Quando acordou no último dia 31 de março, o universitário Caio Rodriguez de Oliveira, de 25 anos, já tinha a percepção de que daquele dia em diante a vida dele estava inserida em uma nova e difícil realidade: a paraplegia.
Uma lesão medular causada por um tiro na coluna, disparado por um policial militar na Rodovia do Sol, em Vila Velha, o deixou sem os movimentos da região do umbigo para baixo, forçando-o, momentaneamente, a deixar de fazer as coisas que mais gostava, como surfar e nadar.
Quase sete meses após o fatídico dia 30 de março, Caio já exibe o sorriso no rosto. Levando uma vida normal para um agora cadeirante, o estudante do curso de Publicidade e Propaganda dá as primeiras remadas na canoagem.
Após evoluir fisicamente nas sessões de fisioterapia e musculação, além de recuperar a confiança em si mesmo, Caio agora vai se reinsirindo socialmente. Ele escolheu a modalidade para voltar a praticar esportes e ter uma vida ativa. Nesse processo de pequenas vitórias diárias, o universitário conta com o apoio fundamental da família, da namorada e também do fisioterapeuta Fernando Marcarini, que o acompanha desde os primeiros dias após ser baleado pelas costas.
"Eu sempre gostei muito do mar. Surfar era algo que eu adorava e estar na água me fazia bem. Quando comecei a me recuperar, queria de alguma forma ter a possibilidade de voltar à agua. Vendo os cenários possíveis, vi na canoagem um esporte adequado às minhas condições físicas e iniciei o processo de transição para a água", disse Caio.
Três vezes na semana, Caio deixa Vila Velha, segue pela Terceira Ponte e tem como destino uma pequena praia logo no acesso à Ilha do Frade, em Vitória. É lá que ele deixa a cadeira de rodas, senta-se na canoa e rema, sempre na companhia do pai, Fabrício, e do instrutor de canoagem, Pedro Henrique Weichert.
Quando Caio afirma fazer muito esforço ao sentar-se no barco não é força de expressão. O fisioterapeuta dele explica como essa fase é importante na reabilitação e evolução física do estudante do curso de Publicidade.
"Um dos objetivos que temos no processo de reabilitação é a reinserção social do paciente. Isso daqui (praticar canoagem) tem uma importância enorme nesse processo, porque não visamos apenas a parte física, mas também a psicológica. Ter esse contato com novas pessoas, com a natureza, faz com que a parte psíquica dele fique mais fortalecida para encarar as adversidades", destacou Fernando.
Remar é algo novo na vida de Caio. Assim como toda novidade, a atividade requer adaptação, que ocorrerá gradativamente. "Após o Caio optar pela canoagem, agora temos que adaptá-lo para o esporte. Nesse processo, teremos de ajustar a canoa para que ele possa ter mais sustentação enquanto rema. Estamos desenvolvendo um banco especialmente para ele poder se desenvolver nessa modalidade", disse o fisioterapeuta.
Para ingressar de vez na canoagem, Caio conta com a ajuda de uma pessoa que até poucas semanas atrás não fazia parte do dia a dia dele, mas que agora é constante quando o assunto é água: trata-se do instrutor Pedro Henrique Almeida Weichert. Satisfeito com a evolução de Caio, o instrutor projeta um futuro promissor para o jovem.
"Ele tem ido muito bem. Estamos em uma caminhada e nos descobrindo a cada contato. Até então nunca tivemos um atleta na condição especial como é o caso do Caio, mas ele está em uma crescente. Ainda há alguns movimentos que exigem mais desenvolvimento, mas com o tempo e os ajustes necessários ele irá evoluir. O Caio não está mudando apenas a vida dele, também muda a minha e de todas as outras pessoas que estão aqui. O Caio nos mostra que qualquer problema que temos é pequeno perto do que ele faz para poder remar conosco e superar o que ele passou. Nos faz refletir sobre o que é de fato ter um problema na vida", apontou o instrutor.
A família é um dos pilares na recuperação. É dentro da água que os laços entre Caio e o pai, Fabrício, se fortalecem. "Venho aprendendo muito mais com ele do que ensinando. Compartilhamos dos mesmos princípios, vivenciamos um dia por vez. É como remar, é uma a uma. Nessa trajetória que a vida nos impôs, estamos no intuito de superá-la sempre de peito aberto. Poder partilhar desses momentos com meu filho é sensacional", descreveu.
Além da canoagem, Caio também se aventura na natação e as primeiras experiências foram animadoras, como contou o fisioterapeuta do universitário. "O Caio é jovem, tem muita potência muscular e um biotipo que o favorece para o esporte. O professor de natação viu um potencial enorme nele. Também é uma alternativa que estamos analisando para ele, acrescentou Fernando.
No dia 30 de março, Caio seguia de carro pela Rodovia do Sol em direção à Ponta da Fruta, onde se encontraria com um amigo, dono de um canil. Nas proximidades do cemitério Parque da Paz, bem perto de onde planejava chegar, o universitário foi atingido por um tiro nas costas. O autor do disparo é o policial Alex Lopes Neves. Em depoimento, o militar alegou ter discutido com Caio após ter levado uma fechada e disparou em seguida.
Caio, por sua vez, nega ter discutido com o policial e afirmou ter se assustado com a presença do militar com uma arma em mãos e parado ao lado dele em um semáforo da Rodovia. Assustado, Caio acelerou o veículo e na sequência acabou atingido pelo disparo.
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