> >
Como perícia descobriu de onde partiu tiro que matou paciente no ES

Como perícia descobriu de onde partiu tiro que matou paciente no ES

Disparo saiu de uma pistola de calibre .40; investigações apontaram que atirador estava em uma área de mata no morro atrás do hospital em que vítima estava internada

Publicado em 26 de junho de 2023 às 20:18

Ícone - Tempo de Leitura 8min de leitura
Imagens da perícia
De acordo com a perícia, criminosos estavam mirando em viatura na Avenida Leitão da Silva; hospital ficou na linha de tiro. (Divulgação | Polícia Civil)
Júlia Afonso
Repórter / [email protected]

O disparo que atingiu e matou o paciente Daniel Ribeiro Campos da Silva, de 68 anos, no leito de um hospital em Gurigica, Vitória, não partiu da arma de um policial militar. A informação foi constatada pela perícia da Polícia Civil, após a realização de um mapeamento de onde veio o tiro e de qual arma o projétil saiu. O caso aconteceu durante um intenso tiroteio que ocorreu no domingo (25). 

Logo na madrugada, quando o óbito do paciente foi confirmado, peritos da Polícia Civil estiveram no local. Pela manhã, eles voltaram ao hospital para buscar mais detalhes. 

O superintendente de Polícia Técnica-Cientifica, Carlos Alberto Dal-Cin, explicou que, para definir o ângulo do tiro, foi colocada uma vareta no "buraco" da bala. Ela ficou inclinada de cima para baixo, ou seja, foi essa a linha do disparo. 

Como perícia descobriu de onde partiu tiro que matou paciente no ES
Imagens da perícia
Vareta indicou a angulação do tiro, que veio de cima para baixo. Pela imagem, é possível ver também a proximidade com a cama. (Divulgação | Polícia Civil)

Pelo "buraco" na parede, era possível enxergar também a área de mata, em cima do morro, onde os criminosos estariam. Os peritos foram até lá e, no local, encontraram cápsulas de calibre .40 (o mesmo que atingiu o paciente), .380 e de calibre 9mm. "Ou seja, era um ponto de encontro de ações por parte de alguns marginais", ponderou Dal-Cin. 

Imagens da perícia
Perfuração do projétil na parede mostrava mata onde atirador estava. (Divulgação | Polícia Civil)

Pelo trajeto dos tiros, a perícia chegou à conclusão de que os bandidos estavam mirando nas viaturas da Polícia Militar que estavam na região da Avenida Leitão da Silva, a cerca de 170 metros do morro. No caminho, estava o hospital.

Além do quarto onde o idoso estava, que tinha parede de drywall (placas de gesso), os tiros que partiram da mata também atingiram a parte de cima do hospital e outro prédio do outro lado da Leitão da Silva, que também é uma unidade de saúde. 

Projétil não era da polícia

Depois que o corpo do paciente passou por exames no Departamento Médico Legal (DML), a bala foi extraída. Era um projétil de calibre .40. Ele passou por análises, inclusive com o microscópio, para identificar as "ranhuras" da bala.

Essas ranhuras são uma espécie de "identidade" daquele projétil, como explicou o secretário de Estado da Segurança Pública e Defesa Social, coronel Alexandre Ramalho. "É uma digital de cada arma. Cada arma produzida tem uma raia diferente, e essas ranhuras desse projétil não são compatíveis com as armas que a Polícia Militar utiliza hoje", ponderou.

Imóveis e carros atingidos

O prédio da reitoria do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes) localizado na Avenida Rio Branco, em Santa Lúcia, Vitória, também foi atingido por balas perdidas durante o tiroteio que ocorreu na madrugada de domingo (25). A série de tiros em Gurigica matou um idoso, de 68 anos, que estava em um leito de uma clínica da região. O paciente acabou atingido por um projétil, que atravessou a parede da unidade.

As marcas dos projéteis ficaram na parte externa do prédio. Em nota, a instituição disse que "o prédio da reitoria do Ifes foi atingido por disparos, que danificaram a parede e também uma janela. Em função do dia e horário, havia apenas vigilantes no prédio. Ninguém se feriu".

