Comentários de cunho sexual, elogios excessivos, toques e convites obscenos. Não é difícil encontrar algum aluno que já tenha vivido alguma dessas situações dentro da escola. Na última semana, um grupo de alunas da Escola Estadual Clóvis Borges Miguel, na Serra, usou as redes sociais para denunciar um professor que estaria assediando sexualmente estudantes dentro da unidade.
As denúncias deram início a um movimento de relatos em série e o afastamento de três professores da escola até o momento. Os casos mostraram que esta prática no ambiente escolar é mais comum do que parece, mas nem sempre, pela lei, são enquadradas como assédio sexual.
Mas o que seria assédio sexual?
O crime de assédio sexual, descrito pelo artigo 216-A do Código Penal, é caracterizado pelo constrangimento causado a uma vítima por um assediador com intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, se utilizando de uma posição hierárquica superior.
Esse crime independe de contato físico e pode ser cometido por meio de mensagens, comentários ou mesmos gestos. Contudo, violências verbais como cantadas grosseiras e vulgares ou elogios ao corpo de alguém, acabam, hoje em dia, não tendo previsão penal, como explica a especialista em Direito Penal e professora da FGV em São Paulo, Maíra Zapater.
"Nós até chamamos cotidianamente de assédio, mas elas não entram no Código Penal com essa nomenclatura. Até 2018 essas condutas acabavam sendo enquadradas em uma contravenção penal que era definida como perturbação ofensiva ao pudor. Essa contravenção porém foi revogada e passou a existir o crime de importunação sexual, que ultrapassa o constrangimento e se manifesta por meio de um ato, o que também não é o caso, já que não existe nenhum tipo de contato corporal nessas cantadas", comentou.
O advogado e professor de Direito Penal Israel Jório explica que o assédio sexual é uma figura típica muito específica e que cantadas até podem ser consideradas como assédio pelo Código Penal, mas é preciso que esteja bem explícito que o objetivo final seja o ato sexual.
Segundo a psicóloga Mônica Raouf, casos de assédio nas escolas são muito questionados, principalmente quando existe um encantamento ou até mesmo uma paixão do aluno pelo professor. Contudo, isso não diminui o crime e muito menos transfere para a vítima a culpa do assédio que ela sofre.
"A gente escuta muitos comentários como: 'mas aquela aluna dava em cima do professor'. Existem sim casos de alunos que dão bola pro professor, que se apaixonam, adolescentes são assim. Mas a gente precisa entender que o professor é o adulto nesta situação, ele é autoridade e ele não pode se valer dessa posição para se envolver com um aluno", explicou.
A professora de Direito Penal Maíra Zapater complementa que é importante levar em conta, além da idade das pessoas que estão sendo assediadas, a inexistência de uma igualdade de poder no ambiente escolar.
DISCUSSÃO DO TEMA NAS ESCOLAS AJUDA VÍTIMAS
A dificuldade das vítimas em identificar o assédio ou qualquer outro tipo de violação de direitos é também reforçada por comentários como "É apenas uma brincadeira" ou "Mas ele estava só te elogiando". Junto a isso, existe o medo de denunciar quando o assediador é um profissional reconhecido, que atua na escola há um bom tempo e apresenta bons resultados.
Arielle considera de extrema importância discutir o tema nas escolas para que os próprios alunos consigam identificar os assédios e sintam-se livres para expressar constrangimentos e denunciá-los. "É preciso que crianças e adolescentes sejam educados a esse respeito, que conheçam seus direitos, as instituições responsáveis por acolhê-los e que tenham um canal aberto de comunicação tanto em casa quanto na escola", finalizou.
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