Se depender da ala de filiados do DEM no Espírito Santo que se colocam como oposição ao governo de Renato Casagrande (PSB), a sigla terá um candidato ao governo do Estado em 2022 e, de preferência, será o ex-senador Ricardo Ferraço (DEM). Mais alinhados à política da direita bolsonarista, alguns demistas fazem questão de concorrer contra Casagrande e apostam que Ferraço seria um "excelente nome". A vontade, no entanto, teria que prevalecer sobre a ala "casagrandista" da sigla, que tem a expectativa de que os dois partidos caminhem juntos no próximo pleito.
Ferraço mantém uma relação de proximidade com Casagrande. Embora tenha sido membro do governo Paulo Hartung (então MDB) no passado, em 2018 ele caminhou junto com o socialista. Na época tucano, Ferraço fez manobras perigosas para garantir que o PSDB apoiasse a candidatura do socialista, mesmo contra a vontade de importantes nomes da sigla. O movimento foi visto como um grande ato de "fidelidade" e, desde então, fontes ligadas ao chefe do Executivo garantem que todas as movimentações do ex-parlamentar, inclusive a ida para a presidência do DEM, passaram por uma conversa no Palácio Anchieta.
Nome de peso do DEM no Estado, o deputado estadual Theodorico Ferraço, pai de Ricardo, busca uma postura a qual define como "independência e não oposição", votando favoravelmente aos projetos do governo, mas fazendo críticas quando acha necessário. Ou seja, Theodorico não é oposicionista, mas não existe por parte do "velho Ferraço" uma lealdade a ser respeitada em relação a Casagrande. Para A Gazeta, o parlamentar negou que haja articulações para emplacar a candidatura do filho, mas não negou que o partido tenha interesse de lançar um candidato ao governo.
"Isso é outra história, é papo para outra hora. Estamos focados no combate à pandemia, é a prioridade número um. Até o momento, o que existe é que Ricardo vem para o DEM para fortalecer o partido, mas não acho que seja momento de discutir candidatura para nada", afirmou.
O afilhado político dele, no entanto, é taxativo. Diego Libardi (DEM), que presidiu a sigla no Estado por alguns meses, quando a deputada federal Norma Ayub (DEM) se afastou da liderança para se preparar para concorrer à eleição de 2020, deixa claro o posicionamento: é oposição a Casagrande e "fará de tudo" para que a sigla também tenha uma candidatura de oposição.
"Se ele quiser ser candidato, todos os democratas vamos ficar felizes e apoiar. O fato de Ricardo ter uma boa relação com Renato não o impede de disputar. Eu sou oposição ao Casagrande, vamos fazer todo o possível para que o DEM tenha candidatura e o nome do Ricardo é excelente", apontou.
Libardi, que trabalhou no governo Bolsonaro como superintendente regional do Ibama, tem adotado um tom cada vez mais crítico a Casagrande nas redes sociais. Questionado sobre quais outros partidos e nomes os democratas deveriam priorizar nas negociações, citou MDB, PSDB e, "até mesmo", Carlos Manato (sem partido), uma das lideranças bolsonaristas no Estado.
O DEM é, historicamente, um partido mais à direita no espectro político. Embora se posicione de forma mais tímida, a deputada federal Norma Ayub tem o perfil de votação mais conservador, acompanhando o partido. Presidente da sigla na Capital, o ex-vereador Clebinho Félix segue a mesma linha.
Durante o tempo que presidiu a Câmara de Vitória, Clebinho tinha uma guerra travada contra o ex-prefeito Luciano Rezende (Cidadania) e a base aliada dele na Casa. Embora não se posicionasse fortemente contra Casagrande, teve uma atuação marcada pelo conservadorismo, priorizando pautas como tornar igrejas atividades essenciais durante a pandemia e flexibilizar a abertura de comércio não essencial durante a vigência de medidas de restrição, determinadas pelo governo do Estado.
Nas eleições de 2020, o DEM de Vitória apoiou a candidatura de Lorenzo Pazolini (Republicanos), ficando ao lado, também, do MDB. Clebinho quer que a sigla tenha candidato e também "vê com bons olhos" o nome de Ricardo Ferraço. "A relação deles (Casagrande e Ferraço) é ótima. Mas projeto político é projeto político. Acho que o DEM tem que ter candidato sim e o Ricardo seria um excelente nome", opinou.
As lideranças democratas mais aliadas a Casagrande e fontes ligadas ao PSB, no entanto, duvidam muito que Ferraço aceitaria se candidatar. A intenção desses atores políticos é que os dois partidos caminhem juntos, essa seria, inclusive, uma das articulações por trás da mudança partidária de Ferraço.
"Eu não acredito em uma candidatura dele sem ter uma conversa muito clara com o governador. Isso é uma conversa de bastidor, movimentação do partido. Pela relação que os dois têm de muito tempo. Não houve recentemente nenhum racha, nenhum desconforto, ele passou por aqui (Palácio Anchieta) para conversar sobre a ida para o DEM. Não acredito, a não ser que faça parte de um acordo maior", afirmou um socialista.
O presidente do PSB no Estado, Alberto Gavini, diz que é natural que os partidos comecem a especular e articular, mas que, para a sigla, não existe cenário possível sem ser a reeleição de Casagrande. "Eles têm uma relação muito boa, eles se entendem bem. Essa movimentação de mercado é natural, não tem nada estranho. Ricardo é um excelente político, mas hoje o nosso processo é a reeleição do Casagrande, qualquer outra conversa não tem nenhuma entrada no diretório estadual", disse.
Presidente do DEM em Cariacica, cidade em que o DEM elegeu um prefeito com o apoio indireto de Casagrande, Nilson Teixeira reafirma a fidelidade do diretório municipal ao socialista. "Para nós aqui só existem dois possíveis candidatos ao governo. Casagrande ou a pessoa a quem Casagrande apoiar", assinalou. Quanto a Ferraço, Teixeira acredita na candidatura ao Senado ou mesmo compondo a chapa como vice, "caso seja do interesse dele".
Ricardo Ferraço foi procurado pela reportagem por três dias consecutivos, por meio de ligações e mensagens. Até a publicação deste texto, no entanto, não houve retorno.
Ferraço e Casagrande andaram juntos em 2018 e mantêm uma relação de aliança, mas nem sempre foi assim. Entre os dois políticos existiu uma ferida, feita na eleição de 2010, que ficou conhecida como "abril sangrento". Na ocasião, Ferraço era vice-governador de Paulo Hartung e se preparava para substituí-lo no posto. Mas, em uma reviravolta articulada pelo próprio Hartung, foi substituído por Renato Casagrande na candidatura. Acabou se contentando com uma candidatura ao Senado.
Depois, em 2014, Ferraço deu a entender que apoiaria a reeleição de Casagrande, mas acabou apoiando Hartung. A situação mudou apenas em 2018, quando conseguiu levar o PSDB a apoiar o socialista mesmo tendo que ir contra a palavra de muitos caciques do ninho tucano que queriam a volta de Hartung ao governo.
Atores políticos apontam que tanto o DEM quanto o MDB passaram por uma desidratação nos últimos anos, com uma debandada de prefeitos se filiando a outros partidos, em sua maioria ao PSB de Casagrande. Liderança com trânsito na política do Sul do Estado não duvida que Ferraço se juntaria à "turma de Hartung" novamente. "Não podemos esquecer que por mais que ele tenha um bom relacionamento com Casagrande, também nutre uma ligação com PH", disse.
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