Em setembro deste ano Capitão Assumção subiu à tribuna da Assembleia Legislativa do Espírito Santo para oferecer R$ 10 mil reais como recompensa para quem matasse o assassino de uma jovem moradora de Cariacica. Pouco mais de um mês após o episódio, que lhe rendeu um processo dentro da Casa por quebra de decoro parlamentar, o deputado volta a despertar protestos de juristas ao postar em suas redes sociais a foto de sua própria filha segurando uma arma.
Para representantes da Ordem da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-ES), advogados e professores, o novo ato não só é questionável do ponto de vista ético e moral, como também pode ser considerado um crime ao ferir o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), além da própria Constituição Federal.
A foto da criança vestindo um uniforme escolar e segurando a arma em suas mãos foi acompanhada da seguinte legenda: Ensinando às nossas filhas o verdadeiro empoderamento! Nunca será feminazi!.
De acordo com o presidente da Comissão de Infância e da Juventude da OAB-ES, Raphael Câmara, a postagem fere o artigo 232 do ECA, que considera crime submeter criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância a vexame ou a constrangimento. A pena para tal infração varia de seis meses a dois anos.
O Estatuto da Criança e do Adolescente veda esse tipo de exposição. É lamentável. O pior é expor uma criança armada para defender ideologias pessoais, sem qualquer relação com o mandato. De qualquer forma, a conduta do deputado é reprovável, imatura e merece firme repúdio, justifica Câmara. Segundo ele, ainda que se trate de uma arma de airsoft a violação é a mesma.
Mas as infrações podem ir além. Elda Bussinger, que é doutora em Bioética e coordenadora do doutorado da Faculdade de Direito de Vitória (FDV) afirma que o ato de Assumção vai também de encontro ao artigo 242 do Eca, que proíbe a venda ou fornecimento de munição ou explosivo a crianças e adolescentes sob pena de três a seis anos de reclusão.
Para a professora, o artigo 227 da Constituição Federal também é posto em xeque. Esse artigo afirma que é dever do Estado, da família e da sociedade assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem absoluta prioridade em um conjunto de direitos, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, violência, discriminação, crueldade e opressão, explica a professora. Ela critica:
O deputado viola esta lei na sua perspectiva de pai, mas também como Estado porque ele representa uma parcela do Estado brasileiro, que é o Poder Legislativo. Essa menina foi violada no seu direito de não ser exposta a uma situação ridícula e no seu direito ao esquecimento. Como pode um homem de leis desqualificar e violar a legislação?, questiona.
Já do ponto de vista ético e moral, Elda Bussinguer chama atenção para o conteúdo do texto que acompanha a foto, a qual considera uma provocação às mulheres. Quando ele afirma que está ensinando o verdadeiro empoderamento ele está provocando todas as mulheres que vêm lutando, em nosso país e no mundo, uma luta legítima por direitos. É inaceitável, pontua.
Em nota, o Sindicato dos Advogados do Estado (Sindiadvogados ES) também repudiou a postagem de Assumção e solicitou que medidas sejam tomadas. O Sindicato afirma que entrará com uma representação no Ministério Público estadual para que o caso seja apurado.
Manifestamos o nosso desapontamento com a atitude do deputado em questão. Afinal, empoderamento nunca terá relação com violência, tampouco com a exposição e o uso de armas de fogo por crianças, diz o texto.
Em seu primeiro ano de mandato, Capitão Assumção acumula uma série de falas polêmicas dentro e fora do plenário da Assembleia. Assim como já se posicionou algumas vezes na tribuna, em suas redes sociais o deputado defende abertamente, por exemplo, a morte de criminosos.
Procurado pela reportagem para se manifestar sobre o assunto, o deputado, que é líder do PSL no Legislativo estadual, ainda não retornou aos contatos.
Para a professora Elda Bussinger, o comportamento de Assumção não é um caso isolado, mas sim um reflexo de um momento vivido no país, em que parte da classe política tem adotado posturas polêmicas e "agressivas para conquistar espaço.
Bussinguer relembra, inclusive, o decreto 9.785 publicado este ano pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL), que se assemelha ao caso da publicação de Assumção. Esse decreto tira da Judiciário a autorização para que crianças pratiquem tiro e coloca na mão dos pais. É inconstitucional, enfatiza.
Ela ainda acrescenta: A classe política - embora haja muitas exceções - tem nos dado exemplos negativos no sentido de que a lei existe para ser violada. Isso vai contra o estado democrático de direito, é uma estratégia política que agride a República, a cidadania.
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