A Corregedoria da Polícia Militar vai instaurar um inquérito para apurar a morte de Lara Croft, de 34 anos. A travesti morreu durante uma abordagem da corporação na madrugada de quarta-feira (13), após ser atingida com cinco tiros efetuados por um PM durante uma abordagem.
Em nota enviada na tarde desta quinta-feira (14), a Polícia Militar evidenciou que acompanha o caso por meio da Corregedoria. A reportagem questionou se os policiais envolvidos na ocorrência seguem trabalhando, mas não obteve retorno.
A ocorrência da ação narra que Lara tentou golpear, com um barbeador, os policiais, no momento da abordagem, além de não ter respeitado a ordem para soltar o objeto. Moradores e familiares contestam a versão da PM.
Procurada pela reportagem, a Polícia Civil informou, por nota, que a perícia foi acionada na madrugada de quarta-feira (13) para atendimento a uma ocorrência de morte em confronto com agentes do Estado, no bairro Alto Lage, em Cariacica.
Segundo a corporação, o corpo foi recolhido e encaminhado para o Departamento Médico Legal (DML) de Vitória, para ser necropsiado e, posteriormente, liberado para os familiares. De acordo com a Polícia Civil, o caso segue sob investigação do Serviço de Investigações Especiais (SIE), que investiga ocorrências envolvendo agentes de segurança e, não há outras informações que possam ser divulgadas no momento.
A versão dada pelos policiais aponta que os agentes visualizaram a travesti e outro indivíduo em atitude suspeita no bairro e deram voz de abordagem. Os suspeitos não teriam respeitado a ordem e tentaram fugir. O relato policial informa que a travesti foi alcançada e, ao ser abordada, tentou agredir os militares que participavam da ocorrência.
Durante a abordagem, a suspeita teria retirado um objeto perfurocortante da bolsa, um barbeador, e tentado golpear os militares. Ela ainda teria tentado pegar a arma de um dos militares.
Neste momento, de acordo com o boletim de ocorrência, um policial efetuou cinco disparos contra a suspeita, que foi atingida e caiu no chão. Ela foi socorrida pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), mas não resistiu e morreu. Já o outro suspeito conseguiu fugir e não foi localizado.
A Polícia Militar afirma que a travesti foi morta em um confronto, ao puxar o barbeador para golpear os agentes, por isso o militar atirou cinco vezes.
Moradores conversaram com a reportagem da TV Gazeta e contestaram a versão da PM. Para eles, a travesti não atacou os policiais e foi executada durante a abordagem. Segundo um dos moradores, que preferiu não se identificar, Lara tinha o costume de fazer piadas com os policiais quando eles abordavam alguém no bairro e que os PMs não gostavam e já teriam a ameaçado.
"O policial chegou para abordar. Mas não era uma abordagem comum. A Lara falou algo que ele não gostou. Ele partiu para cima dela, deu vários socos na cabeça e vários tiros nela e ela não teve como reagir. Ele matou ela sentada. Ela não tinha ideia certa. Fazia tratamento psiquiátrico, tomava aquele monte de remédio. Ela foi executada porque ela não estava com nada. Eles estão abusando. Ontem foi a Lara e hoje pode ser meu filho. Eu acho que rolou um preconceito também", afirmou o morador, que preferiu não se identificar.
A vendedora Silvania da Costa Santos, mãe de Lara, disse que falou com a filha pela última vez durante a tarde de terça (11).
"A última vez que eu liguei pra ela foi de tarde. Ela disse que estava bem e estava na rua mas não podia falar porque podiam roubar o celular dela. Quando cheguei ao local do crime, a identidade e o celular não estavam lá", contou.
Ainda de acordo com Silvania, a filha tinha problemas psiquiátricos agravados pelo uso de drogas e já foi internada, inclusive compulsoriamente, outras vezes.
"Morreu de uma maneira muito covarde. Nunca andou armada, nunca mexeu com tráfico. Usuária eu digo que era, era doente de usar drogas. Covardia o que fizeram. Não sei quem foi mas Jesus sabe. Justiça será feita aqui na Terra e no céu. Ela estava doente. Precisando de ajuda e não de violência. Precisava de atendimento psicológico. Cheguei a pensar até em juiz para interná-la compulsoriamente. Tenho os laudos do psiquiatra dela. Disseram que o uso de drogas estava deixando ela com esquizofrenia. Era pra ter internado ela em uma clínica de recuperação".
Silvania disse que Lara era sua única filha. Sobre a versão da PM, de que a filha teria agredido policiais militares, Silvania disse que ela nunca foi agressiva e que havia outras formas de contê-la.
"Ela me amava. Um coração maravilhoso. Eles eram fortes, eram muitos. Por que não fizeram da mesma foram que fizeram quando foram dentro da minha casa para interná-la? Poderiam fazer o mesmo. Foram com escudo, arma não-letal. Por que não agiram dessa maneira também? Por que não entrou em contato comigo? Por que não levaram aos conhecimentos do juiz?", desabafou a mãe.
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