O sistema de pagamentos instantâneos via Pix, do Banco Central, facilitou a vida dos brasileiros, mas à medida que se tornou popular, criminosos passaram a se aproveitar dessa facilidade para realizarem sequestros-relâmpagos e, com as vítimas dentro do carro, as obrigam a realizarem transferências bancárias. Somente no Espírito Santo, pelo menos nove casos foram registrados nos últimos dois meses na Grande Vitória. Na maioria das situações, o alvo dos bandidos são mulheres.
Os nove casos ocorreram no período de 18 de outubro até o dia 13 de dezembro, conforme levantamento de A Gazeta, mas a quantidade de crimes como esse pode ser maior, considerando que a reportagem utilizou informações somente das situações noticiadas pela imprensa. Procurada, a Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social (Sesp) informou que não possui dados específicos sobre sequestros em que as vítimas foram obrigadas a fazer essas transferências via Pix para os criminosos, mas passou dados de roubos envolvendo sequestros.
- 2021 (janeiro a dezembro): 162
- 2022 (janeiro a novembro): 154
* Consiste na rendição da vítima por parte do infrator, cerceando a sua liberdade até que o seu objetivo seja alcançado, neste caso, o roubo, podendo ser do veículo, dinheiro, pertences, etc. Após a conclusão desse crime, a vítima é liberada.
Cinco, entre os nove casos noticiados recentemente, foram registrados em Jardim da Penha, Vitória, e, em todos eles, as vítimas são mulheres. O modo de agir dos criminosos é parecido em todas as situações: quatro bandidos participaram do crime, as vítimas são abordadas dentro ou próximo ao veículo delas, são ordenadas a rodarem com os suspeitos dentro do carro e, no trajeto, obrigadas a realizarem transferências via Pix. Há situações em que o automóvel da vítima é roubado.
O caso mais recente ocorreu na última segunda-feira (12). Uma dentista de 43 anos foi abordada por dois homens armados ao sair do pilates em Jardim da Penha, Vitória, no momento em que entrava em seu carro. Eles entraram no veículo, a obrigaram a passar para o banco de trás, e circularam com a vítima. No trajeto, outros dois bandidos entraram no carro e os quatro exigiram as senhas dos aplicativos dos bancos da vítima até que conseguiram realizar um Pix no valor aproximado de R$ 500. Antes de ser abandonada em Jardim Tropical, na Serra, a mulher ainda presenciou o grupo abordando outra vítima. Eles roubaram outro carro e se dividiram nos dois veículos.
No mesmo bairro, mas no começo do mês, em 1º de dezembro, duas moradoras passaram pelo mesmo tipo de situação. O primeiro caso envolveu uma professora de 41 anos, rendida em frente ao prédio onde mora. O bandido entrou no carro, circulou com ela e acabou por libertá-la sem levar nada. Pouco tempo depois, outra mulher, de 39 anos, foi rendida e dela o criminoso conseguiu roubar R$ 8 mil, entre o dinheiro que estava com ela e transferência bancária pelo celular. A polícia acredita que os dois crimes foram cometidos pela mesma pessoa.
Em outro caso, no dia 9 de novembro, nem mesmo a gravidez impediu que uma mulher fosse sequestrada e ficasse sob o poder de um criminoso. A mulher, com oito meses de gestação, foi vítima de um sequestro-relâmpago quando estava saindo de carro da garagem de um prédio, também em Jardim da Penha, Vitória. O criminoso, que estava armado, entrou no veículo e circulou pelo bairro com a vítima. Durante o trajeto, ela foi obrigada a fazer transferências de dinheiro via Pix para o assaltante.
No total, a mulher transferiu R$ 3 mil para três pessoas diferentes. Segundo reportagem da TV Gazeta, o criminoso ficou cerca de 20 minutos com a vítima e teria dito que se ela não estivesse grávida seria pior. Ela ainda disse que ele a ameaçava o tempo todo, mas não chegou a agredi-la. O homem mandou que a vítima o deixasse na rua Hugo Viola, ainda em Jardim da Penha, perto da Ponte da Passagem, e fugiu.
Na noite o dia 24 de novembro, uma família foi sequestrada em casa na Serra e rodaram por vários bairros sob o poder dos criminosos dentro do carro. De acordo com as vítimas, os sequestradores tentaram fazer saques em caixas eletrônicos da região, mas não conseguiram. Durante todo o tempo que esteve com os criminosos, eles obrigaram um dos integrantes da família a realizar uma transferência de mil reais via Pix.
Houve perseguição até a altura de Nova Carapina, momento em que o veículo capotou dentro de um brejo na estrada lateral da BR 101, na Serra.
Um dia antes, em 23 de novembro, um homem de 44 anos, estava em um ponto de ônibus no bairro Chácara Parreiral, na Serra, quando um carro parou em sua frente e três homens saltaram do veículo e dois deles vieram em sua direção, apontando uma arma de fogo. Eles anunciaram o assalto, colocaram um capuz em sua cabeça e obrigaram a vítima a entrar no carro.
Após isso, eles levaram ele até uma casa, onde ele ficou por cerca de 36 horas, sem água e sem comida. Nesse período, os criminosos obrigaram ele a fazer transferências via Pix e a sacar dinheiro. Após um dia e meio à mercê dos criminosos, eles o levaram até o bairro Jardim Limoeiro, onde foi abandonado.
Um caso de grande repercussão no Estado aconteceu no dia 18 de outubro, quando o filho de um empresário do ramo de construção civil foi sequestrado na Praia do Canto, em Vitória.
A vítima atua como executivo na diretoria do empreendimento da família. Ele foi localizado no dia seguinte em um cativeiro, em Viana. Uma pessoa foi presa. Além disso, foram apreendidos um carro usado no crime, uma arma falsa, uma faca e uma garrucha.
De acordo com o delegado Maurício Gonçalves, da Delegacia Especializada de Antissequestro (DAS), a vítima saiu de casa e foi praticar exercícios físicos. Em seguida, retornaria para casa, onde a esposa o aguardava.
"Quando ele se dirige ao veículo dele que está no estacionamento, é abordado e rendido através de arma de fogo na traseira do veículo. Eles saem e vão na direção da Praia de Camburi", revelou o delegado. De lá, seguiram para a Rodovia das Paneleiras.
Já dentro do veículo, o empresário foi ameaçado. No banco de trás, os criminosos mandaram ele fazer transferências bancárias. A polícia não quis revelar o valor exigido pelos sequestradores e nem as transferências realizadas pela vítima.
No dia 29 de outubro, uma mulher foi rendida e sequestrada por quatro criminosos no bairro Bicanga, na Serra. A vítima foi abandonada sem ferimentos, no bairro Jardim Limoeiro. Três suspeitos do crime foram detidos horas após o ocorrido em um baile funk.
De acordo com o boletim de ocorrência da Polícia Militar, a mulher contou que um veículo branco com quatro criminosos fechou o carro dela e a rendeu. Em seguida, três homens entraram no veículo da mulher e passaram a fazer tortura psicológica, como ameaças de morte. Ela disse que foi obrigada pelos suspeitos a desbloquear o celular e fazer transações bancárias via Pix. Ela foi abandonada, sem ferimentos, ainda durante a noite, no bairro Jardim Limoeiro, mesmo município.
No dia 21 de novembro, um motorista de caminhão de 43 anos foi sequestrado, em Jardim Limoeiro, na Serra. A vítima disse que estava em um carro de passeio quando foi abordado pelos criminosos e ficou refém durante uma hora e teve R$ 400 e celular roubados.
O homem ainda foi obrigado a fazer transações bancárias via Pix para contas indicadas, além de transferência por meio de máquina de cartão de crédito. Os suspeitos fugiram sem machucar a vítima e, até a última atualização desta reportagem, ninguém havia sido detido.
Diante da frequência de casos de sequestro-relâmpago com golpes do Pix, fica a dúvida, é possível se prevenir? No dia 11 de novembro, delegado Érico Mangaravite, titular do 3º Distrito Policial de Vitória, conversou com A Gazeta e deu algumas dicas, entre elas, de que esse tipo de delito ocorre quando os bandidos veem fragilidade ou oportunidade "deixadas" pelas vítimas.
"Essas abordagens, pelo que a gente percebe quando faz a análise das imagens e encontra as vítimas, normalmente acontecem em momentos de maior vulnerabilidade do condutor: quando vai estacionar ou sair com o carro, quando vai abrir ou fechar o portão", disse o delegado.
Por isso, é importante redobrar a atenção nesses momentos: os criminosos costumam escolher as vítimas mais distraídas. "O ideal é tentar fazer essas transições para a garagem e para o carro o mais rápido possível. Se a vítima redobra a atenção e tenta aumentar as condições de segurança, a probabilidade de acontecer é menor", pontuou.
Em casos em que as táticas de prevenção não foram suficientes e a pessoa acabou abordada por criminosos, sendo obrigada a fazer transferências bancárias, a recomendação é não reagir, e assim evitar uma ação mais violenta do suspeito.
No entanto, para o prejuízo em relação às transferências via Pix ser menor, a principal ferramenta está na manutenção do limite máximo diário que o próprio usuário pode deixar configurado.
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