São quase dez meses de dor, sofrimento e saudade com a imagem da lama. A família do capixaba e mecânico de empilhadeira, Uberlândio Antônio da Silva, de 54 anos, ainda não tem resposta sobre onde pode estar o corpo dele. Não foi possível dar o último adeus ao capixaba, já que ele continua entre os 20 desaparecidos da tragédia, que aconteceu na Mina Corrégo do feijão, em Brumadinho, Minas Gerais, em janeiro deste ano. A Vale S.A atualizou a lista de desaparecidos no início da tarde desta sexta-feira (11), no site da empresa.
O desabamento da barragem em Brumadinho tirou a vida de cerca de 276 pessoas, no dia 25 de janeiro de 2019. Na ocasião, a família do mecânico chegou a ir até a cidade em busca de respostas, mas voltou sem qualquer informação do paradeiro da vítima.
Uberlândio era funcionário da Vale. Na época do acidente, a família informou à equipe de reportagem que o capixaba costumava viajar a trabalho pela empresa, mas aquela era a primeira vez dele na barragem da Mina Córrego do Feijão.
O último contato do capixaba foi com a esposa, na noite anterior à tragédia. A reportagem tenta contato com os familiares há vários dias, mas ainda não teve retorno.
Há seis meses, a reportagem conversou com a esposa de Uberlândio, Rosemar Pinheiro, de 38 anos. Ela falou da dor, saudade e também das dificuldades financeiras que vive com os filhos, depois de perder o marido. Era ele que garantia o sustento da casa, administrava as finanças e assumia o papel de pai para os quatro filhos dela. A lama de rejeitos de minério levou tudo embora.
Na época da entrevista, as contas se acumulavam e a família enfrentava problemas financeiros e psicológicos. Para não passar fome, Rosemar e os filhos chegaram a receber até doação de cesta básica. A família recebeu da empresa em que Uberlândio trabalhava, uma prestadora de serviço da Vale, uma espécie de ajuda de custo mensal. O valor era inferior ao salário que o capixaba recebia, mas era a única renda que Rosemar possuía, na ocasião.
"As dívidas estão tudo acumuladas para eu pagar, dívidas muito altas. É R$ 7 mil em um banco e R$ 4 mil em outro. É complicado. Ele que pagava as contas, e isso tudo veio como um golpe na minha cabeça. Os meninos (filhos) choram dia e noite, e eu ainda não posso pagar um psicólogo para eles. Além de ter matado o meu marido, a Vale ainda me deixou nessa situação", lamentou a esposa.
Em abril, com o rompimento da barragem prestes a completar três meses, Rosemar afirmou não ter recebido os R$ 100 mil que a Vale prometeu pagar para os familiares das vítimas de Brumadinho. Segundo ela, a quantia foi entregue para outra mulher, com a qual Uberlândio teve uma filha fora do casamento. A Vale teria utilizado como critério o fato de o capixaba ter uma filha biológica, ainda que não convivesse com ela, e desconsiderado que o trabalhador vivia com Rosemar e os filhos dela há mais de uma década.
"Quando ele veio morar comigo, meu menor tinha 1 ano. Sou casada legalmente com ele, morou mais de 10 anos comigo. Meus filhos dependiam do meu marido. Era para ser R$ 50 mil para mim e R$ 50 mil para ela, já que ele tinha essa filha fora do casamento. Enquanto ela gasta o dinheiro do meu marido, eu estou aqui com as dívidas dele para pagar. As dívidas chegam aqui na minha casa, e só posso me livrar delas depois que a certidão de óbito sair. Só Deus sabe quando isso vai acontecer. Por causa dessa maldita Vale eu estou passando dificuldades", afirmou Rosemar, em abril.
Na época, a Vale informou por meio de nota que a doação no valor de R$ 100 mil foi destinada à filha menor de idade de Uberlândio Antônio da Silva, por meio de sua responsável legal, seguindo os critérios de concessão estabelecidos. "O salário mensal dele está sendo pago à atual companheira, que também está recebendo atendimento psicossocial."
A Barragem do Feijão, da Vale, em Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, se rompeu em 25 de janeiro. O mar de lama destruiu casas da região do Córrego do Feijão e a área administrativa da companhia, inclusive o refeitório da empresa. O capixaba é uma das vítimas que estavam no refeitório no momento da tragédia.
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