O prefeito da Serra, Audifax Barcelos (Rede), e três membros do alto escalão no município são alvo de uma ação civil pública por ato de improbidade administrativa oferecida à Justiça pelo Ministério Público do Espírito Santo (MPES), por suspeita de uso político da prefeitura da cidade. De acordo com o órgão ministerial, foi demonstrado, durante a investigação, que a gestão de Audifax cometeu desvio de função na nomeação e na lotação de cargos comissionados, construindo um esquema de loteamento como moeda de troca política.
Na ação, apresentada à Justiça nesta quarta-feira (9), o MPES aponta que haveria um "esquema de corrupção para fins de manutenção da governabilidade", que tem como base uma lei municipal que criou 329 cargos comissionados em 2001, sem especificar a função dessas vagas, dando margem, a partir daí, para o loteamento da prefeitura.
Esse era o número disponível que os gestores tinham, ainda de acordo com o Ministério Público, para acomodar aliados. A mesma lei foi alterada em 2009, mas, novamente, não atendeu aos princípios constitucionais e não trazia no texto a finalidade dos cargos criados.
A sanção da lei e sua alteração se deu em períodos que Audifax não era prefeito, quando a Serra era governada por Sergio Vidigal (PDT). No entanto, o MPES cita apenas contratações em troca de apoio político na gestão do redista.
Os secretários municipais Cristiane Stem e Jean Carlo Cassiano e a assessora especial de governo Viviane Meneghelli também são alvos da ação. Procurada, a Prefeitura da Serra informou que não foi notificada da ação e que as nomeações dos cargos comissionados estão em conformidade com a Constituição Federal.
"A razão do desvio e da ilegalidade na gestão de cargos comissionados neste município é a prática do abuso do poder político, consistente no loteamento de cargos comissionados como moeda de troca eleitoral e de governabilidade em detrimento dos critérios de interesse público e de autonomia entre os poderes Executivo e Legislativo e a sociedade civil", descreve o texto da apresentação da ação de improbidade.
Hoje, conforme o Portal da Transparência da Prefeitura da Serra, há 302 servidores comissionados lotados na função, cujo nome exato é "assistente técnico CC05", com salário bruto de R$ 1.581,82, sendo que alguns recebem até R$ 7.381,82, a depender das gratificações de cada comissionado. A partir dos depoimentos dos próprios servidores, o Ministério Público diz que os cargos de assessoria técnica, na prática, são de pessoas que trabalhavam como motoristas, recepcionistas e auxiliares administrativos.
A ação ainda indica que o prefeito condicionava a prestação de serviços públicos ao apoio ou não de lideranças comunitárias ao governo dele.
Situação semelhante foi mencionada pelo então candidato a prefeito e vereador da Serra, Fabio Duarte (Rede), apoiado por Audifax, em entrevista para A Gazeta, em novembro. Ele afirmou que "não concordava com tudo o que o prefeito fazia", citando que o prefeito não limpava bairros em que o presidente da associação de moradores não fosse aliado.
"O abuso do poder político também se perfaz na administração de prioridades e disponibilização de serviços para as comunidades de bairros do município de Serra. Eis que surgem dos relatos tomados nessa investigação que a questão político-eleitoral interfere na oferta e rapidez de prestação de serviços públicos municipais a determinadas comunidades", descreve a ação apresentada pelos promotores da 13ª e da 3ª Promotorias Cíveis de Serra.
O Ministério Público pede à Justiça a condenação dos quatro citados por improbidade administrativa, com a perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos. Outra solicitação é que seja declarada a inconstitucionalidade parcial das leis municipais 2.368/2001 e 3.448/2009, que dispõem sobre a modalidade de cargo comissionado contestada.
De acordo com o Ministério Público, o atual secretário de Agricultura da Serra, Jean Carlo Cassiano, que também é ex-presidente da Federação de Associações de Moradores da Serra (FAMS), é apontado como "operador do esquema no movimento popular". Jean foi presidente dos diretórios municipais do MDB e do Republicanos na Serra e também foi secretário adjunto de Direitos Humanos e Cidadania no município, entre março de 2019 e maio deste ano, antes de assumir a pasta da Agricultura.
"O ora requerido Jean Carlo Cassiano, a quem competia parte da oferta de cargos e contribuições de amortecimento e controle de movimentos contestatórios da oposição nas comunidades e bairros, tendo em vista que este ocupava e ainda ocupa a função de Presidente da Federação das Associações de Moradores de Serra (FAMS)", relata a ação.
Outras integrantes do primeiro escalão de Audifax denunciadas pelo Ministério Público são a secretária municipal de Habitação, Cristiane Stem, e a assessora especial da coordenadoria de governo Viviane Meneghelli, descrita nos bastidores como braço-direito de Audifax na administração.
Para o Ministério Público, as duas agiam no papel de articuladoras e gerenciadoras no loteamento de cargos, conforme orientação do prefeito. Muitas dessas vagas eram preenchidas por indicação de vereadores, em troca de apoio político, aponta a ação. Em depoimentos colhidos e descritos pelo órgão ministerial, há relatos de indicações de emprego em empresas terceirizadas contratadas pelo município.
A prática de nepotismo é em razão da nomeação de um sobrinho de Viviane, chamado Sergio Meneguelli Rocha, que atuava como diretor do Procon da Serra, e a irmã da assessora especial, Yara Costa Meneguelli (mãe de Sergio), foi gerente da Maternidade de Carapina.
A irmã de Cristiane Stem, Ana Paula Stem, atuava no município como chefe de Regularização e Legalização Fundiária, assim como o sobrinho da secretária, João Lucas Machado Stem, nomeado como assistente técnico na Secretaria de Serviços e Recursos Humanos.
Por nota, a Prefeitura da Serra informou que não foi notificada da ação e que as nomeações dos cargos comissionados estão em conformidade com a Constituição Federal. A administração municipal ressaltou, ainda, que a ação questiona a constitucionalidade de leis municipais de 2001 e 2009, as quais não foram feitas pela administração do prefeito Audifax Barcelos.
Disse, também, que a Prefeitura da Serra, sob o comando de Audifax, "é considerada a gestão mais transparente do Brasil e que lidera os investimentos públicos no Estado do Espírito Santo, o que demonstra que os critérios de nomeação dos cargos comissionados são eficientes e com resultado para a população".
A reportagem também procurou os outros alvos da ação do MPES, mas foi informada que o posicionamento era a nota da prefeitura.
A denúncia foi encaminhada para a Vara da Fazenda Pública Municipal da Serra, que fica na comarca de Vitória. A partir de agora, a Justiça deve notificar os citados para se manifestarem sobre as acusações. O magistrado vai decidir, em um prazo de 30 dias, se aceita ou rejeita a ação, considerando se há indícios suficientes para dar início ao processo.
Se a Justiça aceitar a ação, Audifax e os outros três acusados se tornam réus por improbidade administrativa. Se condenados em primeira e segunda instância, terão os direitos políticos suspensos por três a cinco anos.
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