Nesta quarta-feira (17) completa um ano do assassinato do músico Guilherme Rocha, morto pelo policial militar Lucas Torrezani na madrugada do dia 17 de abril de 2023. Desde o dia do crime, o suspeito está preso no Quartel da Polícia Militar em Maruípe, Vitória, e segue recebendo o salário integral.
Lucas responde a dois processos, um sendo o processo administrativo disciplinar na Polícia Militar e o segundo sendo na vara criminal de Vitória, pelo assassinato de Guilherme Rocha. De acordo com o Portal da Transparência, o soldado recebe mensalmente R$ 6.481,29 enquanto aguarda a decisão sobre o seu processo demissionário.
Ainda de acordo com o portal, constam cinco licenças médicas consecutivas desde o dia 26 de maio de 2023 até agora, período em que Lucas já estava preso. O soldado entrou para a Polícia Militar em 2020.
A esposa do músico, Janaina Morais, ainda não consegue ver as imagens das câmeras que flagraram o crime, na madrugada do dia 17 de abril de 2023, em um condomínio em Vitória. “Já basta o que eu fico revivendo daquela noite, é muito sofrimento. Não consigo acreditar que o ser humano faz isso, tirar a vida de uma pessoa do bem”, desabafou a esposa.
Janaina, que trabalha como administradora, se refere ao soldado da Polícia Militar do Espírito Santo, Lucas Torrezani, de 28 anos, responsável pelo tiro que acertou o ombro e atravessou o peito do músico Guilherme, dentro de um condomínio no bairro Jardim Camburi.
Durante esse período, a família de Gulherme aguarda por justiça e espera pelo julgamento que ainda não tem data para ocorrer.
O policial Lucas Torrezani morava em um bloco diferente do casal, mas gostava de beber e ouvir música alta com os amigos, ao lado do apartamento da vítima. O crime aconteceu por volta das 3h, após Guilherme reclamar três vezes do barulho que era feito.
Janaina lembra que ao longo dos quatro anos de relacionamento, menos de quatro meses foram vividos no apartamento. No local, dia a dia, os dois faziam os planos de oficializar o casamento.
“A gente lutou muito, comprou o apartamento, estava terminando a reforma. Estava tudo lindinho, do jeitinho que a gente queria, que o Guilherme queria. A nossa casa era uma realização. [...] Mudamos em janeiro e em abril aconteceu o que aconteceu. A gente ia casar em julho, tínhamos planos”, contou Janaina.
Atualmente, por meio das fotos, perfumes, instrumentos musicais, das alianças do casal e tantas outras recordações guardadas que a Janaina recorda do marido.
Da mesma forma, um ano depois do crime, essa é a rotina do médico legista aposentado, Glicio da Cruz do Soares, pai do Guilherme. Na casa da família, o quarto do filho continua intacto.
“Meu filho era uma pessoa realmente tranquila, brincalhão, gozador, contador de casos, excelente cozinheiro, era a alegria da casa. A gente não fica chorando, mas a saudade bate e eu fico muito chateado. O Guilherme era uma pessoa excelente, e nada vai trazer ele de volta”, lamentou o pai.
Na madrugada do crime, após a vítima pedir por três vezes para que Lucas Torrezani, Jordan Ribeiro de Oliveira e um terceiro amigo que estava no local diminuíssem o barulho, uma discussão aconteceu.
Durante a briga, Jordan deu um empurrão em Guilherme que o fez perder o equilíbrio, sem chance de se defender.
Na sequência, o disparo foi feito por Lucas, e não esboçou nenhuma reação, continuou segurando a arma, deu um gole na bebida e apenas assistiu à agonia de Guilherme no chão.
Janaína contou que estava na janela da cozinha e ouviu toda a discussão.
“Eu gritava e implorava pra ele não fazer nada, quando vi que o Lucas estava armado. O Guilherme tava de bermuda, sem camisa, colocou as mãos para trás”, lembrou.
O inquérito apresentado pela Polícia Civil aponta que, após o tiro, Lucas impediu que a esposa da vítima saísse para prestar socorro. Um vídeo mostra o momento.
A síndica do condomínio Mônica Bicalho também chegou à cena do crime logo após ouvir o disparo de casa. Ela e os outros moradores também não conseguiram se aproximar de Guilherme.
Foi a síndica quem acionou a polícia e o Serviço de Atendimento Médico de Urgência (Samu).
A síndica do condomínio lembrou ainda que já tinha conversado com Lucas sobre o comportamento dele no prédio e o hábito de beber na área comum do condomínio.
Antes de ser preso, ainda no dia do crime, o soldado da PM criou um grupo em um rede social para combinar versões do crime com amigos. E zombou da morte de Guilherme, escrevendo “Não queria silêncio? Eu dei a ele o silêncio eterno".
Uma semana após o crime, a síndica instalou mais uma câmera externa na entrada de cada um dos blocos do condomínio.
“Eu dou graças a Deus que tinha pelo menos uma câmera interna ali, se não ia ser como? Como essa história ia ficar? A gente não ia saber o que aconteceu, ia valer o que fosse contado”, falou.
O soldado foi notificado pelo condomínio algumas vezes. Contra ele havia seis reclamações por barulho feitas nos primeiros meses de 2023, sendo cinco reclamações feitas por Guilherme.
