Um passageiro da linha 518 do Transcol relatou ter sido alvo de intolerância religiosa ao ser agredido por um fiel na chegada ao Terminal do Ibes, em Vila Velha, na noite desta quinta-feira (17). O caso está sendo investigado pela Polícia Civil. A vítima é um servidor público municipal que prefere não ter seu nome divulgado por questões de segurança.
Ao entrar no ônibus, na volta do trabalho, ele percebeu que um outro passageiro fazia pregação religiosa em voz alta. Ao se mostrar contrário ao ato, o servidor foi repreendido por outros passageiros. Para evitar o barulho, mudou de assento e teria então passado a ser perseguido pela mesma pessoa que entoava músicas e falava trechos bíblicos no veículo, que fazia a linha Terminal Carapina- Terminal Ibes, via Serafim Derenzi.
Em seguida, um terceiro passageiro teria batido no ombro do servidor público e dito: "Fica calmo aí, irmão!". "Eu o ignorei, identifiquei que havia uma cadeira vazia ao fundo do ônibus e troquei de lugar. O rapaz que fazia a pregação começou a se movimentar e veio em minha direção. Nesse momento, já exaltado, eu falei: 'Moço tá de sacanagem, né? Você vai vir aqui pra trás agora?' O religioso, assim como da primeira vez, não deu resposta. Apenas repetiu que 'o diabo se manifestava de várias formas, mas que os servos do Senhor não iriam permitir que isso acontecesse", narrou o rapaz.
A partir desse momento, já nervoso, o passageiro incomodado cogitou deixar o veículo, mas temia se atrasar para uma reunião que aconteceria mais tarde, às 19h30. Para tentar se livrar da busca do religioso por ele, preferiu dizer que era satanista e que a religião dele precisaria ser respeitada. Diante do calor da situação, outros passageiros reagiram dizendo que também tinham outra fé e que não eram obrigados a ouvir louvores dentro do ônibus.
Nesse instante de viagem, o trabalhador contou que solicitou ao motorista que interviesse e fizesse alguma coisa, uma vez que dentro do coletivo existem placas informando que não são permitidas a utilização de aparelhos sonoros e perturbação dos demais indivíduos. "Porém, o motorista nem sequer respondeu ao chamado e seguiu viagem."
Ao descer do coletivo, já no terminal, o servidor público foi surpreendido por agressões de um apoiador do religioso. "Fui surpreendido com socos, tapas, puxões e arranhões na parte traseira da cabeça e pelas costas e por chutes na perna. Ao conseguir me virar e entender o que estava acontecendo, identifiquei que a pessoa que me agrediu era a mesma que anteriormente, dentro do ônibus, havia batido nas minhas costas e dito: 'Fica calmo aí, irmão'", afirmou.
Segundo a vítima, os seguranças do terminal nada fizeram para ajudá-lo, nem mesmo acionaram a polícia. Então, o próprio passageiro ferido ligou para o 190, sem que fosse atendido. "Um profissional apenas respondeu que era segurança patrimonial e disse: 'Você tem celular, liga você'. Entrei em contato com uma amiga e com minha madrinha, que conseguiram acionar a polícia e informaram que já estavam indo ao local. Porém, por quase uma hora, aguardei dentro do terminal sem qualquer amparo por parte dos seguranças ou de alguém da equipe de funcionários da Ceturb", acrescentou.
Uma viatura então teria chegado ao local e os agentes teriam dito, segundo o relato da vítima, que não poderiam fazer nada e que o caso deveria ser registrado em uma unidade policial. "Abri então um boletim de ocorrência e realizei exame de corpo de delito, tendo ratificado a ocorrência em delegacia. Agora solicito apoio das imagens internas do coletivo e também do terminal", disse.
Além de informar ter registrado o caso na polícia, o servidor ressaltou que vai acionar a Justiça e buscar reparação pelos danos sofridos.
"Permanece a dor no joelho e na cabeça, dos chutes que levei. Pretendo entrar na Justiça e buscar indenização, pois fiquei por quase uma hora sem receber qualquer auxílio e ainda ouvi do segurança para eu me virar. Houve falha do motorista também, já que eu e outros passageiros solicitamos uma atitude. É inadmissível que precisemos passar por isso voltando do trabalho. Estou vendo uma forma de abrir mão do meu cargo, porque não tenho nenhum emocional para entrar em um ônibus novamente e pegar a mesma linha", lamentou o servidor.
Procurada pela reportagem, a Polícia Civil informou que o fato está sendo investigado por meio do 7º Distrito Policial e que, até o momento, nenhum suspeito de cometer o crime foi detido. Para que a apuração seja preservada, nenhuma outra informação será repassada, complementou a corporação.
Já a Polícia Militar ressaltou, em nota, que houve um chamado registrado pelo Ciodes (190) por volta das 18h40 da última quinta-feira (17). A ligação partiu de uma mulher que informava que o sobrinho havia feito contato com ela dizendo que estava ocorrendo uma confusão no terminal, mas não sabia informar mais detalhes. Segundo a corporação, uma equipe prosseguiu até o local, porém não localizou nenhum dos possíveis envolvidos no momento do fato e nada foi constatado.
Também procurada pela reportagem, a Companhia Estadual de Transportes Coletivos de Passageiros do Estado do Espírito Santo (Ceturb-ES) informou que não foi registrada ocorrência do fato no Terminal do Ibes, mas que a denúncia feita no Disque Ceturb já foi encaminhada para o setor competente para averiguação. A companhia informou ainda que as imagens das câmeras de videomonitoramento ficarão à disposição da polícia para ajudar nas investigações.
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