Os trabalhos na Assembleia Legislativa após o recesso parlamentar voltaram nesta quarta-feira (1º), mas se o desempenho neste novo semestre legislativo ficar no mesmo ritmo do que esteve na primeira metade do ano, é possível que não haja um resultado expressivo em termos de discussões e votações, já que vão se iniciar as campanhas eleitorais.
De fevereiro a junho foram realizadas 68 sessões ordinárias. No entanto, 18 delas caíram por falta de quórum, ou seja, por não terem o número mínimo de 10 deputados, um terço do total, presentes no plenário, ou seja, 26,4%. Isso significa que a cada 4 sessões, uma foi encerrada por este motivo, de acordo com levantamento feito pelo Gazeta Online.
A sessão desta quarta, inclusive, pode ser um indicativo do que ocorrerá até outubro. Com pouco mais de uma hora, cinco deputados permaneciam no plenário, o que fez a sessão ser derrubada.
Entre as sessões que caíram no primeiro semestre, 66% não chegaram ao ponto de ter nenhum tipo de votação, visto que caíram logo após a fase das comunicações, e antes de iniciar a ordem do dia. Nesta quarta, também foi desta forma.
A ordem do dia é a fase mais importante da sessão, pois é nela que ocorrem as discussões e votações das proposições. Cabe ao presidente da Assembleia escolher e incluir os projetos que farão parte da pauta.
De acordo com o Regimento Interno da Casa, há um quórum mínimo de deputados para cada tipo de atividade. Tanto para iniciar uma sessão, quanto para mantê-la, é exigido que haja pelo menos 10 dos 30 parlamentares no plenário.
No entanto, não é raro que os deputados registrem a presença no painel, permaneçam no plenário por alguns minutos, e saiam para atender outras demandas, muitas vezes nas salas anexas ou no próprio gabinete.
Assim, após menos de uma hora de iniciadas, as sessões contam com poucos gatos-pingados presentes, embora o painel eletrônico diga o contrário.
PRÁTICA
A prática não é exclusividade da Assembleia, e pode ser vista em todo parlamento, desde a esfera municipal até a federal. E muitas vezes ocorre de forma intencional e coordenada, para obstruir determinadas votações.
Em caso de projetos polêmicos, um determinado grupo político pode esvaziar a sessão, para que não haja o quórum mínimo obrigatório para votar aquele texto.
Para aprovar projetos que tenham votação nominal, ou seja, a que há o registro de cada voto como em casos de Lei Complementar , é necessária a concordância da maioria simples, ou seja, de metade mais um, portanto 16 deputados. Já a proposta de emenda à Constituição (PEC) exige três quintos do total, que são 18.
Contudo, segundo os próprios deputados, as sessões deste ano não foram derrubadas por obstruções a projetos da pauta, e sim porque os parlamentares foram se dedicar a outras atividades.
Os pedidos de recontagem de quórum já ocasionaram, muitas vezes, divergências entre os deputados estaduais.
Sergio Majeski (PSB) foi quem mais fez este tipo de requerimento, responsável pela metade do total. Na sessão do dia 9 de maio, por exemplo, foi questionado por Freitas (PSB).
"São 10h34 e a sessão precisava ser até as 12 horas para cumprir a hora regimental dela; não entramos na ordem do dia ontem, não entramos na ordem do dia hoje. Penso que se viemos aqui, pelo menos temos que ficar até a hora que puder para falar", disse.
E Majeski rebateu: "O regimento é muito claro: se não tiverem 10 pessoas aqui, a sessão não pode se manter. E no painel constavam 24 deputados presentes. A sessão não podia continuar com 24, porque os projetos iam ser votados de acordo com o painel. Eu não tenho interesse nenhum de derrubar a sessão".
Majeski explicou por que pediu tantas recontagens. "A maior parte das votações é de leis ordinárias, por aprovação simbólica, e não nominal. Então, aprova-se de acordo com o que está no painel, o que é uma mentira. É claro que o trabalho de um deputado não é só na sessão. Mas é nossa obrigação estar lá. Não tem que marcar compromissos paralelos neste horário", defende.
O deputado Enivaldo dos Anjos (PSD), 2º secretário da Mesa Diretora e que costuma presidir sessões, é contra a derrubada dos trabalhos por este motivo. Ele chegou a apresentar um projeto para alterar o quórum mínimo de 10 para três deputados.
