A cada hora, pelo menos uma mulher busca por ajuda policial e da Justiça temendo pela própria vida. Com medo, vítimas de agressões ou ameaças de companheiros ou ex-parceiros, procuram delegacias para conseguirem medidas protetivas contra agressores, mecanismo trazido na Lei Maria da Penha.
A Lei Maria da Penha entrou em vigor em setembro de 2006 com a intenção de tornar mais rigorosa a punição para agressões contra a mulher no âmbito doméstico e familiar. De acordo com o criminalista Elcio Cardozo Miguel, o instrumento assegura à mulher a proteção contra agressões físicas e psicológicas, além de possíveis ameaças pelos agressores.
"Nos artigos da lei, também é possível verificar a criação de mecanismos de proteção, como as medidas protetivas e os atendimentos psicossociais".
NÚMERO PODE SER AINDA MAIOR
Apesar de alarmante, esse número pode ser ainda maior, já que a Secretaria de Estado da Segurança Pública e Defesa Social (Sesp) concentra apenas dados dos pedidos de medidas protetivas realizados em delegacias especializadas em crimes em razão de gênero. No entanto, mulheres que passam por riscos também podem fazer o requerimento nas delegacias regionais.
De janeiro a maio deste ano, 3.659 mil mulheres pediram por proteção no Espírito Santo. Somente na Grande Vitória foram registrados 2.373 requerimentos, de acordo com dados da Sesp, que consideram apenas os registros em delegacias especializadas.
Em 2018, de acordo com o Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), 10.828 medidas protetivas foram concedidas. Em 2017, foram 8.592 concessões, em evidente crescimento de violência doméstica no Estado. O TJES não tem dados atualizados sobre os pedidos autorizados judicialmente em 2019.
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O QUE SÃO MEDIDAS PROTETIVAS
As medidas, concedidas judicialmente, são ações que podem obrigar os agressores a se afastarem do lar ou mesmo proibi-los de manter qualquer contato com a vítima.
Os pedidos podem ser iniciados na delegacia, sendo que, com alteração recente na Lei Maria da Penha, a partir deste ano, a própria autoridade policial pode autorizá-los, sem necessidade de encaminhamento ao Judiciário, caso haja grande risco e sejam feitos em municípios que não têm juiz imediato para o atendimento. Caso a solicitação seja levada ao magistrado, ele terá o prazo de 48 horas para analisá-la.
De acordo com a Polícia Civil, por meio da Divisão Especializada de Atendimento à Mulher (DIV-Deam), está sendo realizado um levantamento, em todo o Espírito Santo, dos municípios onde a lei ainda será aplicada.
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MEDIDA PROTETIVA É A SOLUÇÃO?
De acordo com o advogado criminalista Elcio Cardozo Miguel, as medidas protetivas são os principais mecanismos de prevenção à violência de gênero.
No mesmo sentido, a delegada Chefe da Divisão Especializada de Atendimento à Mulher, Cláudia Dematté, explicou que a ideia por trás da criação das medidas é de garantir resposta rápida às vítimas em situação de risco próximo.
"Essas medidas possuem natureza cautelar, sendo que uma vez solicitadas pela vítima, a autoridade policial possui 48 horas para encaminhá-las ao juiz, que possui igual período para analisá-las. Hoje também há o crime de descumprimento de medida de urgência, sendo que esse delito tem pena de detenção de três meses a dois anos, e, se o agressor for preso em flagrante, o crime será inafiançável na esfera policial", informou.
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QUAL É A EFICÁCIA DA MEDIDA PROTETIVA
Conforme explicou a coordenadora do Laboratório de Pesquisas da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) sobre Violência Contra Mulheres, Brunela Vincenzi, nem sempre as instituições garantem efetividade na proteção às vítimas.
"O que temos percebido é que mesmo com medidas protetivas em vigor ou já concedidas contra o agressor, de alguma forma ele consegue se reaproximar da mulher e cometer um ato de violência até mais grave. A medida protetiva é concedida pela Justiça, e isso tem sido relativamente rápida e eficaz. Todavia a vigilância do cumprimento dessa medida se dá aqui pela Patrulha Maria da Penha. Essa forma de vigiar não é rápida o suficiente para evitar completamente a violência, embora tenha contribuído para a redução dos casos", afirmou.
Sobre a crítica de a Patrulha não ser rápida, a Sesp reforça que o objetivo dela é realizar visitas tranquilizadoras marcadas previamente por vítimas que possuem medidas protetivas em aberto. "O objetivo é dar à vítima a oportunidade de conversar e dizer se ainda sofre ameaças, ou se sente insegura, para que o agressor seja responsabilizado e possa ser preso, por descumprimento da medida. Em casos de flagrante, o 190 deve ser acionado e uma viatura será enviada imediatamente ao local".
Brunela Vincenzi reforça que a violência mais comum, apesar de a agressão física ser a mais propagada, é a psicológica ou moral, que são os constantes atos de humilhação da mulher com comentários depreciativos sobre o corpo dela, conhecimento intelectual e a capacidade para realizar tarefas do lar.
