Da confissão à mudança de versão e a alegação de suicídio, quase oito anos separam a morte da cabeleireira Rosemary Justilo Lopes até o julgamento virtual previsto para esta quarta-feira (8), Dia Internacional da Mulher. Com as atenções voltadas novamente para o diplomata espanhol Jesús Figón Leo, acusado de matar a mulher em Vitória, A Gazeta preparou esta reportagem para explicar o histórico do caso.
O crime aconteceu no dia 11 de maio de 2015, no apartamento do casal, em Jardim Camburi, quando a vítima tinha 56 anos. Na época, Figón era conselheiro de interior da Embaixada da Espanha no Brasil. Ele atuava em Brasília (DF), mas passava alguns dias na residência que tinha com a esposa na Capital capixaba.
Responsável pelo caso, o delegado Adroaldo Lopes explicou, à época, que estava em casa quando recebeu a ligação de um delegado aposentado, amigo do diplomata, relatando o homicídio.
“Esse delegado recebeu um telefonema de Jesús em que ele contava que tinha matado a mulher. De imediato, esse delegado fez contato com um advogado e ambos foram até a casa de Jesús verificar. Chegando ao local, ele adentrou ao imóvel, verificou a presença de um corpo e me telefonou, dizendo que estava indo para a delegacia”, contou Lopes.
À Polícia Civil, o espanhol alegou que a esposa sofria de depressão e era alcoólatra. “(No dia do crime) Ela teria feito excessiva ingestão de bebida alcoólica e, durante a madrugada, eles tiveram uma briga. Ela pegou uma faca para atacá-lo, ele tomou a faca e efetuou os golpes”, disse o delegado na época.
Como mostrou a CBN Vitória, o diplomata se apresentou na manhã do dia 14 de maio de 2015 na Delegacia de Proteção à Mulher (DHPM), em Vitória. Na ocasião, ele confessou ter matado a esposa com cinco facadas.
A imunidade diplomática de Jesús Figón Leo foi suspensa pelo Governo Espanhol. Com isso, o diplomata passou a ser investigado pela Polícia Civil do Espírito Santo.
A prisão preventiva do diplomata, pedida por Adroaldo Lopes, foi negada na época, assim como a cassação do passaporte. Mas, segundo o delegado, o espanhol colaborava espontaneamente com as investigações. Ele acabou indiciado pelo crime de homicídio.
Apesar da confissão inicial dada aos policiais, a versão de Jesús mudou quando o caso chegou à esfera judicial: os advogados passaram a defender a tese de suicídio, segundo o promotor Leonardo Augusto Cezar, em entrevista coletiva do Ministério Público do Espírito Santo (MPES) nessa segunda-feira (6).
Na época, o advogado Jovacy Peter Filho justificou a tese apresentada pela defesa. "A alegação é de que não houve autoria. Infelizmente, a ex-mulher sofria de vários transtornos psicológicos, já havia tentado se suicidar várias vezes. Os primeiros depoimentos dele (Figón) foram sem a presença de um tradutor e isso gerou um problema de interpretação. Da boca dele não saiu absolutamente nada, não houve homicídio nos termos do que foi apontado pelo Ministério Público", afirmou.
Durante o andamento do caso, o passaporte de Jesús chegou a ser confiscado. No entanto, segundo a legislação espanhola, todo cidadão tem direito a cumprir a pena no próprio país. Sendo assim, em dezembro de 2017, a sexta turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) cassou a determinação que obrigava o diplomata a ficar no Brasil até o fim do processo e, desde então, ele vive fora do país.
"O STJ entendeu que, por não haver a renúncia do direito de cumprir a pena na Espanha, a restrição do passaporte seria uma antecipação dessa execução de pena e, por conta disso, foi liberado o passaporte dele. Ele voltou para a Espanha e não sinalizou que viria presencial ao júri", explicou o promotor Leonardo Augusto Cezar.
Se condenado, o acusado pode continuar solto na Espanha, onde mora. O promotor de justiça detalhou que existe na legislação internacional o princípio da reciprocidade, ou seja, se condenado, para que o acusado cumpra a pena na Espanha, a legislação brasileira tem que "espelhar" as leis espanholas.
"Uma coisa que causa preocupação ao MPES é porque há um documento nos autos que foi solicitada a intimação do espanhol a comparecer ao júri por videoconferência no sistema de justiça de lá, mas há um parágrafo dizendo que, no direito espanhol, existe o direito fundamental de estar presente ao ato. Isso pode ser uma sinalização de que não esteja havendo a reciprocidade", explicou Cezar.
"Apesar de ser colocado um link à disposição, de ter sido feito todo um esforço pela Justiça e Estado brasileiro para que ele fosse intimado e quisesse vir ao Brasil, não houve sinalização sobre isso. Então, não sei como isso pode ser interpretado pela legislação espanhola", completou o promotor.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta