Quando denúncias de violências sexuais vem à tona, como o da filha do pedreiro assassinado na Serra, que relatou ter sofrido abuso por parte do pai dos 3 aos 10 anos, é comum ouvir: "Mas por que não denunciou antes?". Questionamentos como este só reforçam o sentimento de culpa que muitas vítimas já carregam e ignoram um problema que os especialistas chamam atenção: muitas vezes a vítima não entende que sofreu um abuso sexual.
"A gente fala pouco sobre consentimento, sobre limites em relações. Muitas vezes a vítima só compreende que ela foi forçada a algo quando entra em contato com uma violência parecida com a dela", destaca a doutora em Psicologia Forense Arielle Scarpati.
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Se para um adulto já é difícil reconhecer um abuso sexual, imagine para uma criança de 4, 7 anos. De acordo com Arielle, além de não ter maturidade para compreender aquilo como violência, a criança também não sabe o que é permitido fazer com o corpo dela.
O titular da Delegacia de Proteção à Crianças e Adolescentes (DPCA), Diego Aleluia, explica que o agressor constrói uma relação de confiança e afeto com a vítima, dificultando o reconhecimento da violência. É como se ele preparasse o caminho para que o abuso aconteça, fazendo a criança acreditar que ele não faria nada para machucá-la.
"Na maioria dos casos, o abusador é uma pessoa que a criança confia, com quem ela tem um vínculo forte e que dificilmente é quebrado."
CULPA E MEDO
Mesmo quando a criança cresce e passa a compreender aquilo que sofreu como um abuso sexual, denunciar não é um caminho fácil. Além do medo de ser julgada, até mesmo por quem vai acolher aquela denúncia, a vítima também se culpa e envergonha do que aconteceu.
"É um misto de sentimentos. Ela tem vergonha de ser exposta, medo de ninguém acreditar nela, de ser descredibilizada. Com isso, ela passa a se culpar pelo abuso, por não ter reagido, porque ter deixado aquilo acontecer", explica Arielle.
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SILÊNCIO
O silêncio, às vezes, é também uma escolha da vítima. A psicanalista Cláudia Murta, que presta atendimento à vítimas de violência sexual na Grande Vitória, ressalta que falar sobre o abuso funciona como gatilho para muitas pessoas. Por isso, muitas preferem deixar aquela dor adormecer.
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