O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) instaurou, no último dia 16, um processo administrativo para apurar a prática de cartel entre empresas na licitação para as obras da sede da Petrobras em Vitória. Inaugurada em 2012, a estrutura localizada na Reta da Penha foi alvo do interesse de empreiteiras ainda em 2006, quando era apenas uma ideia.
A partir de acordo de leniência - uma espécie de delação premiada de empresas - uma nota técnica do próprio Cade concluiu que há "fortes indícios" de que as companhias, organizadas no "Clube das 12", atuaram para "fixar preços, dividir mercado e ajustar condições, vantagens ou abstenção em licitações públicas" em obras contratadas pela estatal do petróleo.
O QUE É CARTEL?
De acordo com a definição do próprio Cade, cartel é um acordo entre concorrentes para, principalmente, fixar preços, dividir clientes e mercados, bem como combinar preços e ajustar vantagens em concorrências públicas e privadas. Cartéis prejudicam seriamente os consumidores ao aumentar preços e restringir a oferta, tornando os bens e serviços mais caros ou indisponíveis, e comprometendo a inovação tecnológica.
TRÊS OBRAS
A apuração preliminar aponta que pelo menos três grandes obras teriam sido afetadas pelo cartel: o Centro de Pesquisas Leopoldo Américo Miguez de Mello (Novo Cenpes), o Centro Integrado de Processamento de Dados da Tecnologia da Informação (CIPD), ambos no Rio de Janeiro, e a sede de Vitória. O mesmo processo administrativo também investiga se "o acordão" aconteceu também na construção das instalações esportivas destinadas à Copa do Mundo do Brasil de 2014.
Um inquérito administrativo foi instaurado pelo Cade ainda em 2016. Foi daí que surgiu a nota técnica que sugeriu a abertura do processo administrativo. A Odebrecht, líder do consórcio Odebrecht, Camargo Corrêa e Hochtief (OCCH), responsável pela obra da sede localizada na Reta da Penha, firmou Termos de Cessação de Conduta com o Cade e colabora com o órgão.
De acordo com o que relataram representantes desta e outras empresas ao Conselho, foram realizadas reuniões no Rio de Janeiro para definir quais empresas venceriam determinadas licitações, quais apresentariam ofertas para simular que havia competição e quais não apresentariam propostas.
Assim, não houve uma competição de verdade entre as empresas em busca do menor preço. "Uma vez que as empresas em conluio se organizaram para estabelecer quais seriam as vencedoras dos processos licitatórios, era também necessário organizar como se dariam as Propostas de Cobertura ('cover bidding') a fim de criar uma aparência de competitividade e garantir o prosseguimento do processo licitatório. A existência de uma única proposta vencedora poderia gerar desconfiança em relação a efetividade do processo", registra a nota técnica do Cade.
TCU
O edifício tinha custo estimado em R$ 90 milhões. Na licitação, subiu para R$ 436,6 milhões, mas a obra foi contratada por R$ 486,1 milhões. Após vários aditivos, o preço final foi R$ 567,4 milhões. Ou seja, 6,3 vezes mais que o inicial. Esses valores já foram apontados em auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU). O Tribunal também instaurou, em 2017, um processo de Tomada de Contas Especial, que ainda tramita.
PUNIÇÕES
Com a instauração do processo administrativo pelo Cade, os representados - 13 empresas e 23 pessoas físicas - serão notificados para apresentar defesa. Ao final da instrução, haverá um parecer pela condenação ou pelo arquivamento do caso em relação a cada acusado. As conclusões serão encaminhadas ao Tribunal do Cade, responsável pela decisão final. Não há prazo legal para conclusão das investigações.
O Tribunal do Cade pode aplicar às empresas eventualmente condenadas multas de até 20% do faturamento. As pessoas físicas podem ficar sujeitas a multas de R$ 50 mil a R$ 2 bilhões.
LAVA JATO
A Operação Lava Jato também apurou, na esfera criminal, a existência de cartel na construção da sede da Petrobras na capital capixaba. Delatores já abriram o jogo sobre "negócios fictícios".
Por meio de nota, a Odebrecht informou que "os referidos processos abertos pelo Cade integram a contínua colaboração que a empresa se comprometeu a dar à Justiça e aos órgãos de fiscalização e controle no Brasil, o que abrange o Cade. Para estes temas em questão a empresa já firmou com o Cade Termos de Cessação de Conduta. A Odebrecht já usa as mais recomendadas normas de conformidade em seus processos internos, inclusive relativos à defesa da concorrência, e segue comprometida com uma atuação ética, íntegra e transparente".
A Petrobras também foi procurada pelo Gazeta Online, mas não respondeu até o momento da publicação desta reportagem.
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