O prédio do Ifes foi mais um na lista de imóveis e automóveis atingidos: teve viatura da Guarda Municipal de Vitória com perfuração, um estabelecimento comercial na Avenida Leitão da Silva, um carro que estava estacionado perto do hospital onde o idoso morreu, pelo menos três prédios em Bento Ferreira e um consultório odontológico na Reta da Penha. Um veículo também foi incendiado em Bento Ferreira. 

Prédio da reitoria do Ifes, em Santa Lúcia, foi atingido por balas perdidas
Marcas de tiros foram identificadas no prédio da reitoria do Ifes, em Santa Lúcia. (Divulgação | Ifes)

Entenda o caso

A madrugada de domingo (25) foi de terror na Avenida Leitão da Silva, em Gurigica, Vitória. Uma sequência de disparos terminou com uma parede de hospital perfurado e um paciente, um idoso de 68 anos que estava internado em um leito de uma clínica da região, atingido e morto.

Antes da fatalidade, uma série de ocorrências foram registradas em Vitória. Entre elas, o espancamento e morte de um adolescente de 16 anos, identificado como Carlos Eduardo Cabral de Oliveira, numa escadaria de Gurigica. 

Segundo informações de familiares, Daniel estava internado há dois anos em uma clínica de cuidados paliativos Total Health que fica dentro do Complexo Life Vix Mall, no quinto andar, ao lado do hospital MedSênior, após ter sofrido um acidente vascular cerebral (AVC). A bala teria atravessado a parede e atingido o paciente na têmpora.

O secretário de Estado de Segurança Pública e Defesa Social, coronel Alexandre Ramalho, em entrevista ao Bom dia ES, da TV Gazeta, disse nesta segunda-feira (26) que a polícia já está investigando o espancamento do menor e pede que qualquer pessoa que tenha informação denuncie.

Aspas de citação

A partir do momento do seu falecimento (adolescente), vem toda essa onda de violência contra a sociedade. Não sabemos o motivo que esse jovem foi espancado e estamos investigando. Quem tiver informação, denuncie para que possamos responsabilizar os culpados, mas, mais uma vez, nada justifica contra a sociedade

Alexandre Ramalho
Secretário de Estado de Segurança Pública e Defesa Social
Aspas de citação

Segundo o secretário, o adolescente já havia sido espancado no dia 13 de junho, em Aracruz, no Norte do Espírito Santo. Segundo Ramalho, o tráfico de drogas do município do Norte do ES tem ligação com o movimento em Jaburu, em Vitória.

Alexandre Ramalho afirmou que as investigações iniciais apontam que ele teria sido espancado por traficantes, após falhar em avisar sobre a chegada da polícia no local. “O que não justifica é uma ação como o que vimos na Avenida Leitão da Silva, subjugando a população”, comentou o secretário.

Apesar das investigações ainda não concluírem sobre os disparos que atingiram o hospital, Ramalho aponta para a juventude ligada ao tráfico de drogas. Ele ainda informou que na região de Jaburu, Bairro da Penha e São Benedito, 111 pessoas foram presas neste ano, além da apreensão de 29 armas de fogo, sendo 26 pistolas.

“Estamos falando de uma juventude criminosa de 14 a 29 anos ligados ao tráfico de entorpecentes, portando fuzis e pistolas, atirando a esmo do alto do morro para hospitais particulares, públicos, residências e comércios. Somente nos primeiros 5 meses deste ano, foram 203 confrontos armados com a Polícia Militar. Ou seja, 203 vezes que a polícia foi atender uma ocorrência, foi confrontada por essa juventude criminosa”, disse em entrevista ao Bom dia ES, da TV Gazeta.

Investigação

Antes da ocorrência dos disparos na Avenida Leitão da Silva, duas mortes foram registradas na região, além de um homem baleado em confronto com a Polícia Militar.

