O jovem de 21 anos que foi socorrido com a barriga aberta e parte do intestino exposto, em Guarapari, apresentava dosagem alta de fentanil no sangue, uma droga de uso controlado. A informação consta no prontuário do paciente. Especialista em tratamento antidroga explica que este medicamento é um forte analgésico, em algumas situações utilizado como anestésico, chegando a ser 30 vezes mais potente do que a morfina e 50 vezes mais potente que a heroína.
O fato envolvendo o jovem aconteceu na madrugada do último dia 16, na Praia do Ermitão, localizado no Parque Morro da Pescaria, em Guarapari. Ele estava acompanhado da namorada, de 20 anos, que também apresentava ferimentos no corpo.
O prontuário do paciente traz as informações sobre o seu atendimento e tratamento desde o dia em que foi socorrido para o Hospital Estadual de Urgência e Emergência (HEUE) até detalhes de sua transferência e atendimento em unidade hospitalar privada, o Vitória Apart Hospital, onde permanece internado. A jornalista Marcella Antonio, produtora da TV Gazeta, teve acesso ao material.
No documento é relatado que o jovem chegou ao hospital de emergência no dia 16 de janeiro com “trauma abdominal perfurativo com enterectomia (retirada de uma parte do intestino) extensa”. E acrescenta: “Relato de uso de entorpecente. Relato de briga na praia com ferimento em cavidade abdominal e avulsão (extração) de quase todo o delgado (intestino)”, diz o texto, descrevendo ainda os procedimentos médicos que foram adotados. Traz ainda: "Achado vestígios de dosagem alta de fentanil no sangue."
Além do corte na barriga, o jovem teve fraturas na face - fratura nasal e no seio maxilar direito. Ele foi submetido a cirurgia no rosto e ainda no abdômen, para reparar o que sobrou do seu intestino.
De acordo com o prontuário médico, durante o socorro prestado ao jovem foram “achados vestígios de dosagem alta de fentanil no sangue”. Não é especificada a quantidade.
De acordo com a psiquiatra Carolina Coser, especialista em tratamento de pessoas viciadas em drogas, o fentanil é um remédio do grupo de analgésicos fortes. Ele chega a ser 30 vezes mais forte que a morfina e é muito usado nos hospitais para sedar os pacientes antes de cirurgia ou em pacientes com muita dor no pós-operatório.
O medicamento pode ser aplicado de forma venosa ou intramuscular. Entre os efeitos colaterais estão insônia, náusea, euforia e em seguida um relaxamento de todo corpo. “Nos casos mais graves pode acontecer confusão mental, diminuição do estado de alerta do corpo, quando a pessoa perde a noção do risco de seus atos e em casos extremos perda da consciência”, acrescenta a psiquiatra.
De acordo com a psiquiatra, existe um remédio para reverter o efeito do fentanil no organismo, que precisa ser administrado com a ventilação mecânica, já que nas situações em que a pessoa entra em coma pelo uso do medicamento, ela para de respirar sozinha. “Ocorre que se não for feita a ventilação mecânica, a pessoa pode ter uma depressão respiratória”, informa a médica.
Nos Estados Unidos, segundo Carolina Coser, o fentanil vem sendo utilizado junto com cocaína ou com antidepressivos “Este tipo de mistura pode acabar em morte”, observa a psiquiatra.
De acordo com o perito da Polícia Federal André Bitencourt dos Santos, o uso de fentanil como droga ou associado a uma outra droga não é comum no Brasil. No Espírito Santo, pondera, seria o primeiro relato que ele recebe. “O medicamento vem sendo muito usado com essa finalidade nos Estados Unidos (EUA). É uma das principais drogas em circulação, onde também vem aumentando o número de mortes”, relata.
No Brasil, segundo Bitencourt, não é tão usual o consumo de droga injetável. "No Espírito Santo as pessoas têm o costume de usar drogas em que possam fumar ou cheirar", observa.
Em relação a heroína, ele relata que o fentanil tem efeitos parecidos, mas é ainda muito mais potente. “É 50 vezes mais potente do que a heroína. Uma pequena quantidade é suficiente para deixar a pessoa fora de si, sem controle de seus atos, por isto uma overdose acontece mesmo que a pessoa tenha consumido uma quantidade muito pequena do fármaco”, explica.
Bittencourt informa que no Brasil o fentanil não é proibido, mas tem uso controlado, sendo liberado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) sob duas formas:
No caso envolvendo os jovens em Guarapari, ele avalia que eles podem ter utilizado um selo endodérmico do fentanil, considerando que a jovem de 20 anos, em seu depoimento à polícia, informou que usou uma droga em formato de “quadradinho de papel”.
O selo endodérmico do fentanil, segundo o perito, pode ser confundido com o papel de LSD, uma droga sintética. "Não podemos afirmar que foi isto que aconteceu, mas é uma possibilidade”, pondera o perito.
O advogado que representa o casal de namorados, Lécio Machado, informou que ambos se recuperam das lesões que sofreram, e que o jovem permanece internado no Vitória Apart Hospital, na Serra. Em laudo médico divulgado nesta quinta-feira (3), é informado que ele só deve deixar a unidade hospitalar por volta do próximo dia 12 de fevereiro.
Em relação aos demais pontos, incluindo as informações do prontuário médico, Lécio Machado informou que a família prefere não se manifestar sobre o assunto aguardando a conclusão do inquérito da Polícia Civil.
O prontuário médico do jovem traz mais duvidas do que respostas. A Polícia Civil ainda tenta entender o que aconteceu e de quem partiu o ataque que fez com que o estudante ficasse com parte do intestino para fora. A polícia não divulgou detalhes sobre a investigações.
Na noite de 15 de janeiro, um casal de namorados foi até a Praia do Ermitão, em Guarapari, para fazer um luau de despedida, já que o rapaz, que tem 21 anos, viajaria para os Estados Unidos para estudar, segundo a família.
O acesso principal à praia, que é feito pela portaria do Parque Morro da Pescaria, estava fechado. Por isso, os jovens passaram pelas pedras. Câmeras de monitoramento mostram eles entrando no local por volta das 21h.
A moça de 20 anos informou em depoimento para a polícia que, ao chegar na parte de areia, eles beberam vinho e usaram drogas, depois disso, "apagaram" — segundo o advogado relatou em entrevistas anteriores.
De acordo com o depoimento da garota, por volta das 2 horas, ela acordou com uma ligação da mãe. Foi quando ela percebeu que estava machucada e o namorado com a barriga perfurada. Ela pediu ajuda à mãe, e o namorado teria gritado o nome do lugar onde eles estavam.
Imagens de monitoramento mostram às 6 horas de 16 de janeiro o pai da jovem correndo pelo parque. Logo em seguida, os socorristas do Samu passam transportando o rapaz em um triciclo. Ele foi encaminhado para o Hospital de Urgência e Emergência, em Vitória.
As famílias informaram, por meio de nota, que os jovens foram vítimas de um ataque durante uma tentativa de assalto. Um celular teria sido levado, além de dinheiro. Nenhum suspeito foi preso e, até o momento, não se sabe que objeto foi utilizado para cortar a barriga do rapaz e nem a motivação do crime. A Delegacia de Guarapari investiga o caso.
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