Um adolescente já rendido foi baleado e morto por um policial militar na manhã desta quarta-feira (1), no bairro São Geraldo, em Pedro Canário, no Norte do Espírito Santo. Uma câmera de segurança flagrou toda a ação. No vídeo, o suspeito aparece já rendido e mesmo assim é alvo do disparo de arma de fogo à queima-roupa.
Em um primeiro momento, as imagens mostram o rapaz sentado. Depois ele se levanta, parece conversar com o policial e se aproxima de um muro. O PM segue com a arma apontada, até que realiza os disparos. A vítima cai no chão e o policial se afasta.
O rapaz morto foi identificado pela polícia como Carlos Eduardo Rebouças Barros, de 17 anos. De acordo com a corporação, ele tinha passagens criminais e estaria com uma arma antes do momento que aparece no vídeo. Depois de ferido, ele foi levado ao Hospital Menino Jesus, na mesma cidade da ocorrência, mas já chegou morto. No final da manhã, o corpo foi encaminhado para o Serviço Médico Legal (SML) de Linhares, o mais próximo da região.
Segundo a Polícia Militar, o adolescente tem passagens por crimes análogos à tentativa de homicídio, tráfico de drogas, ameaça e posse/porte ilegal de arma.
De acordo com o comandante-geral da Polícia Militar, coronel Douglas Caus, a ocorrência foi iniciada após uma denúncia de que suspeitos em disputa por pontos do tráfico estariam no local, armados, intimidando a população. Cinco policiais em duas viaturas foram até a região.
Ainda segundo o comandante, os suspeitos seriam conhecidos na localidade como "gêmeos". "Naquela região já havia sido cometida uma tentativa de homicídio recente de um adolescente, e há cerca de duas semanas um homicídio", completou Caus.
Apesar de no vídeo parecer que o adolescente estava algemado, o coronel não confirmou esse fato, e disse que "pela visualização do vídeo parece que ele não estava algemado. Quem melhor pode nos falar é o oficial que está lá agora ouvindo os policiais, olhando e analisando os vídeos", salientou.
Os três policiais militares que aparecem no vídeo — um cabo e dois soldados, que não tiveram os nomes divulgados pelo comandante — foram presos e levados para o 13º Batalhão de São Mateus. Assim como outros dois envolvidos no caso. As armas deles também foram apreendidas. Durante a noite desta quarta, eles ainda estavam sendo ouvidos pelo oficial que está registrando o caso.
Os policiais devem chegar no presídio em Vitória durante a madrugada, de acordo com Caus. Na quinta, eles vão passar por audiência de custódia onde será decidido, pelo juiz auditor, se a prisão em flagrante será convertida para prisão preventiva ou qual outra medida será tomada.
No boletim de ocorrência registrado pelos policiais militares, a versão contada por eles foi bem diferente da do vídeo. Na descrição, eles escreveram que "quando o cabo ordenou que se virasse para revista pessoal, o indivíduo colocou a mão na cintura na tentativa de sacar uma arma de fogo, momento em que, para cessar a iminente injusta agressão, efetuou dois disparos com a referida arma em direção ao indivíduo, e que nesse momento visualizou o indivíduo cair no chão com a arma na cintura".
Questionado sobre isso, o comandante disse que "nesse momento, todas as provas estão na mão do oficial que está confeccionando o auto de prisão em flagrante. Ele melhor do que ninguém, que está assistindo aos vídeos, ouvindo os policiais, ouvindo testemunhas, pode enquadrar a tipificação que os indícios estão trazendo". Apesar disso, Caus afirmou que quando um policial escreve na ocorrência algo diferente do que aconteceu, ele está cometendo um crime militar.
Outro ponto diferente do descrito na ocorrência é a questão da arma: apesar de os policiais terem dito que ela foi encontrada na cintura do adolescente após ele ser baleado, Caus declarou que a pistola .40 foi encontrada no terreno da casa antes do suspeito pular o muro e de tudo que é mostrado no vídeo acontecer.
O comandante-geral ainda declarou que "todos os policiais militares têm o enquadramento dentro dos nossos manuais. Enquanto o indivíduo estiver usando a força contra o policial, ali cabe o uso progressivo da lei para cessar a injusta agressão. Essa é uma ação completamente isolada na PM e se acontecer novamente tomaremos as mesmas medidas".
Nas redes sociais, o governador do Estado, Renato Casagrande, se pronunciou sobre as imagens e disse que não condizem com o dever da PM. O governador ainda afirmou que determinou que sejam tomadas as providências imediatas para que o caso seja apurado.
Questionado se os policias militares envolvidos já tinham algum histórico desse tipo, Caus disse que a maioria dos PMs já respondeu a alguma sindicância ou investigação. "Todos os nossos PMs, na sua vida operacional, respondem a diversas sindicâncias e inquéritos porque temos infelizmente um aumento de troca de tiros. Toda ocorrência que gera uma troca de tiros gera uma sindicância. Então é possível que eles estejam respondendo a alguma sindicância e procedimentos administrativos, sim".
Conforme publicado pelo colunista de A Gazeta Leonel Ximenes, o secretário de Segurança Pública, coronel Alexandre Ramalho, se deslocou de helicóptero para São Mateus, no Norte do Estado, para acompanhar pessoalmente o caso. A determinação foi do próprio governador Renato Casagrande (PSB).
O caso de Pedro Canário levantou o debate sobre a utilização de câmeras na farda de policiais militares do Espírito Santo. Sobre o assunto, Caus respondeu que "a PMES tem um setor de estudo de novas tecnologias, busca eficiência e o princípio de legalidade. Temos vários oficiais fazendo estudo desses protocolos. Já tivemos informações de estados que avançaram e tiveram que recuar por problemas no equipamento. Qualquer aquisição que se faça na nossa polícia tem que ter eficiência comprovada e busca pela melhor tecnologia".
O Conselho Estadual de Direitos Humanos do Estado do Espírito Santo (CEDH) pediu o afastamento dos policiais militares que estavam na ação que resultou na morte do adolescente. Por nota, o CEDH afirma que as imagens “mostram claramente a execução do jovem pelos policiais militares, sem qualquer justificativa ou motivo que pudesse justificar tal violência. É inaceitável que agentes do Estado, responsáveis pela proteção da sociedade, ajam de forma tão desumana e arbitrária, violando os direitos mais fundamentais da pessoa humana”.
“Diante desses fatos, o Conselho Estadual de Direitos Humanos exige a instauração imediata de inquérito policial militar para averiguação e investigação de todas as circunstâncias do fato ocorrido, bem como o afastamento preventivo cautelar dos policiais militares das atividades operacionais", completou a nota.
Nesta manhã, em coletiva de imprensa, o coronel Douglas Caus afirmou que são cinco policiais envolvidos no caso: dois cabos e três soldados. Todos foram detidos. Inicialmente, a informação passada por ele, era de que eram apenas três militares. O texto foi atualizado.
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