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Capitão Assumção: discursos e ações que afrontam a lei

Capitão Assumção: discursos e ações que afrontam a lei

Para juristas, ao postar uma foto da filha segurando uma arma, o deputado estadual, que tem a função de propor leis e políticas públicas, acaba ferindo a legislação

Publicado em 25 de outubro de 2019 às 16:41

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Capitão Assumção, hoje no PSL, começou sua trajetória política no PSB de Casagrande. (Tati Beling)

Para representantes da Ordem da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-ES), advogados e professores, o novo ato não só é questionável do ponto de vista ético e moral, como também pode ser considerado um crime ao ferir o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), além da própria Constituição Federal.

Capitão Assumção postou foto da filha empunhando uma pistola. (Reprodução)

A foto da criança vestindo um uniforme escolar e segurando a arma em suas mãos foi acompanhada da seguinte legenda: “Ensinando às nossas filhas o verdadeiro empoderamento! Nunca será feminazi!”.

ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE 

De acordo com o presidente da Comissão de Infância e da Juventude da OAB-ES, Raphael Câmara, a postagem fere o artigo 232 do ECA, que considera crime “submeter criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância a vexame ou a constrangimento”. A pena para tal infração varia de seis meses a dois anos.

“O Estatuto da Criança e do Adolescente veda esse tipo de exposição. É lamentável. O pior é expor uma criança armada para defender ideologias pessoais, sem qualquer relação com o mandato. De qualquer forma, a conduta do deputado é reprovável, imatura e merece firme repúdio”, justifica Câmara. Segundo ele, ainda que se trate de uma arma de airsoft a violação é a mesma.

Mas as infrações podem ir além. Elda Bussinger, que é doutora em Bioética e coordenadora do doutorado da Faculdade de Direito de Vitória (FDV) afirma que o ato de Assumção vai também de encontro ao artigo 242 do Eca, que proíbe a venda ou fornecimento de munição ou explosivo a crianças e adolescentes sob pena de três a seis anos de reclusão.

CONSTITUIÇÃO FEDERAL 

Para a professora, o artigo 227 da Constituição Federal também é posto em xeque. “Esse artigo afirma que é dever do Estado, da família e da sociedade assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem absoluta prioridade em um conjunto de direitos, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, violência, discriminação, crueldade e opressão”, explica a professora. Ela critica:

“O deputado viola esta lei na sua perspectiva de pai, mas também como Estado porque ele representa uma parcela do Estado brasileiro, que é o Poder Legislativo. Essa menina foi violada no seu direito de não ser exposta a uma situação ridícula e no seu direito ao esquecimento. Como pode um homem de leis desqualificar e violar a legislação?”, questiona.

Já do ponto de vista ético e moral, Elda Bussinguer chama atenção para o conteúdo do texto que acompanha a foto, a qual considera uma provocação às mulheres. “Quando ele afirma que está ensinando o verdadeiro empoderamento ele está provocando todas as mulheres que vêm lutando, em nosso país e no mundo, uma luta legítima por direitos. É inaceitável”, pontua.

SINDICATO ACIONARÁ MINISTÉRIO PÚBLICO

Em nota, o Sindicato dos Advogados do Estado (Sindiadvogados ES) também repudiou a postagem de Assumção e solicitou que medidas sejam tomadas. O Sindicato afirma que entrará com uma representação no Ministério Público estadual para que o caso seja apurado. 

“Manifestamos o nosso desapontamento com a atitude do deputado em questão. Afinal, empoderamento nunca terá relação com violência, tampouco com a exposição e o uso de armas de fogo por crianças”, diz o texto.

Em seu primeiro ano de mandato, Capitão Assumção acumula uma série de falas polêmicas dentro e fora do plenário da Assembleia. Assim como já se posicionou algumas vezes na tribuna, em suas redes sociais o deputado defende abertamente, por exemplo, a morte de criminosos.

DECLARAÇÕES POLÊMICAS

Procurado pela reportagem para se manifestar sobre o assunto, o deputado, que é líder do PSL no Legislativo estadual, ainda não retornou aos contatos.

Para a professora Elda Bussinger, o comportamento de Assumção não é um caso isolado, mas sim um reflexo de um momento vivido no país, em que parte da classe política tem adotado posturas “polêmicas” e "agressivas” para conquistar espaço.

Bussinguer relembra, inclusive, o decreto 9.785 publicado este ano pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL), que se assemelha ao caso da publicação de Assumção. “Esse decreto tira da Judiciário a autorização para que crianças pratiquem tiro e coloca na mão dos pais. É inconstitucional”, enfatiza.

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Ela ainda acrescenta: “A classe política - embora haja muitas exceções - tem nos dado exemplos negativos no sentido de que a lei existe para ser violada. Isso vai contra o estado democrático de direito, é uma estratégia política que agride a República, a cidadania”.

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