Tanto a esposa Janaina como a síndica Mônica dizem só terem sido chamadas para depor no processo administrativo há poucos dias, no dia 5 de abril. A família questiona a morosidade do processo militar.
Jordan Ribeiro de Oliveira, amigo do PM, também responde por homicídio, mas em liberdade. De acordo com a Polícia Civil, o terceiro rapaz que era participante do grupo não participou da briga e, com isso, vai responder apenas como testemunha do crime.
Atualmente, Janaina mora com a mãe, a filha agora com 13 anos e a cachorrinha Nala, que era do marido. Ela e a filha fazem tratamento psiquiátrico e uso de remédios.
A volta para a casa da mãe foi um consenso entre a família e foi logo depois do ocorrido. “A intenção era eu ficar até tudo se acalmar, mas hoje eu não tenho pra onde ir”.
Depois que Janaína saiu do apartamento em Jardim Camburi, a administradora só voltou para a reconstituição do crime. Quem voltou e tirou os objetos pessoais foi a família e quem resolveu o aluguel foi o corretor.
Guilherme Rocha, de 37 anos, era músico, bacharel em direito, capoeirista e empresário. Nas redes sociais, Guilherme divulgava o seu trabalho como percussionista em bandas e blocos de Vitória.
O advogado de Lucas Torrezani no processo criminal informou que “a defesa tem percebido a ausência de diversos documentos importantes e que não foram juntados ao longo da investigação policial. Isso tem causado uma morosidade no serviço prestado pelo Poder Judiciário. A defesa busca de forma incessante a liberdade do acusado e tem certeza que a verdade será esclarecida ao longo da marcha processual”.
O advogado Taylon Gigante enviou um vídeo à reportagem em que diz que a "defesa tem percebido a ausência de diversos documentos importantes que não foram juntados ao longo da investigação policial, e isso tem causado uma morosidade no serviço prestado pelo poder público, pelo poder judiciário. A defesa busca de forma incessante a liberdade do acusado e tem certeza que a verdade será esclarecida ao longo da marcha processual', disse o representante de Lucas no processo.
De acordo com a defesa de Jordan Ribeiro de Oliveira, desde o inquérito, o cliente está colaborando o tempo todo e está mostrando que não aderiu à conduta do policial que foi quem atirou contra a vítima. No entendimento da defesa, Jordan deveria ser considerado apenas uma testemunha do caso.
Jordan compareceu à delegacia, esclareceu os fatos, participou da reconstituição e nunca ficou demonstrado no inquérito que houve qualquer tipo de premeditação do crime. Segundo o advogado, o entendimento é que o disparo contra Guilherme ocorreu após o empurrão do seu cliente e não em decorrência dele.
A expectativa é que venha a impronúncia para Jordan, ou seja, que ele não seja levado a júri.
POLÍCIA MILITAR
A Corregedoria da Polícia Militar informou que Lucas Torrezani permanece preso no Quartel de Maruípe desde o homicídio.
Ele responde pelo Processo Demissionário que está em fase final de tramitação. Enquanto aguarda a decisão, o militar segue recebendo seus rendimentos.
O g1 ES perguntou como é a rotina de Lucas Torrezani no Quartel, se ele faz atividades, frequência de visitas, uso de celular e acesso à televisão.
Sobre os questionamentos, a Polícia Militar se limitou em dizer que “o referido militar segue rotina padrão adotada em presídios, visto que ele está preso. Portanto, não tem acesso a celulares, tem direito a visitas e tudo que a legislação permite a uma pessoa custodiada”.
POLÍCIA CIVIL
A Polícia Civil do Espírito Santo (PCES), por meio da Divisão Especializada de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) de Vitória, concluiu em junho de 2023 o inquérito policial que investigava a morte do músico Guilherme Rocha.
O autor dos disparos, um policial militar de 28 anos foi detido em flagrante e virou réu no caso. O amigo do militar também foi indiciado.
Os dois envolvidos no crime foram indiciados pelo crime de homicídio duplamente qualificado. Além disso, o homem que atuava como policial militar foi indiciado por abuso de autoridade.
O responsável pelos disparos foi preso, já o outro envolvido foi indiciado, mas vai responder em liberdade, como sendo coautor do crime.
Ministério Público do ES
O Ministério Público do Estado do Espírito Santo (MPES), por meio da Promotoria de Justiça Criminal de Vitória, informou que ofereceu denúncia em face de um policial militar pelo crime de homicídio.
A denúncia foi recebida pela Justiça e apenas um réu apresentou defesa escrita até o momento. Dessa forma, em razão da tramitação processual, ainda não há previsão de julgamento do caso.
Tribunal de Justiça do ES
Há uma audiência de instrução e julgamento agendada para o dia 03/05/2024 na 1ª Vara Criminal (Tribunal do Júri) do Juízo de Vitória.
Após o término de todas as audiências de instrução do processo, o juiz pode decidir pela pronúncia ou impronúncia do acusado, ou seja, se ele vai ou não a júri popular e por quais crimes.
*Com informações das repórteres Ana Elisa Bassi, do g1 ES, e Rafaela Marquezini, da TV Gazeta
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