Quanto à violência física, a especialista narra que pode se iniciar com pequenos atos aparentemente inofensivos, mas que vão aumentando em gravidade com o tempo.
A IMPORTÂNCIA DA COMUNICAÇÃO APÓS MEDIDA PROTETIVA
De acordo com recomendação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), "da mesma forma que pode pedir pessoalmente as medidas protetivas, a mulher (ou alguém próximo, parente, amigo) também deve avisar à Justiça quando essas medidas estiverem sendo burladas. Vale ressaltar que o aviso deve ser feito o mais rápido possível, para que a mulher não fique à mercê de um novo episódio de violência. O aviso pode ser feito na delegacia, na vara especializada, na Defensoria Pública, ou mesmo pelos telefones de denúncia (180) ou da polícia (190)".
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"SÓ A MEDIDA PROTETIVA NÃO É SUFICIENTE"
A medida protetiva é considerada por especialistas uma das ferramentas mais importantes de proteção à mulher estabelecida pela Lei Maria da Penha. Apesar disso, em muitos casos, não garante a proteção integral da vítima de violência doméstica. Só a medida protetiva não é suficiente, diz a coordenadora Estadual do Núcleo de enfrentamento às violências de gênero em defesa dos direitos das mulheres (Nevid), Claudia Santos Garcia.
Entre essas medidas, estão a casa abrigo, local que recebe vítimas e é monitorado 24 horas, a Patrulha Maria da Penha, grupo da Polícia Militar que monitora situações de medida protetiva e, até o uso de tornozeleira eletrônica nos agressores.
Claudia explica que a ida para a casa abrigo, por exemplo, a mulher pode requerer tanto na Polícia Civil, quanto no Ministério Publico e nos centros de referência do município. Dependendo da situação, já sai da delegacia para o endereço, que não é divulgado para ninguém. No local, existe vigilância 24 horas. Porém, é apenas uma unidade no Estado e não é informado o número de vagas.
A promotora destaca que é preciso potencializar os serviços oferecidos, e cita o número de determinações de colocação de tornozeleiras eletrônicas. Deve-se pensar em ferramentas integradas, uma vez que de forma isolada são mais fracas.
Um caso que recente no Espírito Santo que mostrou que a medida protetiva ou seu pedido nem sempre garantem a segurança foi o da auxiliar de serviços gerais Maria Madalena dos Santos, de 38 anos. Ela foi assassinada pelo ex-marido com cinco tiros em Jardim Carapina, na Serra, em junho.
Maria Madalena tentou por duas vezes obter medidas protetivas contra ele. A primeira foi pedida no mesmo ano da separação, em 2015, mas foi revogada um ano e meio depois. A segunda foi em maio deste ano, mas o processo até sua morte ainda estava aberto para apuração dos fatos.
MEDO DE REPRESÁLIA
A reportagem conversou com vítimas de violência, as quais preferem não ser identificadas, que lidaram com companheiros agressivos e tiveram dificuldade de sair da situação ou mesmo de procurar ajuda policial e judicial por meio de medidas protetivas, o que reflete o medo que muitas mulheres sentem de represália dos agressores.
Uma delas, já idosa, contou que foram 13 anos de ameaças, agressões físicas e verbais. "Eu sofri muito com a violência doméstica. Meu marido, hoje falecido, me batia, me pegava de faca para matar. Inclusive perdi uma das vistas por agressão dele. Comecei a apanhar dele com 15 dias de resguardo da minha filha mais velha, depois de muito tempo não aguentei mais", confidenciou.
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"Eu era jovem, me casei com 19 anos. Com 26 já tinha quatro filhos porque ele não deixava eu tomar remédio. Ele dizia que mulher tomava remédio para não ter filho e ficar bonita para arrumar homem na rua. Eu era uma jovem velha, que só usava roupa comprida. Uma vez pintei a unha em casa, ele chegou e viu, pegou o canivete, raspou minhas unhas todas e falou que daquela vez ia só raspar as unhas, mas na próxima cortaria as cabeças dos meus dedos. Ele também já pegou faca e corda para tentar me matar. Suportei todo esse tempo porque ele me ameaçava de tomar meus filhos. Um dia ele matou um homem, foi preso, e eu tomei a rédea da situação. Decidi que não voltaria mais, se ele tivesse que me matar, me mataria. Foi até que ele foi morar em Minas, quando tive notícias, ele já estava morto. Chorei de alegria", revelou.
Outra vítima resumiu a situação que viveu com um namorado durante sete meses. A jovem disse que não encontrava forças para pedir ajuda e que só conseguiu contar os episódios para a família depois de dois anos do término do relacionamento.
O RELATO DE QUEM PEDIU POR SOCORRO
Uma dentista de 38 anos, que preferiu não se identificar, solicitou a medida protetiva em junho do ano passado. Esse foi a medida encontrada por ela para tentar se livrar das agressões do marido que foram se agravando ao longo dos anos. Para ela, é uma ilusão pensar que a pessoa pode mudar.
