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Médico capixaba deixa clínica no RJ para atender índios em Alagoas

Médico capixaba deixa clínica no RJ para atender índios em Alagoas

Na comunidade carioca em que atuou, ter que parar a consulta por conta de tiroteios fazia parte da rotina de Leonardo Noia Mattos, que diz estar na Medicina pelo social

Publicado em 24 de maio de 2019 às 18:13

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A carreira do capixaba Leonardo Noia Mattos parecia consolidada e com rumos certos: ele tinha um diploma de geólogo e trabalhava em uma plataforma de petróleo. Até que, aos 27 anos, entrou na faculdade de Medicina. O objetivo dele era atuar em áreas carentes, para onde é difícil encontrar médicos dispostos a ir.

Com essa missão, ele trabalhou por mais de um ano na Clínica da Família de Honório Gurgel, bairro da Zona Norte do Rio de Janeiro, onde fazia parte da rotina ter que interromper o atendimento por conta dos tiroteios. Ele lembra que a unidade de saúde fica ao lado de uma base de traficantes e, por isso, era comum ver pessoas ao redor do local com fuzis.

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Recentemente, com a saída dos médicos cubanos do país, após o governo do país caribenho romper com o Mais Médicos no fim do ano passado, Leonardo se inscreveu no programa que foi criado com o objetivo de justamente levar profissionais para regiões onde há escassez destes. Foi então que, aos 35 anos, ele trocou a clínica carioca pela aldeia Karapotó Plaki-ô, no interior de Alagoas, Estado no Nordeste do país.

Apesar de não querer deixar o local tão cedo, Leonardo garante que um dia tem vontade de voltar ao Espírito Santo para atender comunidades capixabas. Confira entrevista.

Você sempre quis ser médico?

Na verdade, não. Eu me formei primeiro em Geologia e atuei como geólogo, trabalhando com petróleo embarcado em plataformas. Até que resolvi que queria trabalhar com algo mais social, que pudesse ajudar as pessoas que mais precisavam. Então, aos 27 anos, entrei para a faculdade de Medicina. Hoje estou com 35 anos.

Há outras formas de ajudar quem precisa. Por que você optou pela Medicina?

A Medicina hoje é muito mercadológica, muita gente entra na área pelo dinheiro ou status. Nos grandes centros, principalmente, a gente vê muito isso. Dessa forma o interior fica sem médico, gera uma defasagem. Eu quis fazer Medicina porque queria trabalhar no Sistema Único de Saúde (SUS), sempre quis atender quem precisa e está desassistido. Minha vontade era trabalhar em clínica da família, no atendimento básico, como fiz no Rio de Janeiro.

A clínica onde você trabalhava no Rio de Janeiro ficava em uma área violenta. Como era sua rotina de trabalho?

Eu fui para essa clínica porque ela estava precisando, tinha vaga sobrando porque ninguém queria ir pra lá. É uma clínica que fica em Honório Gurgel, na Zona Norte do Rio. Fiquei cerca de um ano e meio lá e a rotina era de violência. É a realidade de violência do Rio de Janeiro, mas essa clínica fica uma uma área dominada pelo tráfico de drogas, então tinha tiroteios quase todos os dias. Várias vezes tive que parar o atendimento e me abaixar com os pacientes por causa de tiroteios. Outra realidade era que o ponto de tráfico funcionava ao lado da clínica, então eles usavam a unidade como um escudo, porque a polícia não atirava. Os traficantes não mexiam com a gente, mas tínhamos que atender se algum deles fosse baleado.

E você não tinha medo ou pensou em desistir?

Medo sim, mas desistir não. Não podia desistir por tão pouco. Alguém tinha que estar lá e fazer aquele trabalho. E tenho vontade de ajudar esse povo com o que posso. Quero retribuir tudo que a Medicina me dá.

Por que você quis sair do Rio e ir trabalhar atendendo a comunidade indígena?

Quando os médicos cubanos saíram do país muitas comunidades ficaram desassistidas. Além disso, tenho uma filha pequena e estava cansado da rotina de violência do Rio. A gente acaba acostumando, mas isso não é normal. Então, quando abriram vagas no programa Mais Médicos vi a oportunidade de sair e trabalhar com a comunidade indígena. Sempre tive curiosidade de atender esses povos.

Você saiu e foi para onde? Como é a realidade aí?

Para o município de São Sebastião, em Alagoas. Fica no interior do Estado, a 155 quilômetros da capital Maceió. É muito longe do Espírito Santo (risos). Aqui eu atendo a população da cidade e os índios da aldeia Karapotó Plaki-ô. Aqui tem muita miséria, atendo muitas pessoas com desnutrição. Por causa da seca muito severa, a população da cidade fica sem ter onde plantar. Mas os índios têm a saúde melhor porque eles conseguem cultivar os alimentos na aldeia mesmo assim, então, eles não têm o problema de desnutrição. Eu fui muito bem recebido por todos. A comunidade indígena é muito aberta ao novo, querem conhecer o diferente. Por dia, atendo cerca de 30 índios.

Deu certo alívio sair do cenário de violência do Rio?

Aqui também tem violência, Alagoas é um dos Estados mais violentos do país. No Rio, quem mata é o tráfico na disputa por território. Aqui, quem manda matar são os pistoleiros… É quase uma violência colonial.

Você vai ficar aí por mais quanto tempo?

Não sei. Estou feliz aqui, gosto do trabalho. Estou começando um projeto, quero fazer uma imersão na cultura indígena. Estou gostando de conhecer tudo por aqui. Não tenho vontade de ir embora por agora.

Você pensa em um dia trabalhar com comunidade carentes no Espírito Santo?

Eu já viajei muito e não tem nada como a casa da gente. O Espírito Santo é de onde eu vim, onde está minha família e a maioria dos meus amigos. Então, sim, tenho vontade de trabalhar aí sim.

O que a sua família acha desse seu estilo de vida?

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Eles entendem e têm muito orgulho. Eles sabem que eu optei pela Medicina por ser uma missão para mim. Eu não entrei na Medicina pelo dinheiro. Eu sei que ele é importante, mas eu entrei na Medicina pelo social e minha família tem orgulho disso.

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