O mês de junho será decisivo sobre a manutenção ou não do calendário eleitoral de 2020. Com a proximidade do segundo semestre e os dados referentes à pandemia do novo coronavírus no Brasil ainda preocupantes, alternativas estão sendo discutidas na Justiça Eleitoral e no Congresso Nacional. A realização da votação em dois dias ou ainda o adiamento do pleito para o fim do ano estão entre as possibilidades debatidas para as eleições municipais.
O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Luís Roberto Barroso, explicou, em entrevista à GloboNews, que a definição não pode se estender para depois deste mês porque junho é o prazo limite para o início dos testes nas urnas eletrônicas.
A alteração de data de uma eleição precisa, necessariamente, ser feita pelo Congresso Nacional, uma vez que a Constituição determina que o pleito ocorra no primeiro final de semana de outubro. Uma mudança, portanto, só poderia ser realizada por meio de uma proposta de emenda constitucional (PEC).
Já estão em tramitação alguns projetos que sugerem diferentes opções: manutenção da data com novos protocolos, adiamento para o mês de novembro ou dezembro ou ainda a prorrogação do mandato dos políticos eleitos em 2016 para uma unificação com as eleições gerais de 2022. Veja como funcionaria cada opção.
O próprio ministro Barroso admite a possibilidade de realizar as votações em dois dias, em vez de um só, ou estender o tempo de votação até as 20 horas, dando assim um prazo de três horas a mais para evitar aglomeração. Tradicionalmente, as eleições são somente em um domingo, das 8 às 17 horas. O ministro, no entanto, ressalta que a medida teria um custo de R$ 180 milhões a mais para os cofres públicos, gastos com organização e infraestrutura.
Nessa linha de refazer os protocolos para adaptar o pleito à nova realidade imposta pela pandemia, um projeto de lei, assinado pelo deputado federal Mario Heringer (PDT), propõe alterações como votação com horários agendados, limite de 200 pessoas por zona eleitoral e a criação de locais específicos de votação para profissionais de saúde e pessoas com suspeitas ou diagnosticadas com Covid-19. Essas alterações não precisariam ser feitas por emenda à Constituição, uma vez que não alteram a data da votação.
Para o especialista em Direito Eleitoral Danilo Carneiro, a opção até funcionaria, mas apresentaria o risco de "maquiar a democracia". O advogado acredita que a manutenção da data poderia resultar num maior número de abstenção e na presença, em peso, de apenas um tipo de eleitor. "Votaria aquele eleitor que não tem medo, que não se importa com a possibilidade de contrair a doença e excluiria um número grande de eleitores que fazem parte do grupo de risco," disse.
O presidente da Comissão de Direito Político e Eleitoral da Ordem dos Advogados - seccional Espírito Santo (OAB-ES), Fernando Carlos Dilen, a manutenção da data poderia prejudicar candidatos com menos visibilidade política. "A eleição não se resume ao ato de votar. Antes do dia da votação tem uma série de atos, dentre eles a questão das convenções partidárias e o período de propaganda eleitoral", apontou. Com a pandemia, essas atividades que fazem parte da corrida eleitoral podem ficar prejudicadas, atrapalhando na divulgação de todos os candidatos.
Nesta quinta-feira (4), o TSE autorizou a realização das convenções partidárias de forma virtual pelas legendas. A decisão já é um reflexo da pandemia do novo coronavírus. Pelo calendário em vigor, as reuniões em que os partidos definem quem serão os candidatos a prefeito e vereador devem ocorrer entre 20 de julho e 5 de agosto.
Outra opção discutida, e mais aceita pela Justiça Eleitoral, é a de adiar o pleito o mínimo possível. O projeto de emenda à Constituição, proposto pelo deputado federal Pompeo Mattos (PDT), fixa a data do dia 15 de novembro para o primeiro turno e o último domingo do mesmo mês como o segundo.
Na justificativa do projeto, Mattos afirma que "a postergação das eleições para o mês de novembro, mesmo não sendo uma solução ideal, não altera a duração dos atuais mandatos e preserva a normalidade dos mandatos daqueles que serão eleitos". A data limite para o adiamento seria o dia 6 de dezembro, de acordo com Barroso.
Danilo Carneiro concorda que essa seria a decisão menos prejudicial, embora longe de ser o ideal. Alterar a data implica em mudanças em todo o calendário eleitoral e, nessa opção, o prazo entre a eleição e a posse dos eleitos é reduzido, o que pode comprometer o prazo da Justiça Eleitoral para julgamento de recursos contra a diplomação dos eleitos e possíveis decisões que impeçam determinado político de assumir o cargo.
Dilen também vê, pessoalmente, essa opção com mais tranquilidade. Os prazos mais curtos, lembra, vão exigir uma maior carga de trabalho por parte da Justiça Eleitoral, mas o advogado acredita que com a automatização de muitos processos, como foi a própria campanha para regularização de títulos realizada virtualmente pelo TSE, o processo pode ser concluído ainda neste ano.
A opção que enfrenta mais resistência é a de cancelar o pleito deste ano e realizá-lo com as eleições gerais em 2022. Dois projetos que tramitam na Câmara defendem essa alteração. Na justificativa, o deputado federal Sebastião de Oliveira (PL) afirma que "é muito mais importante que o governo disponha do máximo de recursos possíveis para o atendimento à saúde da população do que os partidos para a realização de campanhas políticas" e, por isso, a alteração seria "benéfica em todos os sentidos".
Fábio Ramalho (MDB), deputado autor de outra proposta de mesmo teor, escreveu que a decisão "fortaleceria a democracia, uma vez que as agendas político e ideológicas nacionais, estaduais e municipais poderiam ser sufragadas em processo eleitoral único."
Barroso, que se reuniu com o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM), e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM), afirmou que é unânime a opinião de que essa opção não é aceitável. Durante uma transmissão ao vivo no canal da Associação Brasileira dos Magistrados, realizada no início de maio, o ministro já afirmava ser contra a medida.
"Há um problema democrático. Quem foi eleito em 2016, foi eleito para um mandato de quatro anos e, após esse prazo, os eleitores têm o direito de decidir se reelegem ou trocam os representantes", apontou. Além disso, para Barroso, unificar os pleitos poderia trazer prejuízo à luta pelo voto consciente, uma vez que seriam sete cargos para serem votados. "Com o número de partidos e candidatos que temos, ficaria muita informação para os eleitores votarem de forma consciente", afirmou.
Sobre essa opção Danilo Carneiro é categórico: "Seria o fim do mundo, um caos. Imagine todas as implicações de estender um mandato por dois anos, todo poder que está envolvido". O especialista acredita que a decisão final não será tomada antes do final deste mês, uma vez que esta depende da curva de contágio do coronavírus no país e a leitura dos dados deve ser feita diariamente.
Fernando Carlos também afirma que a OAB do Espírito Santo, enquanto instituição, já se posicionou contra a prorrogação de mandatos. "Na nossa concepção, existe uma ideia de haver um peso e um contrapeso de eleição de dois em dois anos que foi o que o legislador constituinte preferiu quando fizeram a Constituição. Houve a chance de mudar isso durante a última reforma eleitoral, o que não foi feito."
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