Apesar de não confirmar que os disparos tenham sido represália a alguma ação anterior, o secretário de Estado de Segurança Pública e Defesa Social, coronel Alexandre Ramalho, divulgou algumas ocorrências que aconteceram em Vitória, durante a noite de sábado (24), que podem ter alguma relação com o terror na Avenida Leitão da Silva durante a madrugada de domingo. A Gazeta elencou os casos em ordem cronológica. Veja:

18h: Drogas apreendidas em Gurigica

Às 18h, uma equipe da Polícia Militar apreendeu drogas em Gurigica, na divisa com São Benedito. Na ocasião, segundo o comandante-geral da corporação, coronel Douglas Caus, dois suspeitos viram os agentes, correram e abandonaram os entorpecentes.

20h: Tentativa de sequestro e morte

Às 20h, um homem foi morto no bairro São Cristóvão, próximo ao Horto de Maruípe. De acordo com a Sesp, Samuel Cesquini da Silva, vulgo Samulouco, de 23 anos, sofreu uma tentativa de sequestro. Ele reagiu e foi executado com tiros de pistola e fuzil. Segundo a polícia, ele teria passagem por tráfico de drogas.

21h: Confronto e suspeito baleado

Às 21h houve um confronto entre suspeitos e policiais no Morro do Macaco, em Tabuazeiro. Um homem de 22 anos foi baleado na coxa esquerda. De acordo com a Sesp, ele estaria com uma pistola e drogas, e teria três passagens por tráfico de drogas. Ele foi socorrido com vida ao hospital.

23h28: Adolescente espancado e morto

Às 23h28, um adolescente de 16 anos, identificado como Carlos Eduardo Cabral de Oliveira, deu entrada no Hospital Estadual de Urgência e Emergência (HEUE) com sinais de espancamento, sobretudo no pescoço. Ele não resistiu aos ferimentos e morreu.

De acordo com a Sesp, o rapaz foi encontrado ferido em uma escadaria de Gurigica e levado ao hospital por moradores. O coronel Ramalho afirmou que as investigações iniciais apontam que ele teria sido espancado por traficantes, após falhar em avisar sobre a chegada da polícia no local.

No dia 13 de junho deste ano, esse mesmo adolescente também teria sido espancado por traficantes em Aracruz, no Norte do Estado. De acordo com a polícia, o adolescente já havia sido apreendido por tráfico de drogas.

2h37: Caos na Leitão da Silva

Às 2h37, quem estava perto da região de Gurigica ouviu muitas rajadas de tiros, inclusive de fuzil. Isso porque, segundo a Sesp, criminosos desceram do morro em direção à Avenida Leitão da Silva, onde começaram a disparar. Um carro chegou a ser incendiado, na altura do bairro Bento Ferreira. No mesmo bairro, pelo menos três prédios foram atingidos por balas perdidas.

A PM chegou ao local e começou a pedir reforços. Houve intensa troca de tiros. Vidros de um estabelecimento comercial foram atingidos. Um carro que estava estacionado na região e uma viatura da Guarda Municipal também foram perfurados pelas balas.

Bala perdida
Estabelecimento comercial ficou com vidro quebrado após tiroteio na Avenida Leitão da Silva. (Reprodução/TV Gazeta)

3h39: Paciente é atingido em leito

Às 3h39, o paciente Daniel Ribeiro Campos da Silva, de 68 anos, morreu após ser atingido por uma bala perdida no leito do hospital em que estava internado. O projétil atravessou a parede da unidade de saúde, que fica na Avenida Leitão da Silva, durante o tiroteio.

Segundo a perícia da Polícia Civil, o disparo teria partido da parte de cima do morro. "A perícia esteve no local à noite e eu solicitei que ela retornasse pela manhã, para ter uma melhor visibilidade, e eles então traçaram a trajetória do projétil, que vem numa linha descendente, do morro para a pista, a aproximadamente 33 metros do hospital", declarou o delegado-geral da Polícia Civil, José Darcy Arruda.

Agora, as investigações continuam, para identificar de onde partiram os disparos e a motivação para os ataques. Além disso, o policiamento segue reforçado na região de Gurigica, Jaburu, Tabuazeiro e entorno. 

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta

A Gazeta integra o

The Trust Project
Saiba mais