Casada por quatro anos, contou que as agressões começaram ainda no namoro e só pioraram após o casamento e com o consumo excessivo de bebida alcoólica do ex-marido.
Ela conta que ela deu um ponto final na relação após ser agredida na rua. O fato ocorreu após sair com uma amiga para conversar, algo que quase não fazia por ter de cuidar da filha pequena e por ter se afastado das pessoas.
Ao denunciar, ela conta que não foi fácil. Apesar de algumas pessoas apoiarem, outras foram contra. A mulher que mora numa cidade bem pequena no Norte do Estado disse que o trâmite do pedido da medida protetiva até ser concedida judicialmente demorou cerca de um mês. Nesse período sofreu mais uma agressão.
Após a medida ser concedida, ele nunca mais foi agredida, mas continuou, até dezembro, recebendo ameaças pelo celular. Ele fala que vai colocar fogo na casa, fogo no carro. Uma vez chegou a falar que só iria sossegar no dia que me visse com duas moedas de prata em cima dos olhos, ou seja, morta. Ele só parou depois que arrumou outra mulher conta.
COMO FAZER O PEDIDO DE MEDIDA PROTETIVA
De acordo com recomendação da Defensoria Pública Estadual (DPE), qualquer pessoa que presencie situação de violência, pode ir ao Distrito Policial de Atendimento à Mulher do município para fazer o Boletim de Ocorrência e solicitar, se for o caso, medida protetiva de urgência.
Na análise do advogado Miguel, até alguns anos atrás, somente a mulher agredida poderia solicitar medidas. "O STJ decidiu de forma diversa ao que a lei previa e, atualmente, qualquer pessoa pode relatar um caso de agressão a uma terceira, solicitando inclusive as medidas protetivas", explicou.
Em situação de flagrante é possível ligar para o 190 para que a polícia vá até o endereço indicado.
Segundo o Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), o pedido de medida protetiva, realizado por meio da autoridade policial ou do Ministério Público, será encaminhado ao juiz. De acordo com a lei, há o prazo de 48 horas para análise judicial e concessão de liminar.
Para tratar de violência ainda é possível buscar diretamente a Vara Especializada na Justiça, a própria Defensoria Pública, o Ministério Público ou o telefone de denúncia 180.
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Lista de Delegacias Especializadas em Crimes contra a Mulher
Vitória
Horário de funcionamento: 8h às 18h
Endereço: Av. Nossa Senhora da Penha, 2270
Telefone: (27)3227-9410
Vila Velha
Horário de funcionamento: 8h às 18h
Endereço: Rua Luciano das Neves, 430
Telefone: (27)3388-2481
Serra
Horário de funcionamento: 8h às 18h
Endereço: Rua Sebastião Rodrigues Miranda, 49
Telefone: (27)3328-7217 / (27)3328-2869
Cariacica
Horário de funcionamento: 8h às 18h
Endereço: BR 262, Km 03
Telefone: (27)3136-3118
Viana
Horário de funcionamento: 8h às 18h
Endereço: Avenida Levino Chacon, 149, Centro
Telefone: (27)3255-1171 / (27)3255-3095
Plantão especializado da Mulher
Horário de funcionamento: 24h por dia
Endereço: Rua Hermes Curry Carneiro, 350 - Ilha de Santa Maria, Vitória
Telefone: (27)3323-4045
Nova Venécia
Horário de funcionamento: 8h às 18h
Endereço: Av. Vitória, 17
Telefone: (27)3752-6108
Venda Nova do Imigrante
Horário de funcionamento: 8h às 18h
Endereço: Rua 29 de Junho, 1945 - Bananeiras
Telefone: (28) 3546-1124
Linhares
Horário de funcionamento: 8h às 18h
Endereço: Rua José Candido Durão, sem nº, bairro Três Barras
Telefone: (27)3264-2537
São Mateus
Horário de funcionamento: 8h às 18h
Endereço: Rua Eurico Sales, 1221, 1º andar, Bairro Boa Vista
Telefone: (27)3767 8135
Colatina
Horário de funcionamento: 8h às 18h
Endereço: Rua Benjamin Constant, 110, Bairro Marista
Telefone: (27)3177-7121
Cachoeiro de Itapemirim
Horário de funcionamento: 8h às 18h
Endereço: Rua Coelho Melo, 01 - Bairro Ibitiquara
Telefone: (28)3155-5080
Aracruz
Horário de funcionamento: 8h às 18h
Endereço: Rua Padre Luiz Parenze, 1333
Telefone: (27)3256-8186
Itapemirim - Núcleo Especializado de Atendimento à Mulher
Horário de funcionamento: 8h às 18h
Endereço: Rua Coronel Marcondes de Sousa, Centro, Vila de Itapemirim
Telefone: (28) 3529-5184
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