A aprovação de um projeto de resolução que estabelecia a redução do número de assessores que cada vereador da Câmara de Vitória poderia ter foi anunciada com pompa e circunstância em maio, ainda antes, portanto, das eleições municipais. Sete meses depois, o texto não havia sido publicado e, após o alerta dado pelo colunista Vitor Vogas, os parlamentares começaram a se mexer. Mas o desfecho não foi o esperado: o projeto acabou arquivado.
Alguns vereadores que se mostraram entusiasmados com a ideia em maio agora silenciam, como Davi Esmael (PSD), cotado para ser o próximo presidente da Casa. E coube ao atual presidente, Cleber Felix (DEM), sepultar o texto. Clebinho endossou o projeto e comemorou em maio, mas nesta quinta-feira (17) apontou problemas na tramitação e, contrariando o plenário, decidiu sozinho pelo arquivamento. A manobra é juridicamente discutível, mas coautores do projeto não pretendem acionar a Justiça.
Em nota, Clebinho afirmou que segue um parecer do procurador da Casa, que diz que uma das emendas aprovadas no texto seria ilegal.
A redação original reduzia de 15 para 10 o número de assessores de cada parlamentar. A emenda substitutiva em questão, apresentada por Max da Mata (Avante) e outros seis vereadores, reduziu de 15 para oito. Questiona-se a validade da emenda, uma vez que, de acordo com o regimento interno, propostas que alterem a estrutura da Casa precisam partir da Mesa Diretora.
O questionamento, no entanto, não é de agora. Durante a sessão de votação da matéria, os parlamentares passaram mais de duas horas debatendo se a emenda substitutiva seria ou não ilegal, por não ter sido proposta pela Mesa. E, por fim, o plenário entendeu que não haveria problema. O projeto foi, então, aprovado por maioria: oito votos a favor, quatro contra e uma abstenção. O vereador Deninho Silva (Cidadania), não estava presente na sessão.
Faltava apenas a redação final, delegada a vereadores que votaram contra, e a publicação da proposta. O que nunca ocorreu.
Os maiores beneficiados são os vereadores que assumem em 2021. Nenhum dos 15 tanto os 10 novatos quanto os cinco que se reelegeram vai precisar diminuir o número de assessores. Até mesmo pessoas indicadas pelos vereadores derrotados nas urnas podem ser indicadas para as vagas, que são para cargos comissionados, de livre nomeação e exoneração.
Ou seja, a resolução foi proposta, aprovada, divulgada pelos parlamentares, comemorada pela sociedade e pela imprensa, mas nada mudou.
"Não há, em toda a história da Câmara, outro projeto em que isso tenha acontecido. Eu nunca vi nada igual em três mandatos", protestou o vereador Max da Mata (Avante). Ele aponta que o texto já havia passado por todas as comissões e as questões a respeito da legalidade da emenda teriam sido exaustivamente discutidas. "O que eu estou vendo é uma articulação política da Mesa e vereadores que não querem ver o projeto ser publicado para que ele tenha validade na próxima legislatura", completou.
Roberto Martins (Rede), um dos parlamentares que assinou tanto o projeto inicial quanto a emenda de Max, também se diz indignado com a decisão. Ele ressalta que "o plenário é soberano" e que o presidente, sozinho, "não tem poder de reverter uma decisão votada pela maioria dos vereadores". "Estão inventando desculpas, é manobra mesmo, não tem para onde correr. O presidente está agindo como juiz e ainda colocando na conta do procurador, sendo que o procurador deixou claro que o parecer é opinativo", destacou.
Um dos que questionou a legalidade da emenda durante a sessão de votação foi Mazinho dos Anjos PSD), que assina o projeto inicial com Roberto Martins (Rede). Em certo momento da discussão ele chegou a prever o que acontece agora. "Estou com medo de a Mesa Diretora questionar a legalidade dessa emenda depois", disse, durante a votação, em maio. Ainda assim, foi um dos que votou a favor da redação completa logo em seguida.
