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'Bolsonaro pode fazer um partido em um mês e meio', diz criador de 7 siglas

"Bolsonaro pode fazer um partido em um mês e meio", diz criador de 7 siglas

Em entrevista, Marcílio Duarte Lima, o advogado que já criou sete partidos políticos no Brasil, incluindo o PSL, avalia as condições do presidente da República de erguer uma nova sigla antes das eleições de 2022

Publicado em 10 de novembro de 2019 às 07:00

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Marcílio Duarte Lima é advogado e especialista na criação de partidos. (Divulgação)

Aos 78 anos, o carioca Marcílio Duarte Lima pode ser considerado um perito no que diz respeito à criação de partidos políticos. Ao longo dos últimos 30 anos, o advogado trabalhista ergueu nada menos que sete siglas brasileiras, incluindo o PSL, de Jair Bolsonaro. Seu vasto conhecimento da burocracia eleitoral é o que lhe permite cravar com tranquilidade que se o presidente da República de fato decidir criar um novo partido - como indicou recentemente -, ele teria condições de fazê-lo em até um mês e meio.

PSL, PGT, PTN, Prona, PTR, PSC, PST e, mais recentemente, o Solidariedade (do qual é filiado) compõem a lista de siglas que Marcílio ajudou a erguer. Em sua carreira política, iniciada ainda na década de 1980, o advogado não obteve tantos êxitos. Apesar de já ter sido vereador, entre 2004 e 2014 ele concorreu duas vezes a deputado federal, duas a prefeito e mais uma a vereador na cidade de Mairinque, onde vive hoje no interior de São Paulo. Em nenhuma delas foi eleito.

Por outro lado, os anos com pés fincados na política o tornaram não só um observador de longa data dos bastidores de Brasília, como também figura conhecida no meio. Lembra-se, por exemplo, das articulações que levaram o PST a fazer parte da coligação de Fernando Collor (então do PTN), nas eleições de 1989. Ou de quando abriu mão da presidência do próprio PST para que Álvaro Dias, hoje senador pelo Podemos, conquistasse fôlego para uma possível disputa presidencial na época.

Em uma conversa de cerca de 40 minutos fica claro que Marcílio é um entusiasta das siglas. Mas isso não o impede de reconhecer a necessidade de mudanças legislativas que fortaleça a democracia dentro dessas instituições. “Os partidos têm donos, não são dos políticos”, critica ele em entrevista ao site A Gazeta. Confira:

Para concorrer em uma eleição, um partido político deve estar registrado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) faltando no mínimo seis meses para a eleição. Dá tempo de Bolsonaro criar um novo partido até o início de 2022?

  • Sim. Só existem dois segmentos hoje capazes de criar um partido no Brasil: um líder nacional forte, como é o caso de Bolsonaro, e as igrejas. Tanto que o (bispo evangélico) Edir Macedo fez o PRB. Mesmo para os movimentos sindicais eu vi como é difícil de se fazer. O grande empecilho para Bolsonaro seria a coleta das assinaturas. Mas ele tem um forte esquema. Todos os candidatos que foram eleitos através dele podem acionar sua comunicação para atuarem como coletores nos Estados. Os dois grandes pressupostos para organizar um partido hoje são conseguir mais de 570 mil assinaturas (número de apoiamentos estabelecidos por lei para a abertura de um partido, que correspondem a 0,5% do total de eleitores que votaram na última eleição) e que isso seja feito em ao menos nove Estados. Mas abrir partido é 5% uma questão política e 95% uma questão jurídica. Hoje é muito mais fácil do que antigamente. Hoje se faz tudo sem a presença da Justiça e depois se leva as coisas à Justiça. Antigamente os observadores dos Tribunais eram colocados para acompanhar a gente em tudo. Era uma loucura. Mas, ainda assim, a forma de conseguir essas coletas é que pode ser um impedimento. Ele tem que cumprir as exigências. A lei exige certas celebrações que as pessoas pensam que não vai ter problema se não cumprir. Tivemos dois ou três partidos que não conseguiram o registro, como o Muda Brasil e o Corintiano. Então, se ele tiver gente competente pra fazer o partido, ele faz. Isso inclui um bom advogado da área. E há muitos.

É um processo caro?

  • Não é caro, para ele é baratíssimo. Se tiver uma organização central boa, ele consegue fazer isso em um mês e meio. Nós fizemos o Solidariedade em oito meses com muito esforço. Kassab (Gilberto Kassab, ex-prefeito de São Paulo) fez isso em dois anos e nove meses. Marina (Marina Silva, ex-ministra) levou cinco anos para fazer a Rede. O recorde é meu.

Atualmente existem 76 na fila do TSE para serem registrados. O senhor não acha que é um excesso de siglas?

  • Temos 33 partidos com registro no TSE. Esses são os únicos que têm acesso ao horário gratuito de propaganda na TV e ao Fundo Partidário. Esses 76 simplesmente se cadastraram, pois a lei diz que 100 dias após aquisição de personalidade jurídica tem que haver cadastramento no Tribunal. Isso é apenas para se receber uma senha. Mas sabe quantos deles vão ser registrados? Nenhum. Eles não têm apoiamentos. Se você perguntar para os presidentes deles, eles dizem que estão guardando as assinaturas. Mas é uma mentira. Isso caduca, tem prazo de dois anos. E as conferências nos cartórios eleitorais e nos Tribunais demoram.

Mas 33 partidos já não é um número grande?

  • Não. Quem tem que dizer se é muito ou pouco são os eleitores. Trinta e três partidos não é nada. O TSE tem fiscais, tem auditores, pode cassar o registro dos partidos que procedem mal. Mas quem cassa mesmo é o povo, que não dá voto. Tem partido aí, como o PCO, que não sai do traço nas eleições.

O senhor ajudou na criação do próprio PSL, partido que hojé alvo de uma disputa interna entre Jair Bolsonaro o presidente nacional Luciano Bivar. Como vê a situação da sigla hoje?

  • Os partidos se fortalecem em razão da eleição, quando elegem deputados, formam-se lideranças no Congresso e nas Casas Legislativas. Na verdade, o PSL era chamado de nanico, como era o PEN, atual Patriota (partido de Bolsonaro antes de ingressar no PSL). Mas Bolsonaro elegeu 52 deputados. Se Bolsonaro estivesse no PEN, tenha certeza que esse partido teria muito mais deputados. O Bivar (presidente do PSL nacional) entrou bem depois, quando o PSL precisava se reorganizar. Mas hoje o Bivar é o dono do PSL. Essa é uma realidade, os partidos têm donos. E é aí que pega. Uma administração de um fundo partidário desse tamanho todo mundo quer. No PSL devem ser um cento e tantos milhões. Por que Luciano vai abrir mão dessa presidência, a não ser que haja uma compensação muito grande? Essa questão do PSL não vai se resolver. Minhas propostas para eu me despedir da vida pública vão ser tentando resolver isso. Precisamos mudar a legislação.

O que exatamente o senhor quer resolver?

  • Os partidos têm que limitar os poderes dos administradores. Isso não é intervenção, é um posicionamento de regras para se estabelecer o mínimo de convivência dos políticos dentro deles. Porque os partidos são como um clube de políticos. São uma instituição que agrega pessoas com a mesma tendência política. Não pode haver um acima dos demais.

O senhor pretende continuar na carreira política? Irá se candidatar?

  • Sim. Talvez como vereador ou prefeito da minha cidade Mairinque, aqui no interior de São Paulo. Ou talvez concorrer a deputado em 2022 para me despedir da vida e da política.

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