Quatro empresas do Espírito Santo, além de quatro pessoas, vão ser julgadas pelo Tribunal do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). A superintendência-geral do órgão sugeriu, em despacho assinado no último dia 13, a condenação dos envolvidos em processo que investiga práticas de cartel em licitações públicas.
O processo segue agora para o Tribunal do Cade, a quem cabe a decisão final. Em caso de uma condenação, as empresas podem pagar multas de até 20% de seu faturamento individual, obtido no ramo de atividade no ano anterior à instauração do processo administrativo. Já as pessoas físicas também estão sujeitas a multas que variam de R$ 50 mil a R$ 2 bilhões, informou o Cade.
A investigação apontou a existência de um suposto cartel em licitações da Secretaria de Estado da Educação (Sedu), destinadas à contratação de empresa especializada em prestação de serviços de limpeza, conservação predial, preparo e distribuição de merendas escolares no Espírito Santo.
Segundo informações do Cade, as provas obtidas indicam “ter ocorrido conluio entre empresas com vistas a frustrar o caráter competitivo do Pregão Eletrônico Sedu 037/2016”. Por esse motivo, recomendou a condenação das seguintes empresas e pessoas:
Inicialmente, as apurações do Cade envolviam sete empresas e 16 pessoas, cujos nomes foram retirados na conclusão. A investigação começou em abril de 2019 e reuniu provas que foram compartilhadas pelo Ministério Público do Estado do Espírito Santo (MPES), a partir de informações obtidas na Operação Assepsia. O trabalho foi concluído pela superintendência-geral do Cade no final de junho, quando houve a publicação de um relatório sobre o caso.
A partir dos documentos, foi constatado que a infração à ordem econômica consistiu em acordos entre concorrentes, entre os anos de 2009 a 2018, para alocar os lotes do Pregão Eletrônico 037/2016 e ainda as contratações realizadas pela Secretaria Municipal de Cariacica (ES). “Há provas de que os envolvidos dividiram mercado e apresentaram propostas fictícias ou de cobertura para dar aparência de concorrência entre as empresas participantes dos certames”, é dito no relatório.
Foi o comportamento das empresas durante a licitação realizada pela Sedu, entre julho de 2016 a fevereiro de 2017, que chamou a atenção dos investigadores. No período, foram terceirizados os serviços de limpeza e conservação predial de unidades escolares do Estado. O certame foi dividido em quatro lotes com valor de cerca de R$ 30 milhões cada um, totalizando, à época, mais de R$ 122,7 milhões.
Segundo o relatório da superintendência-geral do Cade, as empresas apresentaram “comportamentos suspeitos de formação de conluio”. São eles:
O fato atraiu a atenção do MPES, que iniciou uma investigação criminal e realizou a Operação Assepsia, encontrando “um fluxo significativo de ligações telefônicas entre representantes da Braslimp, Serdel e Serge Serviços”, é dito no relatório do Cade.
Entre as informações apuradas, constataram 284 contatos telefônicos entre representantes da Braslimp e Serdel; e 27 entre Nacib Haddad (Braslimp Serviços) e Marcos Silva (Serge Serviços). “A demonstrar a comunicação recorrente entre os representados e a permeabilidade das informações entre concorrentes”, relata o documento.
Os contatos entre eles apontaram, de acordo com o relatório:
O relatório conclui apontando ter ocorrido “conluio entre empresas com vistas a frustrar o caráter competitivo do Pregão Eletrônico 037/2016 e de contratações em Cariacica”.
“Agiram em conluio, de modo a alocar os lotes do Pregão Eletrônico 037/2016 e as contratações realizadas pela Secretaria Municipal de Cariacica. Para tanto, lançaram mão de divisão de mercado e apresentação de propostas fictícias ou de cobertura, combinando de antemão propostas destinadas a dar uma aparência de concorrência genuína”, diz o texto.
No último dia 14, foi publicado no Diário Oficial da União o despacho de encerramento do processo administrativo, confirmando os dados do relatório, sugerindo a condenação das quatro empresas e das quatro pessoas, recomendando ainda a aplicação de multa por infração à ordem econômica nos termos da lei de defesa da concorrência, além das demais penalidades entendidas cabíveis. O documento é assinado pelo superintendente-geral do Cade, Alexandre Barreto de Souza.
O advogado Gustavo Varella faz a defesa da empresa Serdel Serviços e Conservação Ltda, que aponta ter mais de 45 anos no mercado sem nenhum tipo de procedimento como o aberto no Cade. “Importante destacar que os elementos trazidos a esta investigação, pelo MPES, são posteriores ao pregão licitatório. A Serdel não teve acesso a outras empresas, não se uniu para formar nenhum cartel”, diz o advogado.
Varella relata ainda que a investigação inicial do Cade envolvia sete empresas, dentre elas uma oficina mecânica que se habilitou em quatro pregões, quando se descobriu que ela não era habilitada para o tipo de serviço a ser oferecido. “É a empresa mais citada na ação do MPES. Foi citada na investigação inicial do Cade, não apresentou nenhuma defesa prévia e sequer foi incluída no relatório final, um contrassenso”, aponta.
E sobre conversas citadas pelo Cade entre um sócio da empresa Serdel com o diretor de outra empresa, a Braslimp, Varella lembra que ambos eram membros do Sindicato das Empresas de Asseio e Limpeza. “Conversavam até mais do que o citado pelo relatório por serem ambos da diretoria do sindicato e as ligações jamais ocorreram no período da licitação. Os assuntos eram na linha de presidente/diretor, nunca sobre licitações específicas”.
Acrescenta que a única ligação destacada pelo Cade se refere a uma informação que o sócio da Serdel recebeu e que relatou ao presidente do sindicato, falando sobre a investigação do Tribunal de Contas sobre cartel. “Ele estava repassando uma informação recebida de um fiscal”.
O sócio da Serdel, cujo nome não aparece no relatório final do Cade, era uma pessoa, segundo Varella, muito procurada pelo sindicato por ser um especialista em segurança do trabalho.
A reportagem busca ainda ouvir as defesas das demais empresas e pessoas citadas no relatório do Cade.
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