Um remédio comumente usado para tratar hepatite C se mostrou eficaz para impedir os efeitos do vírus da zika, em um estudo realizado por pesquisadores da Universidade da Califórnia em San Diego, nos EUA, em parceria com a Universidade de São Paulo (USP). O trabalho, divulgado nesta quinta-feira na revista "Scientific Reports", revela que o medicamento conseguiu não apenas restaurar as células neurais infectadas pela zika, como também bloquear a transmissão do vírus para o feto no caso de gestantes.
Testado tanto em camundongos como em culturas de células humanas, o experimento indica que há um potencial tratamento para a doença, o que ainda precisa ser confirmado por pesquisas futuras. É o que afirma o autor principal do estudo, Alysson Muotri, professor de Pediatria e Medicina Molecular na universidade americana.
"Muitos trabalhos realizados no último ano abordaram a ameaça da zika à saúde, mas grande parte deles se concentrou no desenvolvimento de uma vacina, com promissores resultados iniciais. No entanto, há também uma grande necessidade de desenvolver estratégias clínicas para o tratamento dos indivíduos infectados, incluindo mulheres grávidas, para os quais a prevenção da infecção não é mais uma opção", destaca ele, que é membro do Consórcio Sanford para Medicina Regenerativa. "As grávidas representam a maior crise de saúde porque uma infecção por zika durante o primeiro trimestre confere maior risco de microcefalia congênita", declarou.
Os surtos do vírus da zika no Brasil, em 2015 e 2016, foram marcados por um aumento da incidência de recém-nascidos com malformações congênitas, principalmente a microcefalia, condição que faz os bebês terem um tamanho de cabeça reduzido, o que traz problemas neurológicos.
Os pesquisadores observaram que tanto a hepatite C quanto a zika pertencem à mesma família viral e apresentaram fortes semelhanças estruturais. Isso os fez traçar a hipótese de que o medicamento chamado sofosbuvir, aprovado e comercializado sob o nome-fantasia Sovaldi para tratar e curar hepatite C, também pudesse funcionar contra a zika. E, ao que tudo indica, eles estavam certos: em testes com células progenitoras neurais humanas que estavam morrendo por conta da infecção por zika, a exposição ao sofosbuvir foi capaz de restaurá-las. Além disso, o remédio restaurou a expressão gênica ligada à resposta antiviral dessas células.
Em testes subsequentes usando um modelo de camundongo imunodeficiente infectado por zika, as injeções intravenosas de sofosbuvir reduziram significativamente as cargas virais no sangue, em comparação com um grupo placebo - que não recebeu o medicamento. A informação mais empolgante, porém, foi que fetos de camundongos gestantes infectados por zika não mostraram vestígio detectável do vírus.
"Isso sugere duas coisas. Um, que a droga foi bem tolerada pelos camundongos gestantes infectados por zika. Dois, e mais importante, que o medicamento conseguiu bloquear a replicação do vírus da zika e interromper a transmissão da mãe para o feto", afirma Muotri. Os pesquisadores enfatizam que suas descobertas são preliminares, com muito mais trabalho a ser feito.
"O estudo ilustra o potencial de "tradução" imediata de uma droga que já está em extenso uso clínico para uma infecção viral similar", diz Muotri. "Até que haja aprovação de uma vacina da zika, pensamos que esta é uma abordagem que precisa ser perseguida", concluiu.
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