É a mesma situação dos autônomos, em que a gente vê que a falta de máscara e de higienização também contribui para que eles estejam entre os mais infectados”, avalia Liliane.
Além destes profissionais, os professores, administradores e empregados domésticos estão entre as 20 ocupações com mais notificações de casos, que somam 50% do total de trabalhadores infectados no Estado.
Sobre a contaminação de trabalhadores em geral, a chefe do Núcleo Especial de Saúde do Trabalhador da Sesa afirma que na maioria dos casos não há como afirmar se a infecção pelo vírus ocorre mais no trajeto ou no ambiente corporativo.
“Muita gente utiliza o transporte coletivo, não usa a máscara corretamente, não conegue fazer distanciamento social e não higieniza corretamente as mãos. Estes são fatores que geram um ponto de atenção na hora de fiscalizar. É preciso reforçar essas medidas simples e que ajudam na redução de casos da doença”, ressalta.
Os dados compilados pelo Boletim Epidemiológico da Covid-19 vão auxiliar no desenvolvimento de ações conjuntas entre Sesa, o Tribunal Regional do Trabalho (TRT), o Ministério Público do Trabalho (MPT) e a Superintendência Regional do Trabalho, órgão vinculado ao Ministério da Economia.
A juíza do trabalho e gestora regional do programa "Trabalho Seguro" do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Germana de Morelo, destaca que é necessária a conscientização dos empregadores para que sejam cumpridas todas as normas de segurança de forma a evitar a contaminação dos colaboradores. A iniciativa do TST consiste em desenvolver ações que assegurem a saúde dos trabalhadores.
A magistrada entende que a Covid-19 pode ser considerada, sim, uma doença do trabalho e pode ser equiparada a um acidente ocupacional se for comprovado que a infecção ocorreu no ambiente corporativo ou no trajeto utilizado para chegar até lá.
Germana destaca que o funcionário também tem obrigações a cumprir para evitar a propagação da doença. Uma delas é o uso correto da máscara no ambiente corporativo e fora dele. Ela lembra que ao se recusar em usar o equipamento, esse colaborador pode ser advertido e até mesmo ser demitido por justa causa.
“O uso da máscara protege o trabalhador e todas as outras pessoas que estão no mesmo ambiente. Já quem não se sente seguro pode se negar a trabalhar naquele local. Outra discussão envolvendo a proteção está relacionada à vacina. Entendo que o empregador poderá exigir que todos sejam vacinados, pois é uma forma de proteção de saúde”, comenta.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta