O resultado da política armamentista do presidente Jair Bolsonaro já pode ser medida em números: o registro de armas de fogo aumentou 100% em três anos em todo o Brasil. No Espírito Santo, os dados de armas circulando apontam crescimento proporcional ainda maior, pois a variação foi de 120% entre 2017 e 2020.
O levantamento foi feito com informações do Sistema Nacional de Armas, o Sinarm, e publicado pelo 15º Anuário Brasileiro de Segurança Pública.
Em 2017, havia 14.044 armas registradas legalmente no Espírito Santo. Já em 2020, o Sinarm contabilizava 31.155, ou seja, mais que o dobro de três anos antes. O aumento de 120% é maior que a média nacional, assim como em outras 10 unidades da federação.
Para o professor e advogado Henrique Herkenhoff, o aumento gritante é resultado dos decretos de flexibilização de armas do presidente Jair Bolsonaro, que se espalharam mês a mês pelo mandato dele.
"Aumenta-se o preço e diminuiu a burocracia, isso obviamente vai influenciar no aumento de acesso a armas. Como o discurso armamentista tem ficado na 'crista da onda' do governo, isso virou uma propaganda para esse comércio, gerando a vontade e a ideia nas pessoas, que começam a pensar nessa hipótese de adquirir uma arma", observa Herkenhoff, que também é ex-secretário de Segurança Pública do Espírito Santo.
Para ele, o "boom" de armas circulando não tem relação com a violência. "Não está relacionado ao aumento de violência, pois não houve essa variação relevante que pudesse influenciar, continua no contexto cotidiano. A compra da arma é apenas ideologia, baseada no sentimento de raiva e impotência, não é uma escolha racional", opina.
A conta inclui armas legais adquiridas por cidadãos, por atiradores desportivos, caçadores e colecionadores - os chamados CACs - e armas incorporadas em nome de empresas, além das armas de uso pessoal de policiais, bombeiros e militares.
Ao destrinchar os dados, o anuário verificou que a maioria dos novos registros de armas no território capixaba não está entre os caçadores, atiradores desportivos e colecionadores, mas sim nas mãos de cidadãos comuns. Em 2020, dos 31.155 registros, 17.589 eram de particulares.
Mais que o volume de armas em circulação, o que preocupa o mestre em Segurança Pública e policial federal Fabrício Sabaini é a falta de controle sobre esses equipamentos circulando.
"Anos atrás, a arma mais utilizada em crimes era o revólver calibre 38 antigo, justamente porque não se tinha controle sobre a venda. O que estamos vendo hoje terá um resultado semelhante, já que não há controle possível sobre esse número de armas. Podemos afirmar que irá influenciar nas taxas de letalidade futuras, pois parte desse armamento deve cair na ilegalidade, pois quanto maior o número de armais, maior a porcentagem que será extraviada, furtada e roubada, exatamente por ausência desse controle mais efetivo no após vendas", destaca Sabaini.
A tendência é que o acesso às armas cresça ainda mais neste e nos próximos anos, já que o presidente editou, em fevereiro passado, uma série de normas para facilitar o acesso e aumentar o limite para aquisição de armamentos e munições .
Nesse decreto, Bolsonaro passou de quatro para seis o limite de armas de fogo de uso permitido que um cidadão autorizado pode adquirir. Também desidrata medidas de rastreamento e controle de armas de fogo e munição.
Enquanto há mais armas no mercado, a retirada de armas ilegais caminha de forma estável. Em 2019 a Secretaria Estadual de Segurança Pública e a Polícia Federal apreenderam 3.391 e, no ano seguinte, 3.964.
"A apreensão é algo que não está atrelado ao vínculo de armas, pois é mais o resultado da ação de polícias. É possível percebemos isso quando foi retirado, em outros governos estaduais, a bonificação de apreensão de armas. A hipótese maior, mas ainda não testada cientificamente, é que comecemos a ter mais crimes de ocasião, como brigas de trânsito, feminicídios e até suicídios", pontua Sabaini.
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