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Quatro anos após lama, lojas que vendem só água crescem 138% em Colatina

Quatro anos após lama, lojas que vendem só água crescem 138% em Colatina

Em 2015, cidade tinha apenas 18 comércios que vendiam exclusivamente o produto. Atualmente, esse número já subiu para 43. Tem família que gasta mais de R$ 300 por mês com galões de água. Outros se arriscam buscando água em nascentes

Publicado em 5 de novembro de 2019 às 14:42

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Rio Doce, na altura da Ponte Florentino Avidos, em Colatina, no Noroeste do ES. (Reprodução | TV Gazeta Noroeste)

A falta de esperança e a sobra de desconfiança retratam bem o que a população de Colatina, no Noroeste do Estado, sente quando o assunto é a qualidade da água do Rio Doce. Quatro anos depois de o leito do rio ser invadido pela lama de rejeitos de minério da Samarco, após rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), em 5 de novembro de 2015 , muitas famílias ainda julgam necessário comprar água mineral para beber e cozinhar.

Uma dessas famílias é a da dona de casa Aureni Maria Bragança. Ela explicou que a mudança no consumo aconteceu justamente em novembro de 2015. “Depois do rompimento da barragem, ficamos com medo. Por mais que a água seja tratada, eu ainda compro três galões por semana e cada um custa, em média, R$ 6”. Além dela, os outros sete parentes que moram junto adotam a mesma postura.

A dona de casa Aureni Maria Bragança gasta cerca de R$ 72 por mês com água mineral. (Elies Bragança)

Na casa do aposentado Gerônimo Guilherme Bacelos, a preocupação era tanta que a netinha Lara tomava banho de água mineral até cerca de um ano atrás. “Fazíamos isso devido aos componentes que tinham e têm até hoje no Rio Doce. Tínhamos medo do que eles poderiam causar”, explicou o aposentado, que gasta cerca de R$ 320 por mês com a compra de água.

A família do aposentado Gerônimo Guilherme Bacelos só bebe água mineral desde o rompimento da barragem em 2015. (Acervo Pessoal)

A atitude de todos eles é similar à dos clientes do empresário Jhonatam Bolzan, que abriu uma distribuidora de água em abril de 2016 depois de ver a crescente demanda. “Até aquele momento eu nem sabia que existia esse tipo de comércio. Hoje, todos que compram comigo é porque têm medo da água do Rio Doce. Eu mesmo só uso a mineral”, confessou.

NEGÓCIO MAIS QUE DOBROU

De acordo com dados da Vigilância Sanitária de Colatina, a venda de água cresceu nos últimos quatro anos. Em 2015, a cidade contava apenas com 18 estabelecimentos que vendiam exclusivamente o produto. Atualmente, esse número já subiu para 43 – um aumento de cerca de 138%. Se contabilizados mercados e mercearias, por exemplo, passam de 100 comércios.

Para ter a procedência garantida da água, Vigilância Sanitária orienta a sempre pedir a nota fiscal do galão. (Reprodução | TV Gazeta Noroeste)

Dono de uma distribuidora de água há cerca de quatro anos, Lázaro Pereira acompanhou o desenvolvimento deste cenário. “Logo após o rompimento da barragem, eu tive um aumento de 60% nas vendas. Depois, ficou estagnado por causa do aumento da concorrência”, contou. O comerciante disse que atualmente vende mais de mil galões de água por mês.

NASCENTES CONTAMINADAS

Quem não confia na qualidade da água do Rio Doce, mas tenta fugir do gasto extra com água mineral, acaba recorrendo às nascentes. O representante Pedro Antônio Tomazini vai até a nascente que existe no bairro Perpétuo Socorro toda semana. “Eu encho uns quatro galões de água lá. Tudo por precaução e medo dos metais pesados na água do Rio Doce. E tem mais gente que faz isso”, disse.

Porém, de acordo com informações da Prefeitura de Colatina, todas as nove nascentes nas quais a população tem o costume de ir estão contaminadas com coliformes fecais, o que torna a água delas imprópria para consumo. A presença das bactérias foram detectadas por uma análise feita no início deste ano.

PEQUENOS AVANÇOS...

Apesar de a situação ainda preocupar os colatinenses, também é possível ver o medo de alguns diminuindo com o passar dos anos. Gerente de um restaurante, Paulo Cesar Venâncio chegou a gastar cerca de R$ 2 mil por mês comprando água mineral para preparar toda a comida comercializada. Hoje, a compra não é mais feita.

Depois de anos, filtros nas torneiras substituíram compra de água mineral em restaurante de Colatina. (Ygor Lima)

“Na época, colocamos até uma placa em frente ao restaurante sinalizando que estávamos fazendo isso. Mas, no ano passado, passamos a acreditar mais na água do Rio Doce depois que nos falaram que ela não oferecia mais riscos à saúde. Colocamos filtro na torneira e estamos utilizando a água normalmente. Por enquanto, não tivemos nenhum problema”, revelou.

...MAS MUITO A SER FEITO

Criada para conduzir as ações de reparação socioambiental diante dos danos causados pela lama da Samarco, a Fundação Renova divulga há anos que, após tratamento, a água do Rio Doce é própria para consumo e apresenta níveis similares àqueles encontrados antes do rompimento da barragem. Este anúncio, no entanto, desagrada órgãos da Justiça.

“Similaridade não significa que esteja como era antes. Achamos que não se deve buscar o retorno ao que era no passado, e, sim, construir um projeto de futuro, até porque a restauração total da fauna e da flora é impossível. Os rejeitos de minério ainda estão no rio e pesquisas mostram que eles não são inertes”, defendeu o promotor do Ministério Público Federal (MPF) Malê de Aragão Frazão.

Promotor do MPF, Malê de Aragão Frazão apontou diversas falhas nos programas de reparação. (Reprodução | TV Gazeta Noroeste)

Entre os 42 programas estabelecidos para minimizar os danos causados pelo crime ambiental, há o apoio à construção de redes de esgoto e à recuperação de nascentes. Ambas ações estariam aquém do que deveriam, de acordo com o MPF. “A maioria das medidas de compensação tem uma baixa efetivação e ainda não seguem adequações sinalizadas”, apontou Frazão.

Além disso, a indenização àqueles que sofreram com o desabastecimento de água que atingiu toda a população de Colatina logo após o rompimento também não foi feita de modo satisfatório. “Muitos pedidos foram negados pela burocracia documental e outros receberam valores consideravelmente baixos”, afirmou o promotor.

O OUTRO LADO

Em relação à qualidade da água, a Fundação Renova ratificou que os resultados já estão nos mesmos patamares de antes do rompimento e ressaltou que o Rio Doce é o mais analisado do Brasil, com 92 pontos de monitoramento. Já outro programa teria recuperado 579 nascentes no Espírito Santo.

Uma das estações de monitoramento da Fundação Renova fica no Ifes de Itapina. (Larissa Avilez)

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Já no que tange ao desabastecimento, a Fundação Renova garantiu que mais de 264 mil pessoas, entre elas cerca de 88 mil vulneráveis, já foram indenizadas por danos decorrentes da suspensão temporária, por mais de 24h ininterruptas, no abastecimento de água. "Vale ressaltar que o número refere-se aos atingidos em geral e, não, especificamente, aos de Colatina".

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