Procurado pela reportagem, o parlamentar foi mais brando nas críticas, mas questionou a decisão de Clebinho. "O presidente se equivocou muito no despacho. Ele não seguiu o rito ordinário e regimental do processo legislativo. A proposição original estava aprovada e deveria ter sido elaborada sua redação final para apresentação", apontou.
Nenhum dos três, no entanto, pretende fazer algo a respeito. Uma saída seria entrar com um mandado de segurança para que a Justiça avalie a conduta de Clebinho ao arquivar a matéria. Os vereadores alegam, no entanto, que estão no final do mandato e, por isso, a partir de janeiro, perderão a legitimidade de parlamentares para impetrar o mandado. "Tem custas o processo, uns R$ 500. E a partir do dia 31 de dezembro nós perdemos a legitimidade", aponta Mazinho.
O vereador pondera que uma das possibilidades seria levar a emenda ao plenário, novamente, após a produção da redação final. "Estou vendo ainda se um ato administrativo poderia reverter. O presidente poderia ter levado a redação final para ser discutida novamente no plenário e, se fosse o caso, a emenda ser arquivada", pontuou.
Davi Esmael (PSD), reeleito e cotado para ser presidente da Casa nos próximos dois anos, foi o autor de uma outra emenda que também foi incorporada ao projeto. Ela previa que 50% dos assessores contratados tivessem ensino superior. A emenda dele foi alvo de muitas críticas por parte de alguns parlamentares, que afirmaram que a medida "exclui pessoas" e cria "regras inconstitucionais" para o exercício parlamentar.
Durante a sessão de votação, em maio, Davi defendeu fortemente a proposta e comemorou a aprovação da redação que incluía as emendas. Agora, curiosamente, é apontado nos bastidores como um dos entusiastas do arquivamento. Há mais de duas semanas o vereador tem sido procurado pela reportagem de A Gazeta, mas não atende a imprensa.
O vereador Leonil (Cidadania) se absteve por não concordar com a emenda apresentada por Davi Esmael.
No dia da votação, em um prazo de três horas, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara de Vitória emitiu um parecer pela inconstitucionalidade do projeto, porque a emenda que configurou o texto não partiu da Mesa Diretora. O parecer foi contestado por Max da Mata, revisto pelo plenário e o projeto, aprovado.
Depois da aprovação passaram-se três meses até que o texto fosse encaminhado ao então relator, Dalto Neves (PDT), para a elaboração da redação final. Foi apenas no dia 9 de dezembro, após a Câmara ser "lembrada" pelo colunista Vitor Vogas de que o ano terminaria sem a publicação da resolução, o que inviabilizaria que ela entrasse em vigor já em 2021, que o texto voltou ao centro das atenções. Depois de mais de 92 dias com a proposta em mãos, Dalto Neves pediu "calma".
O pedetista foi um dos vereadores que votou contra a proposta e fez discursos calorosos no plenário durante a votação. Disse, na ocasião, que "se arrependeu de assinar a emenda com Max" e que "pelo fim da demagogia na Câmara" votaria não. Agora, em dezembro, a proposta saiu da mão dele para chegar ao gabinete de Luiz Paulo Amorim (PV), que também votou contra o projeto em maio.
Amorim teria o prazo de 10 dias para fazer a redação final, que ainda seria submetida ao plenário antes da publicação, o que, tradicionalmente, é protocolar. Em vez disso, pediu um parecer para a procuradoria da Casa, que voltou a falar no "vício de iniciativa" da emenda substitutiva, que ela deveria ter sido proposta pela Mesa Diretora.
A redação final nunca foi feita. Amorim nega ter protagonizado uma manobra protelatória. "É para isso que tem o prazo, eu tinha um prazo para fazer a redação final e por isso consultei a procuradoria", afirmou.
Com base no parecer da procuradoria, que apontava o que já havia sido dito desde maio, o presidente da Câmara, Cleber Felix, arquivou, por conta própria, o projeto que havia sido aprovado pelo plenário.
A reportagem tentou, sem sucesso, contato com Clebinho e Dalto Neves.
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