Criado com os pés no chão, um tambor no peito e um sorriso leve no rosto, Luiz Inácio Silva Rocha, ou Lula Rocha, como era conhecido, teve a vida marcada pela participação e estímulo aos movimentos sociais.
Internado desde o dia 20 de janeiro, porém, Lula Rocha faleceu nesta quinta-feira (11) após duas paradas cardíacas devido às complicações renais. Ele já havia sido hospitalizado em outubro do ano passado no Hospital Dório Silva, quando passou 40 dias internado.
O corpo dele será velado a partir das 9 horas desta sexta-feira (12) e o sepultamento será às 11 horas, no Cemitério Parque da Paz, em Cariacica.
Lula Rocha era funcionário do Programa Estadual de Proteção às Vítimas de Violência. Ele também coordenava o Círculo Palmarino no Espírito Santo, com representação nacional do Movimento Negro. Também estava à frente da Rede AfirmAção, que buscava ensino de qualidade para crianças e adolescentes da periferia.
"Ele era incansável. Ele fez da militância um sacerdócio. Vivia-a com muita fidelidade, dedicação, responsabilidade e esmero. Na sua causa, dos movimentos e da juventude negra, dos direitos humanos, movimento LGBTQI+, das mães pretas e pobres, ultrapassou os limites do Estado. Lula era uma referência nacional. Seu legado é imenso, indescritível e eterno. Hoje a humanidade ficou menor", disse, emocionado, padre Kelder.
A negritude de Lula era um orgulho que o impulsionava a defender ainda mais os direitos da população negra. Por isso, ele também fazia parte do Instituto Elimu Cleber Maciel, que tem como objetivo assegurar vida digna aos negros capixabas através de políticas públicas. Além disso, ele era representante do Estado na Coalizão Negra por Direitos.
"Meu irmão deixa um legado e a responsabilidade a todos que o conheceu de levar as lutas que ele travou incansavelmente ao resto do mundo", conta Wynni Rocha.
Lula também foi presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos e da Federação da Juventude Negra no Espírito Santo.
Sentimos e sentiremos muito a ausência de Lula. Ele foi do movimento de juventude, direitos humanos, movimento negro e tantos outros que buscam a promoção de direitos humanos e justiça social. Lula fez história no Estado e deixou grandes contribuições para a construção de uma sociedade melhor. Vá em paz, Lula. Sua voz não será esquecida", disse a secretária Estadual de Direitos Humanos, Nara Borgo.
Lula cresceu em uma família sempre envolvida com a comunidade. Seu pai, Isaías Santana, é morador do Centro de Vitória, referência dentro do Movimento Negro contemporâneo capixaba e ativista da cultura no Espírito Santo.
Foi por causa do pai que Lula se chama Luiz Inácio, uma homenagem ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Lulinha, como era chamado em casa, morava atualmente com a mãe, no bairro Santana, em Cariacica. "Ele é o irmão do meio, o maior companheiro da minha mãe. Era um homem negro, sensível e corajoso", definiu Wynni.
Lula não caminhava sozinho, pois tinha o dom de fazer amigos por onde passava, seja no meio acadêmico, no samba ou nos locais onde trabalhou.
"Perdem as lutas e os movimentos sociais, perdemos nós os amigos. Aprendi com ele que não basta ser contra o racismo, temos que ser antirracistas. Lula nos ajudou na UFES a formar gerações para apoiar a luta contra o racismo. Era uma existência iluminada, era meu irmão do coração. O mais generoso, astuto e um analista político sem igual", declarou Ana Heckert, professora da Ufes.
Jocelino Júnior, atualmente coordenador do Instituto Raízes, recorda que conheceu Lula Rocha no movimento estudantil, ainda quando eram adolescentes.
"Não sei nem dizer há quantos anos nos conhecíamos, mas foi a partir das lutas do povo preto, das semelhanças e dos objetivos que viramos amigos. Dois filhos de trabalhadores, moradores da periferia e que acreditam no samba. Lula era uma referência, um conselheiro político e social, tudo isso dentro de uma pessoa do bem. Ele é a materialização daquele ditado 'fazer o bem sem olhar a quem'", lembra com emoção Jocelino.
Segundo o amigo, Lula carregava também a facilidade de dialogar com todas as vertentes sociais. "Era o foco e a determinação pelo direito dos outros", completou.
Na cultura, Lula foi um dos fundadores do Bloco Afro Kizomba, junto com o pai. O samba e o carnaval, aliás, era duas paixões na vida dele. No peito, ele carregava a Piedade, escola de samba de Vitória onde atuava como ritmista, e também integrou a bateria da Pega No Samba. E não era difícil esbarrar com ele nos blocos do carnaval do Centro de Vitória.
"Num tempo com tanto ódio e mentiras, quando a vida e a dignidade das pessoas são aviltadas, quando a gente se pergunta qual será o futuro da humanidade, Lula brilhava com muita intensidade, sempre nos lembrando que é possível e necessário acreditar na humanidade. E ele não fazia isso com palavras. Ele era assim. Era o melhor de nós e representava o que existe de melhor em nós, em nossa sociedade. Ele deixou o ensinamento de que o amor tem cor e um sorriso lindo e que não faz nada por interesse", completou padre Kelder.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva lamentou, pelas redes sociais, a morte de Lula Rocha e ressaltou a importância do legado do capixaba. Confira a nota na íntegra:
"Meus sentimentos aos familiares, amigos e companheiros de Luiz Inácio Silva Rocha, militante do movimento negro e dos direitos humanos. Meu xará Lula Rocha partiu muito, muito jovem, com tanta coisa ainda para fazer pelo Espírito Santo e pelo Brasil, que precisa de mais cidadãos como ele para lutar pelo direito de ter uma vida plena e livre de violência para nossa juventude.
Não há palavras para definir ou confortar a dor de pais que perdem seu filho. Minha solidariedade nesse momento difícil para os companheiros Izaías Santana e Maria da Penha, que deram meu nome ao seu querido filho, e a minha certeza que a história e o exemplo de Lula Rocha irá emocionar e inspirar muitos outros jovens que lutam por um Brasil melhor.
O governador do Espírito Santo, Renato Casagrande, também prestou solidariedade pelas redes sociais.
Atualmente, Lula Rocha era filiado ao PSOL, de onde também veio manifestação de tristeza por meio da deputada pelo Estado de São Paula, Luiza Erundina.
O professor e ex-candidato a prefeitura de São Paulo, Guilherme Boulos (PSOL), chamou Lulinha de "guerreiro imprescindível".
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