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'Se eu tivesse só um cargo, morreria de fome', diz professor capixaba

"Se eu tivesse só um cargo, morreria de fome", diz professor capixaba

Após 25 anos de trabalho, Anézio Roque ganha um salário de aproximadamente R$ 2.200 em Águia Branca

Publicado em 12 de outubro de 2019 às 21:56

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Anézio Roque é professor há mais de 25 anos em Águia Branca e ganha cerca de R$ 2.200 por mês. (Carlos Alberto Silva)

São 7 horas da manhã e a turma do 5º ano da Escola Municipal Padre Sérgio Banzza, em Águia Branca, aguarda em silêncio a revisão para a prova de Matemática. “Essa turma é boa”, brinca Anézio Roque de Souza, 60 anos, enquanto se ajeita com o apoio das muletas para começar a primeira aula do dia.

Instrumento de trabalho, as muletas revelam uma dor já cicatrizada faz tempo: uma das pernas precisou ser amputada após um câncer, antes mesmo de se tornar professor, quando tinha 20 anos. Anézio não gosta de falar muito sobre isso. Para ele, a limitação física nunca foi problema no trabalho. “O que pesa mesmo é baixa remuneração né? Professor não é valorizado”, diz.

Anézio é formado em pedagogia e tem duas pós-graduações. Mesmo depois de 25 anos de carreira, ele recebe aproximadamente R$ 2.200 como professor em Águia Branca.

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O problema é que depois que a gente entra na sala de aula, não consegue sair. Se eu fosse olhar salário, nem estaria aqui

Anézio Roque
Professor em Águia Branca
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O cansaço é perceptível, mas muitas vezes ignorado na correria do dia a dia. Faz tempo que ele não sabe o que é ter intervalo para almoço. Os 20 minutos que tem, o professor usa, de forma rigorosa, para dirigir 20 km até Pancas, onde atua como coordenador à tarde. Uma jornada dupla que permite renda um pouco maior, de cerca de R$ 4 mil no fim do mês. “Se eu tivesse só um cargo eu estava passando fome. Só não tenho três cargos porque não dou conta.”

O professor Felipe Polez trabalha 25 horas semanais para receber cerca de R$ 1200 em Águia Branca. (Carlos Alberto Silva)

JORNADA DUPLA

O acúmulo de cargos é comum em Águia Branca, município onde todos os pisos, do nível médio ao doutorado estão abaixo dos R$ 1.598,59 estipulados por lei, segundo levantamento inédito feito por A Gazeta em todo o Estado. Lá, o menor salário é de R$ 1.296,84, pago a cinco professores com nível médio, entre eles o coordenador escolar Felipe Polez, de 26 anos.

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Hoje pago meu aluguel e consigo fazer poucos cursos. Com meu salário não dá ir muito além disso

Lucas Polez, 26 anos
Professor em Águia Branca
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Apesar de não ter nenhum professor com doutorado, o salário inicial para um docente com esta formação é de R$ 1.539,19, menor do que o mínimo determinado por lei para um profissional de nível médio.

PREFEITURA NÃO RESPONDEU À REPORTAGEM

As informações sobre o piso salarial dos professores em Águia Branca foram obtidas por meio da Lei de Acesso à Informação. Elas fazem parte de um levantamento de A Gazeta que revelou que 35 municípios capixabas pagam aos profissionais de magistério menos do que R$ 1.598,59, valor mínimo determinado pela lei. A reportagem entrou em contato por e-mail e por telefone com a Prefeitura e a Secretaria de Educação, mas não teve sucesso. Foram feitas mais de 10 ligações para a Secretaria de Educação e em nenhuma delas a reportagem conseguiu falar com a secretária ou algum responsável pela pasta. Os e-mails também não foram respondidos.

No dia 3 de outubro, A Gazeta foi até o município de Águia Branca. A reportagem foi pessoalmente até a Prefeitura, mas nem o prefeito ou a secretária de Educação estavam no local. Também foi informado, por diversas vezes, a diferentes funcionários da Prefeitura sobre a necessidade de ouvir o município a respeito da defasagem dos salários. Contudo, até a publicação desta matéria, a Prefeitura ou a Secretaria de Educação não procurou A Gazeta para se posicionar e explicar porque o município não paga o piso aos professores.

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