"A Assembleia deveria ter três horas obrigatórias de sessão. Não precisaria derrubar a sessão, é só não apreciar matérias. Há exagero. Tem gente que está na antessala do plenário, e é considerada ausente", disse.
Por meio de nota, o presidente da Casa, Erick Musso (PRB) disse que, desde a primeira sessão do ano, "sensibilizou os deputados sobre a importância de comparecerem às sessões ordinárias, principalmente por ser tratar de ano eleitoral". No entanto, frisou que a responsabilidade da presença é de cada parlamentar.
Para analistas, debate fica em segundo plano
A ausência dos parlamentares durante as sessões plenárias podem demonstrar como hoje, contraditoriamente, o Poder Legislativo, considerado o mais político entre os três, tem falhado em exercitar justamente a política, na visão de especialistas.
Encumbidos de representar os interesses do povo e o jogo de forças que há na política, os números mostram que as sessões têm sido usadas mais para pronunciamentos individuais, deixando os debates em segundo plano.
"Se há um número tão grande de sessões caindo antes mesmo da época de campanha eleitoral, aparenta que não há nada de ruim acontecendo no Estado, ou que a nossa representação não tem contato com a sociedade, não discute possibilidades de políticas públicas", comenta o historiador e membro da Transparência Capixaba, Rafael Cláudio Simões.
Ele ressalta que mais do que considerar a presença em plenário, é importante verificar o que foi produzido de relevante nas sessões que duraram até o fim.
E neste período de fevereiro a junho, de acordo com dados do portal da Assembleia Legislativa, foram aprovadas 63 Leis Ordinárias, sendo 24 delas de autoria do governo do Estado. Houve ainda duas Leis Complementares e 77 Decretos Legislativos, todos eles para a concessão de Títulos de Cidadão Espírito-Santense a personalidades.
"Um ponto que contribui para isso é que o Legislativo estadual pode produzir poucas leis, efetivamente, pois a maioria dos temas é de competência da União. Mas mesmo assim, os debates não são feitos. E não é por falta de estrutura, pois eles têm assessores, recursos financeiros, tecnológicos", destaca Simões.
ELEIÇÃO
Nas eleições de 2016, 18 das 21 sessões da Assembleia foram derrubadas na época da campanha eleitoral para prefeitos, em que 12 dos 30 deputados eram candidatos. Isso significou 81% das sessões derrubadas, e um acúmulo de 44 itens na pauta.
O doutor em Ciências Sociais Vitor de Ângelo aponta que na campanha que se aproxima, o resultado pode ser ainda pior, considerando que praticamente todos serão candidatos, e que haverá uma campanha mais curta.
"A população e os órgãos de controle devem ficar atentos ao que é agenda de deputado e o que é de candidato. Tudo isso representa um custo para o Legislativo, pois eles são eleitos para quatro anos, e não para três anos e meio", frisou.
O QUE ACONTECE NAS SESSÕES
Quórum
O que é
É a quantidade mínima obrigatória de membros presentes ou formalmente representados, para que uma assembleia possa deliberar e tomar decisões válidas.
Sessões da Assembleia
Abertura de sessão
Dez dos 30 deputados devem ter registrado a presença no painel.
Manutenção da sessão
A qualquer momento da sessão, qualquer deputado pode pedir a recontagem do quórum. A sessão só continua se houver pelo menos 10 presentes.
Tipos
A recontagem de quórum só ocorre em sessões ordinárias ou extraordinárias, que são aquelas deliberativas, ou seja, quando há votações. Sessões especiais ou solenes não têm esta possibilidade.
Votações
Simbólica
Ocorre nos Projetos de Lei Ordinária, por exemplo, quando não há o registro nominal de quem votou contra ou a favor. O quórum levado em consideração é de acordo com as presenças registradas no painel. O presidente convida os deputados a favor a permanecerem sentados e proclama o resultado manifesto dos votos.
Votação nominal
Em Projetos de Lei Complementar, por exemplo, é preciso a aprovação de 16 dos 30 parlamentares. Já para a Proposta de Emenda à Constituição (PEC), são 18 votos.
Fases
Expediente
Momento em que é lida a ata da sessão, os projetos e pareceres protocolados.
Fase das Comunicações
Momento em que os deputados discursam livremente, por cinco minutos cada um.
Ordem do dia
Fase que contém os projetos de lei e outras proposições, dos parlamentares e do Poder Executivo, que serão votados na sessão. Pode incluir também vetos do governador.
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