A variação mais agressiva da bactéria Escherichia coli, que é enterohemorrágica, era conhecida como "bactéria do hambúrguer" após um surto nos EUA. Esse tipo específico foi encontrado em amostras de dois alunos da creche particular na Praia da Costa, onde há um surto de gastroenterite.
A descoberta, feita no último sábado por uma equipe de pesquisadores da Ufes, ajuda no tratamento específico dos pacientes.
>Surto em creche no ES é agressivo, raro e inédito no Brasil
Na manhã desta sexta-feira (05), em entrevista à TV Gazeta, a microbiologista Liliana Spano, que estava à frente da pesquisa, falou sobre o tema e os riscos de antibióticos agravarem o quadro dos pacientes. O local em que ela trabalha auxilia o Laboratório Central de Saúde Pública do Estado (Lacen) na análise das amostras das pessoas infectadas e da água colhida na creche.
O que vocês descobriram durante esse trabalho no sábado?
Quando entraram (Secretaria de Estado da Saúde) em contato conosco, nós estávamos preocupados porque o surto já estava acontecendo há umas duas semanas e efetivamente, qual era o agente etiológico, não se tinha, embora se tivesse isolado a Escherichia coli.
Mas, como a Escherichia coli está na microbiota normal, o nosso trabalho em si foi ver se aquela E.coli era a normal no intestino ou se ela tinha alguma característica que responderia por ela causar o surto. Na realidade, ela corresponde a um tipo que causa doença no intestino que as normais não causam.
É uma bactéria agressiva?
É uma das mais graves daquelas que podem causar doença intestinal. É uma das mais graves que nós temos.
O que vocês já sabem sobre esse tipo de bactéria?
Nós temos várias características dela. Ela está associada a algumas consequências que são mais sérias, principalmente em crianças de até 10 anos de idade, que é chamada síndrome hemolítica urêmica, que pode ser fatal ou deixar sequelas renais.
Pela consequência que ela traz, causa uma colite (inflamação no intestino) hemorrágica. Ela começa com uma diarreia, depois uma diarreia com sangue por causa da colite hemorrágica que se desenvolve. Isto vai se dever à produção de uma toxina que foi detectada, que caracterizou essa bactéria.
Uma das características dela é a produção dessa toxina, que cai na circulação sanguínea e ela pode atingir diversos órgãos, o que vai ser responsável pelos casos mais graves dessa doença.
Essa bactéria já é conhecida de outros casos, inclusive era chamada de 'bactéria do hambúrguer'?
Exatamente. Ela foi chamada de bactéria do hambúrguer, porque o primeiro surto que evidenciou essa bactéria foi exatamente um surto que estava associado ao consumo de hambúrguer nos EUA. Foram dois surtos quase concomitantemente nos EUA e no Canadá, quando aconteceu a detecção dessa bactéria que era até então uma bactéria não conhecida.
E estudos que eles fizeram retrospectivos encontraram muito pouco, significando que, a partir daí, essa bactéria começou a emergir e passou a ser encontrada em quantidade mais importante em diversos países do mundo, como EUA, Argentina e Noruega.
No Brasil, ela acontece em uma frequência muito baixa.
Como deve ser o tratamento para esses casos? Como age o antibiótico no nosso organismo?
Quando você tem um quadro que tem um comprometimento intestinal mais sério, vai demandar o uso de antibiótico. Especificamente para essa bactéria, o que se sabe, é o seguinte: não é recomendado, mas a critério clínico ele (o médico) vai tomar a decisão se vai entrar com o antibiótico ou não.
Por que não é recomendado?
Porque tem alguns antibióticos que, para essa bactéria, o que eles podem fazer é estimular a produção de toxina. Então a bactéria produz toxina, ela passar a produzir mais toxinas.
Tem antibióticos que eles têm uma ação de destruir a célula da bactéria. Quando rompe a bactéria e mata, são chamados os antibióticos bactericidas, eles acabam liberando mais toxina. Eles estimulam mais a liberação da toxina e em quantidade maior na corrente sanguínea.
Essa descoberta ajuda a nortear o trabalho dos médicos?
Para o controle desse surto, quando você conhece o agente etiológico em relação à conduta clínica, o clínico já sabe quais são as condutas que ele vai tomar. E era o que eles estavam fazendo: a diálise nas crianças.
De onde pode ter vindo essa bactéria?
Quem é o reservatório é o gado e, predominantemente, é o gado bovino. Um indivíduo que entra em contato com o gado bovino pode adquirir a infecção. A carne mal cozida do animal ou crua. A carne mal cozida, como é o caso, por exemplo, dos hambúrgueres. A carne moída, principalmente, quando não é cozida de maneira adequada, de 70 graus para poder matar a bactéria, ela vai servir como fonte de infecção.
Leite não pasteurizado, águas que são contaminadas, além de legumes e verduras que sejam contaminados com água de irrigação. Ou esterco de boi mesmo usado como adubação. Tudo isso pode levar a uma contaminação que homem vai passar a ingerir.
Risco de transmissão.
Nós temos que considerar esse período em que elas foram infectadas e já estão afastadas e se estão ou não apresentando os sintomas. O que é sabido de tempo de excreção dessa bactéria é que a maioria dos indivíduos para de excretar essa bactéria depois de 7 a 9 dias do início dos sintomas.
Mas existem casos que levam semanas e até meses. O que a gente precisa considerar são medidas básicas de higiene, como lavar as mãos. Não só para essa bactéria, mas para uma série de agentes que causam infecção.
OUTROS CASOS PELO MUNDO
Estados Unidos
Bactéria do hambúrguer
Esse tipo de bactéria E.coli foi registrada pela primeira vez nos Estados Unidos, em 1982. Os surtos foram relacionados à ingestão de hambúrguer de carne bovina mal cozido. Pessoas no Canadá também foram afetadas.
Comum
Em 20 anos, foram 350 surtos dessa bactéria na região. Cerca de 0,5% das pessoas infectadas morreram.
Japão
Escola
Em 1996, foram registrados surtos em escolas do Japão. O maior deles ocorreu na cidade de Sakai, com mais de 5.500 pessoas atingidas pelo consumo de broto de rabanete, com três mortes registradas.
EUROPA
Alemanha
Uma bactéria similar à que causou o surto na creche em Vila Velha (mas que também produz a Shiga) provocou até junho de 2011, 17 mortes: 16 na Alemanha e uma na Suécia. Inicialmente se desconfiou que a origem estivesse em pepinos da Espanha, mas depois descobriu-se que a bactéria vinha de brotos de feno grego, utilizados como guarnição em comidas
Fonte: Jornal A GAZETA
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